FC Porto-Sporting. A desgraçada maldição de O Chinês

FC Porto-Sporting. A desgraçada maldição de O Chinês


A final da Taça de Portugal de 1978 foi a primeira a ter uma finalíssima. E, com o Sporting a convidar o árbitro Mário Luís para englobar a comitiva que ia em digressão para a China, Pedroto aproveitou para mais uma tranquibérnia.


Esta época é certo que FC Porto e Sporting, verdadeiramente os dois únicos clubes que lutaram pelo título (quase) até ao fim, não se encontrarão na final da Taça de Portugal. Porque, amanhã, no velho bairro das Antas, estarão frente a frente na segunda mão da meia-final, com vantagem para os do Norte, que já ganharam o primeiro jogo em Alvalade por 2-1.

Muitos foram os embates entre os dois rivais, tanto para o Campeonato de Portugal como para a sua sucessora Taça, mas a final de 1978 teve algo de inédito. Depois de, no dia 17 de Junho, o empate a um golo (Menezes pelo Sporting e Fernando Gomes pelo FC Porto) ter persistido para além do normal prolongamento de meia-hora, estabeleceu a Federação Portuguesa de Futebol que haveria lugar a uma finalíssima.

Nunca se tinha visto tal coisa, mas a verdade é que, no dia 24 lá marcharam os adeptos de um lado e do outro até ao Jamor para ver a repetição da final. E as duas triplas ofensivas – Manoel, Manuel Fernandes e Keita contra Seninho, Duda e Fernando Gomes prometiam que mais uma vez as balizas não ficariam a zeros.

O jogo ficou famoso por mais uma daquelas tranquibérnias em que o treinador portista, José Maria Pedroto, mais famoso pelo que dizia do que pelo que na verdade ganhou ao longo da carreira, construiu para minimizar a derrota que sofreu – 1-2, golos de Vítor Gomes e Manuel Fernandes, aos 55 e 62 minutos, contra o de Seninho aos 80.

Com viagem marcada para uma vistosa digressão à China marcada para as 11 horas do dia seguinte, a convite da Associação de Amizade Portugal-China, a direcção do Sporting resolveu convidar, no final do encontro, o árbitro que o havia dirigido, Mário Luís, de Santarém, para que se juntasse à comitiva.

Durante anos, Pedroto não se calou, acusando os leões de terem aliciado o árbitro com a viagem e obterem, em compensação, os seus favores, ainda que todos os jornais da época tenham considerado o trabalho do santareno como impecável. “Limpinha e sem mácula!”, dizia, por exemplo, Neves de Sousa. A verdade é que Mário Luís ficou com a alcunha de O Chinês, algo que se lhe colou à pele durante toda a vida.

Desinteresse. Ao contrário do que acontecera no primeiro jogo, o povo desinteressou-se desta finalíssima, não aparecendo no Jamor mais do que 25 mil espectadores. Diga-se de passagem que a final em si foi desgostosa, jogada em forma de luta livre, cheia de casos de tentativas de agressão e mesmo de agressões, num ambiente insuportável tão ao gosto de Pedroto e dos seus seguidores que propagavam a ideia de que um jogo contra uma equipa de Lisboa devia ser sempre disputado como se de uma batalha campal se tratasse. Pusilânime, o árbitro desse encontro, Francisco Lobo, saiu completamente esturricado do Estádio Nacional e viu a sua carreira dar com os burrinhos na água.

Por seu lado, fartos de uma época dura e desgastante, os jogadores também não encararam a finalíssima de boa catadura. De tal ordem que, ao contrário da festa de caneladas e cotoveladas do primeiro jogo, se dedicaram desta vez mais em procurar a bola do que os joelhos e tornozelos adversários.Mas com tanta lentidão o fizeram, com tanta falta de arreganho e de pertinácia, como gostavam de bradar os radialistas desse tempo, que os noventa minutos desembocaram numa grandessíssima estucha, como diria o Alencar do divino Eça.

O golo inaugural de Vítor Pereira foi fortemente contestado pelos portistas, como seria de esperar. Ademar, em fora de jogo de posição, abriu a torneira das queixas e levaria, mais tarde, ao desabar das desconfianças sobre Mário Luís, o tal árbitro que foi à China com o Sporting. Agiu bem o juiz da partida, mas isso de pouco lhe serviu num tempo de guerra aberta entre Norte e Sul. O Sporting tomou conta dos acontecimentos, foi mais forte, foi mais astuto e mais organizado.

Ganhou pois com mérito e não valia a pena estar a denegrir esse mérito se não fosse o vício arreigado de colar todas as vitórias obtidas pelos clubes da beira Tejo a manigâncias da arbitragem. Numa tarde morrinhenta de chocho início de Verão, o público entrou no Jamor sem grande entusiasmo e saiu de lá desiludido. Restava a alegria leonina por mais um troféu ganho e a pressa em fazer as malas e partir para o lado de lá do mundo numa viagem que fez furor nos periódicos portugueses. No grupo do Porto, havia quem ficasse para sempre a maldizer O Chinês vá lá saber-se porquê…