Um mês e meio depois do desembarcarem em Monte Gordo oito marroquinos que tinham como destino o sul de Espanha, ontem outros 11, que serão amigos dos primeiros, foram sinalizados ao largo da Ilha de Armona, no concelho de Olhão. Os migrantes pediram proteção internacional e, segundo informou ontem ao final da tarde o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), aguardam agora a análise da sua situação.
Ao i, Pedro A. Neto, diretor executivo da Amnistia Internacional – Portugal, explicou que estes casos só por si não significam que o Algarve passe a ser uma rota ou que o número de casos venha a aumentar. “Quero acreditar que o nosso Governo e o nosso país está preparado para estes casos, porque já os recebe por via aérea em maior número e portanto é especular muito que dois barquinhos – e uso o diminutivo de propósito – com pouquinhas pessoas sejam usados para criar narrativas sobre uma nova rota. Não faz qualquer sentido, chegou um barco com 11 pessoas e há tempos um outro com oito pessoas.”
O diretor executivo da Amnistia Internacional – Portugal lembrou ainda que “a realidade de Marrocos não tem nada a ver com as realidades da Líbia, da Síria, da Eritreia ou do Iraque”, esclarecendo que é destes países que vem o maior número de pessoas para a Europa: “Estes países vivem em situação de pobreza extrema ou de conflito armado. Não são casos comparáveis a Marrocos, qualquer comparação é criar um alarme.”
Migrantes viajam desde Marrocos num pequeno barco O SEF explicou ontem que os 11 homens com idades entre os 21 e 30 anos viajaram desde o norte de África “numa pequena embarcação a motor”, tendo sido intercetados pela Polícia Marítima após uma denúncia de pescadores.
Assim que desembarcaram, adiantou a mesma fonte, “foram, de imediato, asseguradas as necessidades básicas, incluindo alimentação e assistência médica”. “Sem prejuízo da avaliação médica requerida e que está a ser assegurada pela Cruz Vermelha Portuguesa, três deles deslocaram-se previamente ao Hospital de Faro”, acrescentou este órgão de polícia criminal ao início da tarde de ontem.
Mais tarde, o SEF anunciou que Portugal iria dar início ao processo de análise do “pedido de proteção internacional” feito pelos migrantes: “Ao abrigo do quadro de proteção internacional aplicado em outros casos de cidadãos estrangeiros resgatados no Mediterrâneo, será registado o pedido de concessão do estatuto e providenciada documentação que comprova o período de análise do mesmo. Essa documentação permite que, durante esse período, lhes possa ser garantida assistência médica, educação, alojamento e meios de subsistência”.
O passa a palavra Sobre Portugal pode continuar? Para Pedro A. Neto é ainda “muito cedo para se tirarem consequências de um eventual “passa a palavra” iniciado pelo primeiro grupo.
“A costa portuguesa e o espaço aéreo português são espaços muito bem guardados pelas nossas forças armadas. Eu tenho trabalhado e elogiado a nossa Marinha pelas missões conjuntas feitas no Mediterrâneo no salvamento de requerentes de asilo e refugiados. E, por isso, acho que estamos muito bem preparados para lidar com o que vier a acontecer”, garantiu ainda o responsável da Amnistia Internacional, lembrando que esta altura também não é propícia a tirar conclusões, uma vez que é no verão que se verifica um maior número de viagens, devido ao bom tempo e à menor agitação marítima.
Uma das preocupações manifestadas por Pedro A. Neto é que estes casos alimentem narrativas xenófobas no campo político e não só. “Preocupa-me o aproveitamento de pessoas com maus escrúpulos, que precisam de criar vilões para depois se apresentarem como heróis e salvadores da pátria – como é o caso destes partidos mais extremados e movimentos xenófobos e anti-imigração, que vão aproveitar tudo o que puderem para demonizar e pintar estas pessoas como grandes ameaças”.
Para o diretor geral desta organização, Portugal deverá evoluir em muitos aspetos, defendendo que muitos migrantes que chegam a Portugal “não têm tido um bom acolhimento, nem uma boa integração”. Isto, porque as pessoas “demoram a começar a trabalhar e demora a que comecemos a beneficiar da riqueza que eles podem produzir”. Afirma ainda que serviços públicos de apoio a estas pessoas, como o SEF ou a Segurança Social, “têm processos muito burocráticos e demorados”.
Pedro A. Neto conclui acrescentando ainda que, em alguns casos, a colocação dos migrantes em locais mais pequenos e longe dos grandes centros pode dificultar a integração, dado que ficam longe das comunidades dos seus conterrâneos que já existem no país.
UE não está preparada para nova vaga de migrantes
O alerta é do Centro Internacional para o Desenvolvimento de Política Migratória.
Michael Spindelegger, diretor-geral do Centro Internacional para o Desenvolvimento de Política Migratória, alertou ontem para a necessidade de preparação de acolhimento dos migrantes que chegam à União Europeia e para a incapacidade dos países de trânsito de lidar com esta realidade.
“Se não começarem a resolver o problema nos países de trânsito, terão uma emergência nos seus países e não conseguirão lidar com isso. Irá acontecer o mesmo que em 2015 e 2016”, referiu Spindelegger a propósito da apresentação das perspetivas para o próximo ano no que diz respeito às migrações.
De acordo com a análise, a chegada de migrantes vindos da Líbia ou do Irão pode aumentar de forma significativa – isto se as condições nestes países continuarem a piorar.
No ano passado, Espanha foi o país que registou mais pedidos de asilo, segundo os dados do Centro Internacional para o Desenvolvimento de Políticas Migratórias. E, além disso, venezuelanos e colombiano foram duas nacionalidades que mais pedidos de asilo requereram. “Isto é, de facto, uma questão singular que não observámos nos últimos anos”, disse Michael Spindelegger.
A propósito do aumento de migrantes que chegam à União Europeia e da forma como alguns países recebem as pessoas que fogem dos seus países de origem, esta terça-feira, cerca de 60 migrantes forçaram a entrada na Hungria, a partir da Sérvia. A polícia húngara disparou tiros para o ar, o conselheiro do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, disse que os migrantes eram “um grupo de homens organizados e agressivos” e os migrantes acusam agora a polícia do uso de força excessiva.