Ele há pessoas assim.
Miguel Oliveira.
Cai?
Levanta!
Dói?
Aguenta.
Em Mugello, princípio de junho, uma queda ali nos inícios da corrida fez com que a luta pelos pontos ficasse fora de cogitações. Levantou-se e, ainda que com a mota ligeiramente danificada, fez uma série de voltas rápidas e certinhas, amealhando informação preciosa para si e para a equipa.
Mostrando àquele mundo de gente que é homem de fibra, de trabalho, de querer e de crença.
Em Silverstone, num incidente de corrida que já abordámos, assim uma coisa desnecessária, numa queda que parecia igual a tantas outras de tantos pilotos em tantos encontros imediatos, a triste coisa acabaria por trazer fatura mais pesada do que à partida se poderia supor.
Falhou os testes de Misano, que não só trariam mais informação na correnteza Falcão-Tech3-Falcão como lhe dariam certamente mais à-vontade e confiança na abordagem ao GP deste fim de semana.
Miguel é um rookie, não esqueçamos, a cada corrida que faz este ano corresponde um manancial de coisas novas, cada circuito varre-se agora com muito mais potência nas mãos, acelera-se, trava-se e dispara-se por ali fora em pedaços do asfalto totalmente diferentes, o traçado previamente memorizado surge agora trazido por velocidades bem mais ao estilo das do Super-Homem.
Imaginemos uma escadaria, como será diferente subi-la ou descê-la.
E, no entanto, os degraus são os mesmos.
Chegou então o mítico GP de Itália.
Após titubeante início, deixando temor em relação à maldita mazela, Oliveira ofereceu-nos uma FP3 de fazer roer unhas e sonhar com a Q2 direta, num quase-quase que um dia destes terminará mesmo com o nosso menino a ir aos “finalmentes”.
E porque haveremos todos de aprender a sofrer, acabaria por se qualificar num modesto 19.o lugar, modesto aos dias de hoje porque, de início, esta seria a sua área natural de ação.
Arranque dado, galgadas três posições e rapidamente atingida a 15.a após a queda de um adversário, eis MO nos pontos, com toda uma corrida para subir uns degraus mais.
E eis senão quando.
Não vimos, eu pelo menos não vi, mas terá saído em frente algures na curva 4. O que reparámos foi que naquela coluna à esquerda do ecrã que nos mostra a classificação em pista, o nosso Falcão rapidamente despencou por ali abaixo. Não haveriam passado 30 segundos e lá estava a informação naquele retangulozinho vermelho, “Oliveira crash”, imagino que todos tenhamos reagido da mesma forma, um salto da cadeira, três pontapés no ar, duas imprecações, o coraçãozinho do fim de semana vazio de vontades e apetite para o almoço despachado a 200 à hora, provavelmente a mesma velocidade que levara o nosso 88 para fora do asfalto.
E enquanto nós, todos nós, nos carcomíamos numa receita de tristeza, frustração e desânimo, Oliveira levantava-se e prosseguia seu bacharelato.
Cumprido apenas um terço de sua missão por ali, regressou à pista e desatou a ser ele de novo, buscando informação valiosa, porfiando na procura de limites e trajetórias, trabalhando com afinco para que, daqui a um ano, outro galo possa ali cantar.
Repito, não esqueçamos que uma das faturas a pagar pelos novatos é a da incógnita que para eles constitui a posição dos pontos onde se dá mais gás ou entra a manete.
Pela parte que me cabe, terei de fazer um ato de contrição e penitenciar-me pela fraqueza de saltar desmiolado e palavroso a cada vez que Miguel enfrenta um percalço, admito e espero que saiba ele perdoar-me tão fraca prestação.
Ao mesmo tempo, refeito desta postura que “bate forte mas passa depressa”, terei a sorte de poder debruçar-me pelo trajeto deste que a todos nós vai encantando e perceber que nada em sua já vasta carreira, recheada com tantas vitórias, se fez ou faz ao acaso.
Queda? Pertinácia!
Contrariedades? Arreganho!
Rumo ao bacharelato.
Que, como bem sabemos, antecede o doutoramento.
E nós voando contigo, Falcão.