Tancos. Juiz cita Marcelo para insistir na audição presencial de Costa

Tancos. Juiz cita Marcelo para insistir na audição presencial de Costa


Instrução começou ontem com arguidos em silêncio. Na véspera, Carlos Alexandre colocara à disposição de Azeredo Lopes retirar António Costa do rol de testemunhas, reforçando que a sua audição era importante se fosse presencial e não por escrito, como autorizou o Conselho de Estado a pedido do próprio primeiro-ministro.


Portugal é uma “República soberana, baseada na dignidade pessoal e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”. O ensinamento de Marcelo Rebelo de Sousa ficou e Carlos Alexandre fez questão de o citar num longo despacho em que insiste na necessidade de ouvir presencialmente António Costa na instrução do caso Tancos – e não por escrito, como autorizou o Conselho de Estado.

No documento, datado desta terça-feira, é feita referência ao pedido do primeiro-ministro para que fosse inquirido por escrito – o que foi aceite pelo órgão consultivo do Presidente da República –, noticiou a Sábado: “Tal pedido parece ter desconsiderado a posição assumida pelo tribunal quanto à necessidade de o depoimento ser presencial”.

Caso seja preciso ouvir António Costa, Carlos Alexandre considera que terá de ser nas instalações do Tribunal Central de Instrução Criminal, mas o juiz também deixa claro no documento que foi o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, arguido no processo, que viu interesse na audição do primeiro-ministro, algo de que ainda vai a tempo de prescindir. Por esse mesmo motivo e porque foi dada essa hipótese à defesa, não foi formulada qualquer insistência junto do Conselho de Estado.

Ontem, a defesa de Azeredo Lopes fez saber que lhe é indiferente se o depoimento é por escrito ou presencial, dando a entender que não vai prescindir da testemunha. “Esse problema não é nosso, essa guerra não é nossa. Para a defesa é absolutamente indiferente que o primeiro-ministro deponha por escrito ou presencialmente”, disse ontem à Lusa o advogado Germano Marques da Silva.

Por lei, mesmo que o arguido Azeredo Lopes viesse a prescindir da testemunha arrolada, o juiz de instrução poderia vir a chamar a mesma, caso a sua audição viesse a revelar-se fundamental no decurso das diligências de instrução.

 

Os motivos pelos quais António Costa devia ir a tribunal

Mas, afinal, como justifica Carlos Alexandre a necessidade de ouvir presencialmente António Costa? De acordo com o despacho, a ida do primeiro-ministro é fundamental para que seja possível formular “questões, sub–hipóteses, explicações” e “introitos”. Em segundo lugar, defende o juiz, “havendo outros cidadão acusados em coautoria [além de Azeredo Lopes], não será de desconsiderar que queiram solicitar esclarecimentos”.

Deixando claro ter noção de que António Costa não é uma testemunha comum, uma vez que ocupa “um cargo da maior Dignidade possível”, o superjuiz lembra que já tinha deixado clara a necessidade de a diligência ser presencial: “Sem pretender ser atrevido, procurando conhecer a Constituição e a Lei e os entendimentos jurisprudenciais atinentes, o Tribunal entendeu ser necessário e adequado o depoimento, a ser autorizado, ser presencial”.

António Costa, por ser membro do Conselho de Estado, pode num primeiro momento depor por escrito, tendo sido esse o sentido da decisão tomada pelo órgão consultivo do Presidente da República, que só voltará a pronunciar-se quando e se tal voltar a ser solicitado pelo tribunal. Ontem, o gabinete do primeiro-ministro disse não ter comentários a prestar sobre o caso.

 

Primeiro dia de instrução ficou marcado pelo silêncio

A fase de instrução do processo que investigou o desaparecimento e achamento de material militar que estava depositado nos Paióis Nacionais de Tancos arrancou ontem de manhã, com os arguidos Válter Abreu e Jaime Oliveira a recusarem responder às perguntas do juiz Carlos Alexandre.

Ambos fazem parte, segundo a acusação, do grupo de responsáveis pelo assalto aos paióis, estando o primeiro acusado pelos crimes de terrorismo, associação criminosa, tráfico e mediação de armas. E o segundo, Jaime Oliveira, é suspeito dos crimes de associação criminosa, tráfico e outras atividades ilícitas.

Da parte da tarde não foi ouvido, como inicialmente previsto, o militar da GNR de Loulé José Batista Gonçalves, uma vez que o arguido solicitou nova data para a realização da diligência.

Nenhum destes três arguidos pediu a abertura da instrução – fase facultativa na qual o juiz de instrução decidirá se o caso avança ou não para julgamento.

Ontem ficou ainda a saber-se que o diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves, foi chamado a testemunhar na fase de instrução, estando a sua audição agendada para o dia 19 de fevereiro. No mesmo dia serão ouvidos o diretor nacional adjunto da PJ, João Melo, e o procurador que investigou o caso, Vítor Magalhães.