Muitos queixam-se dos preços das casas. E a verdade é que os valores têm aumentado muito nos últimos anos. Só para termos uma ideia, os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram que aumentaram 9,1% em 2024. E além de o valor ter subido, cresceu mais que em 2023, ano em que os valores ‘só’ aumentaram 8,3% face ao ano anterior.
Ainda assim, as vendas aumentaram. Os números do INE revelam que transacionaram-se 156.325 habitações, o que representa um aumento de 14,5% face a 2023. O conjunto das transações totalizou 33,8 mil milhões de euros, mais 20,8% que no ano anterior.
Mas ainda que os valores sejam um problema para muitos, não são para todos. E muitos continuam a querer comprar casa. Dados do Banco de Portugal (BdP) revelam que, no ano passado, 138 mil pessoas celebraram com os bancos 90 mil contratos de crédito à habitação própria permanente, mais 32% do que em 2023. Quase metade dessas pessoas são jovens até aos 35 anos, o que poderá estar relacionado com as ajudas do Governo (ver páginas 6-7).
Ainda que os créditos tenham aumentado, nem todos lá chegam. Baixos salários e preços muito elevados das habitações podem ser um problema e atualmente pode ser muito complicado conseguir um crédito.
Manuel Alvarez, presidente da Remax Portugal, admite essa dificuldade, que justifica: “As taxas de juro têm vindo a descer há já muitos meses, tendo agora em março registado a 6.ª descida desde junho do ano passado; uma boa fatia dos clientes compradores são jovens até 35 anos, com benefícios que outros clientes não possuem, além de que os próprios bancos têm competido entre si na concessão desse tipo de crédito”. Ou seja, “a maior dificuldade dos clientes advém dos seus baixos rendimentos e do facto de estes, em muitos casos, não terem aumentado tanto como os preços da habitação, obrigando esses clientes a um maior volume de crédito, com uma taxa de esforço maior”.
Já Rui Torgal, CEO da ERA, não sente que exista dificuldade no acesso ao crédito habitação. “Este continua a ser um produto estruturante e fundamental para as instituições bancárias, que apresentam uma oferta cada vez mais completa e competitiva”, acrescentando que “com taxas de juro a baixarem e o fácil acesso ao crédito até aos 35 anos com a Garantia Pública, na verdade julgo que existe uma maior facilidade na obtenção de crédito habitação e esse facto intensifica ainda mais a procura”.
Preços novamente a disparar
Além dos dados do INE mostrarem que os valores dispararam 9,1% no ano passado, dados da Confidencial Imobiliário referem que, em fevereiro, os preços da habitação tiveram a maior subida mensal em mais de um ano e aceleram a valorização homóloga para 13,6%.
Mas o que levará a esta tendência de subida? Manuel Alvarez defende que os preços variam de acordo com a relação entre a oferta e a procura, “o que significa que em determinadas zonas é possível ter maiores subidas e, pelo contrário, reduções noutras”. E dá como exemplo a região dos Açores que contou com uma redução do preço do metro quadrado da habitação, segundo os últimos dados apurados pelo Instituto Nacional de Estatística: “O preço do m2 da habitação em dezembro rondava os 1.316 euros e em janeiro ficou pelos 1.298 euros (uma redução de 1,4%)”. Na Madeira aconteceu o mesmo.
“Certo é que, a nível nacional, registou-se, de facto, um aumento de 1,5% entre janeiro e dezembro, o que não surpreende, até porque tal como indicávamos há muitos meses, são esperadas novas subidas em 2025, mas não tão acentuadas como as registadas há uns anos”, diz Manuel Alvarez que não hesita: “São esperadas e… naturais, porque sobretudo a partir do 2.º semestre de 2024 houve um aumento acentuado da procura (sobretudo por parte dos jovens até 35 anos que podem usufruir de um conjunto de benefícios), sem ter havido um correspondente ou proporcional aumento da oferta”. “E como neste início de 2025 não são esperados incrementos significativos no número de imóveis disponíveis no mercado nacional como um todo, podem os especialistas antecipar mais algumas subidas”, diz ainda o presidente da Remax.
