A fúria contra o alojamento local e a turismofobia


Vivo em Lisboa há mais de 30 anos e não me lembro do aluguer de casas alguma vez ter sido fácil e barato. No início dos anos 2000, havia várias “despensas” para alugar por 550 euros. 


O centro de Lisboa ou estava degradado ou tinha preços proibitivos para a classe média. A sério, não me lembro da existência de qualquer paraíso para arrendatários em Lisboa antes da explosão do alojamento local. Ou fui eu que tive azar ou todos os combatentes do alojamento local estavam habituados a alugar casas fabulosas no centro de Lisboa até o monstro ter chegado.

Conheço demasiadas pessoas de classe média que vivem dos rendimentos conseguidos com o alojamento local. É o seu emprego. Não são tubarões do imobiliário, são pessoas comuns que a dada altura compraram uma casa e, muitas vezes encontrando-se em situação de desemprego, conseguiram ultrapassar a crise com os rendimentos do alojamento para turistas.

É percetível que para um condomínio possa ser desagradável algum ruído provocado pelo uso de uma fração em alojamento local. Como é profundamente desagradável ter que partilhar um prédio com casais que gritam uns com os outros e com pais que gritam com as crianças.

Não sei como isto se pode regular, a menos que haja indícios de violência, o que já está na lei. Ah, também existe a lei do ruído. A polícia pode também ser chamada em situações dessas. Regulamentar o alojamento local é necessário, mas obrigar a uma autorização do condomínio – como propõe o PS – ou limitar a sua atividade a 90 dias anuais (como defende o Bloco de Esquerda) são propostas de quem não conhece a massa de que são feitos os condomínios ou a realidade do emprego gerado pelo alojamento local nas pessoas da classe média.

Lisboa reconstruiu-se com o turismo. Todo o discurso que está subjacente à guerra contra o alojamento local e ao turismo radica numa falta de memória do que era a Lisboa degradada de há apenas 10 anos e numa nostalgia de centro histórico paradisíaco que nunca existiu.