José Sousa, secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (Sitava), considera que a pandemia não criou a crise na TAP, mas apenas a colocou “à luz do dia”. O representante do sindicato continua preocupado com a retoma lenta das operações e espera que a TAP seja capaz de colocar no ar entre 40% e 50% dos seus voos até ao final de julho. O responsável prefere falar em não renovação de contratos em vez de despedimentos. Ainda assim, quando estes terminarem, em setembro e outubro, o grupo terá perdido mais de 2500 postos de trabalho desde abril.
O Sitava defendia há muito que o Estado deveria recuperar o controlo da gestão estratégica e financeira da TAP. O acordo para a saída de David Neeleman, principal acionista privado da companhia, permite exatamente isso. Que avaliação faz do desfecho deste negócio?
A avaliação que faço do negócio é positiva. Acredito que este desfecho vai permitir trazer paz à empresa e contribuir para que a TAP volte a fortalecer-se, na medida em que o mercado o permita.
O que falhou, do ponto de vista dos trabalhadores, nesta relação entre a TAP e Neeleman? Em 2015, o objetivo do parceiro privado era fazer crescer a companhia aérea, com mais aviões, rotas e postos de trabalho, e isso veio precisamente a acontecer. Quando passou o parceiro privado a ser um problema, ao ponto de o sindicato defender a sua saída imediata da empresa?
Nunca exigimos que houvesse alterações no quadro acionista, mas fomos sempre alertando, desde 2015, para aquilo que considerávamos ser um crescimento demasiado rápido da empresa, tendo em conta as características do setor da aviação – que, como se sabe, é de alto risco, por depender de muitas variáveis não controláveis. As coisas têm sempre de ser encaradas com alguma parcimónia, sem que se deem passos maiores que a perna. E acho que foi isso que aconteceu na TAP: um crescimento demasiado rápido e pouco sustentado. Aquando da privatização foi feito um plano de negócios que previa o crescimento da empresa, a diminuição dos capitais próprios negativos e a obtenção de lucros nos anos de 2018 e 2019, na ordem dos 50 milhões de euros por ano. A verdade é que isso nunca aconteceu, o que só se explica por dois motivos: ou o plano estratégico estava mal desenhado ou o crescimento induzido foi demasiado repentino, causando danos. Julgo que foi esse crescimento acelerado que nos fez chegar a este ponto, com uma frota com mais 17 aviões do que os previstos e uma situação líquida da empresa ainda mais negativa do que em 2015.
A pandemia veio agravar as contas da TAP, já no vermelho. O acordo com o Estado prevê injetar na empresa até 1,2 mil milhões de euros, mas também um plano de reestruturação que deverá reduzir frota, rotas e postos de trabalho. O ministro Pedro Nuno Santos já afirmou que não pode garantir “que não haverá despedimentos”. Como encara esta declaração?
A pandemia não veio agravar a situação, mas sim colocá-la à luz do dia. Com a interrupção da atividade e consequente ausência de receitas, a TAP precisou de uma intervenção, seguindo o exemplo do que aconteceu com todas as companhias do mundo. No futuro terá de se encontrar uma estabilidade acionista para a empresa e, depois, tudo dependerá do que for a retoma da atividade. Hoje fala-se muito de um plano de reestruturação que inclui despedimentos, mas essas declarações parecem-me negativas para a própria estabilidade da empresa. As empresas não podem fazer reestruturações por catálogo; o que é necessário é adequar a TAP ao presente e ao futuro. E isso já se está a fazer desde abril, pois não podemos ignorar que, com muita pena minha, têm saído trabalhadores da empresa desde essa altura. Não consideramos despedimentos, pois resultam da não renovação de contratos a termo ou de contratos com as empresas de trabalho temporário, nomeadamente no call center. Portanto, o que vemos não são despedimentos, mas a adequação da força de trabalho à imagem do atual mercado.
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