OE 2022. Tributação de criptoativos não obteve ‘luz verde’ do Parlamento

OE 2022. Tributação de criptoativos não obteve ‘luz verde’ do Parlamento


Presidente do Instituto New Economy diz que propostas do Livre e BE “eram simplistas e inexequíveis”.


Portugal tem os dias contados como “paraíso fiscal” para operações em criptomoedas. Ainda não se sabe quando, mas certo é que a taxação de criptoativos não avança mesmo em 2022. No terceiro dia de votações na especialidade do Orçamento do Estado para 2022, foram rejeitadas duas propostas diferentes para a tributação sobre bitcoin e outras criptomoedas.

A proposta do Livre que tinha em vista a tributação dos criptoativos estabelecia que em 2022, o Governo adotasse “as iniciativas necessárias ao estabelecimento de uma obrigação declarativa tributária de ativos em criptomoedas tendo em vista a taxação das suas mais-valias a partir do limiar mínimo de 5000 euros”.

A favor da proposta votaram PAN e PCP. Contra o PS, IL e abstenções dos restantes partidos. Também a proposta do Bloco de Esquerda, que visava “criar mínimos de transparência e justiça fiscal, sujeitando as mais-valias com criptomoedas à taxa mesma aplicável a todas as outras mais-valias obtidas por residentes” em Portugal, foi rejeitada.

Os bloquistas pretendiam, em sede de IRS, constituir como mais-valias os ganhos obtidos que resultem de alienação de ativos virtuais, sendo que o ganho sujeito a este imposto seria constituído “pela diferença entre o valor do ativo na data da realização e o seu respectivo valor na data de aquisição”.

A proposta estabelecia ainda a obrigação declarativa da alienação dos ativos virtuais, bem como a data das respectivas aquisições.

Mesmo com a rejeição das duas propostas, no entanto, é possível que a taxação das criptomoedas em Portugal volte à tona, isto porque o Governo quer avançar com um enquadramento jurídico e tributário para estes negócios virtuais.

A lei atual não permite que as Finanças tributem os rendimentos obtidos com estas transações, por não prever esta nova realidade, mas o Governo comprometeu-se no início do mês  a criar um enquadramento adequado. “Vários países estão a construir os seus modelos relativamente a essa matéria e nós vamos construir o nosso. Não me quero comprometer neste momento com uma data, mas vamos adaptar a nossa legislação e a nossa tributação”, afirmou, na altura, o ministro das Finanças, Fernando Medina.

O governante defendeu igualmente que não podem existir “lacunas que façam com que haja mais-valias relativamente à transação de ativos que não tenham uma taxação”.

Entre os meses de julho de 2020 e junho de 2021 o volume de transações em criptomoedas registadas em Portugal foi de cerca de 27 mil milhões de euros, colocando Portugal como o 9.º maior país da Europa no que respeita a este tipo de transações.

O Presidente do Instituto New Economy – que se dedica à promoção e divulgação da inovação relacionada com a economia digital, fazendo pedagogia sobre como funcionam as criptomoedas – aplaudiu a rejeição das propostas no Parlamento, considerando que foi a decisão mais correta para este ecossistema neste momento.

“As propostas eram completamente simplistas e inexequíveis, o que demonstra desconhecimento sobre a tecnologia e a complexidade da criptotecnologia”, afirma Henrique Corrêa da Silva, em declarações ao i.

Especificamente em relação à proposta do Bloco de Esquerda, o entusiasta das cripto acredita que caso tivesse sido aprovada   “iria criar mais problemas ao Estado português do que aqueles que ia resolver”.

E é mais duro nas críticas: “Não podemos estar agora a apressar o processo com um proposta populista e radical, que ainda por cima é baseada no desconhecimento. A aprovação de um regime apressado só iria ser prejudicial para o país”, defende Henrique Corrêa da Silva, acrescentando que está de acordo com a opção do Governo de levar a cabo um estudo para salvaguardar os benefícios que este setor representa para o país, assim como assegurar a justeza fiscal no desenvolvimento sustentável de qualquer criptoativo.

“Todos os empreendedores com quem contactamos no Instituto New Economy são a favor de um regime de tributação claro e justo. A narrativa do Bloco de que são uns malandros que não querem pagar impostos não é verdade. Portugal apenas não tributa mais-valias no IRS de criptoativos. De resto tributa tudo. E essa conversa de não haver regulação também não é verdade”, denuncia.

O fundador do New Economy diz mesmo que Portugal sofre de dois grandes problemas nesta área: iliteracia digital e ilteracia financeira.

Sobre a primeira, aponta que “quem redige e impõe as leis, normalmente, é infoexcluído” nesta matéria. “Portanto temos pessoas a fazer juízos de valor sobre uma área na qual não têm conhecimentos técnicos”.

Relativamente à segunda, lembra que Portugal nos rankings do Eurostat aparece sempre no  fundo tabela em termos de literacia financeira.

Ou seja, “o que se depreende é que o português percebe muito pouco de Finanças e de tecnologia. Como blockchain é uma mistura dos dois, é natural que haja um desconhecimento total  sobre o assunto”.

De resto, Henrique Corrêa da Silva diz que Portugal tem agora uma “oportunidade de se consolidar como criptohub e de inovar em matéria fiscal”, reconhecendo “bom senso” no Governo, por já ter demonstrado que quer estudar este assunto “de forma séria e a longo prazo”.