Por sua vez, Rui Torgal defende que a falta de oferta da qual se fala há anos, mantém-se. “Este ano com a agravante de se terem efetivado os incentivos para as camadas mais jovens do lado da procura, desequilibrando ainda mais a balança”. E atira: “Os nossos números não mentem e todos os meses batemos recordes do número de novos clientes compradores registados no sistema”, acrescentando que o “atual contexto do mercado acionista também não deve ser ignorado. Sabemos que quando existe algum pessimismo nos investidores, o mercado tende a virar-se para o ouro, certificados de aforro e imobiliário”. Mas, com o atual enquadramento internacional, “e ainda a agravante de uma crise política em Portugal, não é surpreendente que o mercado imobiliário seja uma vez mais um porto seguro”.
O que esperar?
Questionado sobre o que esperar daqui para a frente, Manuel Alvarez não tem dúvidas: “As perspetivas para 2025 são de um mercado dinâmico, com crescimentos em vários indicadores, a par de uma subida menos acentuada dos preços”. No entanto, “relembre-se que o principal entrave ao crescimento é precisamente a escassez da oferta, quer em quantidade quer em diversidade, que se irá, contudo, manter em 2025, não obstante os muitos programas e projetos em curso para o seu incremento, mas cujos efeitos só serão sentidos a médio e longo prazos”, alerta o responsável.
Já o CEO da ERA alerta: “A tendência dos últimos meses e ano mantém-se e até se agravou”. Ou seja, “o setor atravessa um ciclo positivo e de crescimento, sobretudo depois da entrada em vigor (no início do ano) dos novos incentivos para a compra de casa que vieram intensificar a procura”. Além disso, a atual crise política “até tem dado um senso de urgência a muitos dos jovens, que decidiram dar esse passo”.
Paralelamente, Rui Torgal defende que “apesar do crescimento da construção nova, o ritmo da procura é muito elevado e ainda supera o da criação da oferta, sobretudo, por duas razões: a) porque ainda estamos a recuperar de 15 anos sem construção; b) a falta de mão-de-obra limita a celeridade no processo de construção necessária fazer face à atual dinâmica do mercado”.
Ao nosso jornal, Ricardo Sousa, CEO da Century 21 Portugal, defende que o setor habitacional no nosso país enfrenta, este ano, “um contexto de desafios significativos, mas também de oportunidades para garantir soluções mais acessíveis e sustentáveis”.
Na opinião do responsável, entre os fatores principais que influenciam o mercado “destacam-se a estabilidade do emprego, com a taxa de desemprego a manter-se abaixo de 8%; a expectativa de uma descida gradual das taxas de juro, ainda que mais lenta do que o inicialmente previsto; o crescimento populacional nas áreas metropolitanas, impulsionado por um saldo migratório positivo; e o crescente interesse internacional por Portugal, proveniente de mercados como os EUA, o Reino Unido e o Médio Oriente”.
Ainda assim, Ricardo Sousa não tem dúvidas que “os elevados custos habitacionais continuam a colocar pressão nas famílias, obrigando muitas a rever critérios de escolha, como localização ou área, para conseguir adquirir ou arrendar habitação” e que para enfrentar estas dificuldades “é urgente adotar soluções que repensem os planos urbanísticos, otimizando o uso de solos urbanos, e atualizar os códigos de construção, incorporando tecnologia e adaptando-os às novas necessidades habitacionais”.
Adicionalmente, Ricardo Sousa diz que “a melhoria da mobilidade urbana será decisiva para criar alternativas habitacionais mais viáveis. Ligar as periferias aos centros de emprego, educação e serviços permitirá diversificar a oferta, aliviar a pressão sobre as zonas centrais e promover maior equilíbrio no mercado”.
E finaliza: “Só com uma visão integrada será possível responder às exigências de uma sociedade em mudança, garantindo habitação para todos e um setor sustentável”.