A noite do passado dia 28 de maio foi pródiga em notícias de “primeiro interesse”: a final da Liga dos Campeões da Europa de Futebol (Liverpool/Real Madrid), disputada em Paris; a “overdose” amiúde de notícias sobre a guerra entre a Ucrânia e a Rússia (ou será já uma guerra por procuração do Ocidente, em vez de ser só da Ucrânia?); e, por último, e menos importante (ao contrário do que se costuma dizer), a eleição de mais um presidente do PPD/PSD. Esta última notícia lá conseguiu uns minutos a mais de tempo de antena do que o conseguido nas últimas semanas, e, desde então, o PSD já tem novo presidente, a somar a todos os outros que já o foram.
Na sede de São Caetano à Lapa, não se sabe bem quando, mas é uma certeza inquestionável, lá chegará o dia em que o retrato de Luís Montenegro perfilará a seguir ao de Rui Rio. Quem conhece aquele belo edifício sabe que um dia faltará parede para tanta fotografia, e não é pelos metros quadrados de área serem insuficientes, mas sim pela galeria extensiva de retratos de 18 homens e de Manuela Ferreira Leite, a única mulher entre homens.
Se há partido político pródigo em “despachar” líderes em direto é o partido laranja. É o que mais “mata”, destrói e usa muitos dos seus melhores quadros, abusando de coligações mediáticas, assentes em interesses pessoais e em ajustes diretos de contas.
Esta eleição foi a eleição menos interessante e com menor mobilização, talvez dos últimos 15 anos. Os seus militantes não se animaram nem a ir votar, nem a pagar as suas quotas para usufruírem da sua capacidade eleitoral. E os portugueses nem se deram conta que o maior partido da oposição e referência do arco governativo estava prestes a eleger uma nova personalidade que irá ser o próximo candidato a Primeiro-Ministro (se os militantes mais inquietos assim o permitirem) e que será a voz de muitos portugueses descontentes e mal assistidos durante este mandato legislativo do Partido Socialista.
Longe vão os tempos em que o PSD suscitava interesse entre os portugueses, fossem ou não simpatizantes deste partido. Em que os congressos eram transmitidos em direto, não só em horário nobre, como se prolongavam pela noite dentro, com níveis de audiência que fariam inveja a qualquer um dos outros partidos políticos. Podemos justificar esta apatia com o contexto internacional, que tanto nos preocupa quanto à incerteza do dia de amanhã; ainda assim, não seria de interesse acompanhar o que o futuro líder da oposição teria a dizer sobre a posição de Portugal quanto aos vários e prováveis cenários que podem ocorrer nos próximos meses, ou anos? Até por este contexto internacional em que nos vimos enredados, que já condiciona a nossa economia mais do que gostaríamos, os portugueses poderiam ter-se interessado um pouco mais em ouvir ou procurar respostas alternativas às que António Costa tem anunciado. Mas não.
Luís Montenegro gozou, enquanto candidato único à liderança do PSD, durante um curto período de tempo, de ser uma novidade mediática, todavia, com a apresentação de Jorge Moreira da Silva, passou a ter que partilhar um palco de pequena dimensão e que, com o avançar da campanha interna, reduziu ainda mais o interesse por parte dos órgãos de informação. Mesmo tendo sido derrotado, Jorge Moreira da Silva contribuiu para que esta eleição não tivesse sido um tédio absoluto, sem qualquer expectativa, e condicionou parte do conteúdo programático do seu adversário.
A minha crítica vai para ausência de matéria de interesse programática e um excesso de áreas cinzentas que facilmente se traduzem numa vontade expressa dos seus relatores em não se comprometerem com orientações específicas para as quais têm outras posições, ainda que não as defendam com clareza. Uma conduta que se instalou no seio do PSD, conhecida pelos “nim” e que se advogam os defensores soberanos das liberdades de opinião, de voto, de tudo… Em vez de PSD, o partido poderia ser rebatizado de PSL, ou de PLD, mas sempre com o L de liberal.
A incoerência programática tornou-se no maior dos males do PSD, seguida dos assaltos ao poder e da existência de pequenos grandes grupos que decidem quem e quando deitam abaixo o próximo líder e, organizadamente, se deslocam em bloco para “inventarem” novos candidatos a líderes. Desengane-se o senhor(a) leitor(a) se ainda acredita em candidaturas espontâneas de militantes que, genuinamente, querem ir a votos só para discutirem ideias e contribuírem para uma reflexão interna sobre temas fraturantes. Já não há nada disso.
No PSD quase todos já estiveram contra todos os outros nos últimos anos. As guerras internas são fratricidas e recomeçam no dia seguinte às eleições internas. Quem não se recorda de uma carta que Rui Rio recebeu três dias depois de ter sido eleito, publicada em todos os órgãos de comunicação social, pelo seu adversário, a derreter o presidente eleito?
Luís Montenegro tem um papel muito árduo pela frente, tal como teria Moreira da Silva. Encontrar um novo rumo para o PSD, desbravar um caminho para o qual perdeu a bússola dos valores e as pessoas-bússola. O PSD tem sangrado continuamente, umas vezes mais, outras menos, e não é exagerado afirmar que se encontra a perder pessoas, a encolher na sua robustez programática e a reduzir-se a uma cópia retalhada de posições de outros partidos que não fazem parte da sua matriz fundadora, nem da revisionista.
Não é sério para o seu ativo de militantes permanecer nesta penumbra ideária que não permite nem o crescimento do PSD, nem o seu desfecho. Se andássemos por aí a questionar os portugueses sobre quais as posições deste partido sobre qualquer matéria, a resposta mais frequente seria “Não sabe/Não responde”. Este é o desafio de Luís Montenegro e, também, numa outra perspetiva e com outra responsabilidade, de Moreira da Silva, de esclarecer aos portugueses quem é o PSD, o que é e o que pode acrescentar ao futuro de todos nós.