No seu livro mais recente livro, A História do Mundo – Do Big Bang até aos dias de hoje, o historiador Peter Frankopan argumenta que a vida no nosso planeta, e a história da humanidade, terão sido fortemente condicionadas pelos impactos das múltiplas crises climáticas existentes ao longo da história da Terra. É uma leitura que nos ajuda a compreender o passado e pode ensinar a melhor prever o futuro. Este lugar-comum em diversas áreas do conhecimento, é particularmente verdadeiro nas engenharias relacionadas com as ciências da Terra, e com especial significado na exploração e gestão de recursos naturais. Neste âmbito, o histórico existente de uma atividade de produção, por exemplo de um determinado minério, é, em conjunto com as observações diretas do dia-a-dia e técnicas de computação avançadas, utilizado para prever como será a produção a curto, médio e longo prazo. É deste modo que se consegue planear uma determinada operação e garantir a sua sustentabilidade em todas as dimensões envolvidas: ambientais, ecológicas, sociais.
Sabemos, no entanto, que o histórico da indústria dos recursos minerais e energéticos, e em particular da exploração e produção de reservatórios de hidrocarbonetos existentes na subsuperfície, não é particularmente feliz. Este passado não só compreende uma série de práticas negativas para a sustentabilidade do planeta como também inclui a ocultação de informação relevante sobre o impacto das ações desta indústria nas alterações do clima. Porém, não é menos verdade que este mesmo histórico, e em particular o do passado recente, pode fornecer ferramentas e conhecimento crucial para combater a urgência que atravessamos.
Foi o desenvolvimento científico e tecnológico proveniente da engenharia de recursos minerais e energéticos que nos permite hoje prever como varia a geologia na subsuperfície através da combinação de medições indiretas do subsolo, essencialmente geofísica, e técnicas avançadas de ciência de dados espaciais e, desta forma, construir modelos tridimensionais altamente detalhados da realidade que existe debaixo dos nossos pés. E qual a importância destes modelos? São eles que permitem o planeamento cuidado do tipo, número e localização de novas ações no sistema Terra tendo como objetivo primordial a minimização dos impactos ambientais destas ações. Estas ferramentas computacionais são altamente relevantes para áreas tão diversas como a produção de minerais críticos, a instalação de geradores eólicos no offshore ou a agricultura de precisão. Outro exemplo, a tecnologia associada à perfuração de furos com quilómetros de profundidade e que seguem uma determinada direção no subsolo, tecnologia esta desenvolvida na indústria da energia, foi-se aperfeiçoando ao longo de décadas. Os avanços e maturidade desta tecnologia permitem que o seu custo seja hoje competitivo e utilizada para gerar novas formas de aproveitamento da energia natural da Terra, a geotermia, e o desenvolvimento de novos conceitos como a energia geotérmica estimulada e o aproveitamento de calor a pouca profundidade. A geotermia é nos dias que correm uma possibilidade real de geração de energia à pequena escala e pode contribuir positivamente para a complexa transição energética.
As alterações do clima terão moldado a história da humanidade e os avanços tecnológicos disruptivos necessários para ultrapassar os diferentes desafios que nos têm sido impostos. Os alunos que decidam hoje ingressar numa carreira em engenharia de recursos energéticos, e que sejam capazes de olhar o passado imaginando um futuro tecnológico que ainda não existe, terão um papel fundamental no combate à crise climática.
Professor do Instituto Superior Técnico, Departamento de Engenharia de Recursos Minerais e Energéticos