Eleições Montepio. Corrida a alta velocidade num momento de grandes mudanças

Eleições Montepio. Corrida a alta velocidade num momento de grandes mudanças


Ato eleitoral ocorre numa altura em que está para breve a entrada do novo Código das Associações Mutualistas. Ainda assim, o Montepio vai beneficiar de um período de transição de 12 anos para adaptação ao novo regime.


A Associação Mutualista Montepio já está em contagem decrescente para as eleições que se realizam no próximo dia 7 de dezembro. Na corrida estão três listas que apelam à necessidade de renovação da instituição que é dona do banco com o mesmo nome. Mas se, até há pouco tempo, as dúvidas estavam relacionadas com o nome que iria encabeçar a lista de continuidade a ser promovida pela atual administração – uma exigência dos estatutos, mesmo que não mantenha os administradores ainda em funções ­–, elas dissiparam-se no final de outubro, com Tomás Correia a avançar para aquele que poderá ser o seu último mandato.

À sua lista juntam-se dois dos atuais administradores: Carlos Beato e Virgílio Lima. Também Luís Almeida (ex-quadro da caixa económica) é outro nome que vai estar presente, assim como Idália Serrão (deputada socialista e secretária da mesa da Assembleia da República). Vítor Melícias mantém-se como presidente da mesa da assembleia-geral, enquanto Maria de Belém será presidente do conselho geral.

Também na corrida está António Godinho, que já concorreu às últimas eleições e junta a oposição do último ato eleitoral, tendo obtido no seu conjunto 40% dos votos. Fazem parte da lista Alípio Dias (conselho geral), o general José Pinto Ramalho (mesa da assembleia-geral) e Eugénio Rosa (conselho fiscal).

 A outra lista concorrente é liderada por Fernando Ribeiro Mendes, atual administrador da associação mutualista e que entrou em rutura com Tomás Correia mas, ainda assim, mantém-se no cargo. A este juntam-se nomes como Miguel Coelho (atual administrador da mutualista e quadro do banco, votou contra o aumento de capital e o lançamento da oferta pública de aquisição da mutualista sobre a Caixa Económica Montepio Geral), Maria Nazaré Barroso (membro do conselho de administração da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões – ASF) e Pedro Corte Real (professor da Universidade Nova). Já Vítor Baptista (antigo dirigente do PS de Coimbra) é o nome indicado para o conselho geral.

 

Eleições concorridas

Até 2003 houve sempre apenas uma lista a eleições e só no final desse ano é que começaram a surgir candidaturas alternativas. Nessa altura coube a António Maldonado Gonelha, ex-ministro do Trabalho e da Saúde, fazer face à lista de José da Silva Lopes, que saiu vencedora.

A partir daí, o interesse pelas eleições no Montepio foi ganhando maior relevo e as listas também se foram multiplicando. Exemplo disso foi o que aconteceu no último ato eleitoral: apareceram na corrida quatro candidaturas e foi possível, ao mesmo tempo, encontrar um pouco de tudo, de ex-políticos a dirigentes sindicais, contando ainda com apoios públicos, nomeadamente com figuras ligadas às artes.

A lista liderada por Tomás Correia venceu as eleições para a associação mutualista com 58,7% dos votos, mas envolvida em forte contestação. Uma das candidaturas derrotadas – de António Godinho, um dos rostos do projeto “Renovar Montepio” – chegou a pedir a impugnação dos resultados, apontando falta de transparência, nomeadamente por não ter sido possível às listas da oposição assistir ao processo de validação dos votos por correspondência (mais de 95% dos votos não são presenciais) com o argumento de que os dados dos associados são protegidos por sigilo bancário (uma vez que a validação das assinaturas é feita por semelhança com a assinatura dos clientes na base de dados bancária), considerando-se que isso facilitaria eventuais falsificações de votos. Mas, no ano passado, o tribunal chumbou a repetição das eleições, considerando improcedente o processo que tinha sido intentado.

 

Desafios

Estas eleições surgem numa altura em que estão em marcha mudanças profundas no setor. O conselho de ministros aprovou recentemente o novo Código das Associações Mutualistas, segundo o qual estas passaram a ser supervisionadas pela Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, sendo o Montepio Geral um dos visados.

No entanto, as associações de maior dimensão vão beneficiar de um período de transição de 12 anos para adaptação ao novo regime. Isto significa que o executivo vai ter responsabilidades diretas na fiscalização das adaptações da Associação Mutualista Montepio durante esse período. Ao mesmo tempo está prevista a criação de uma comissão de acompanhamento do período de adaptação, com representantes do Ministério das Finanças e da Segurança Social. O i sabe que esta foi uma das sugestões feitas pelo Montepio.

Com esta alteração, a comercialização de modalidades de benefícios de segurança social terá de cumprir as mesmas regras a que estão sujeitos os produtos financeiros das seguradoras. Aliás, este era um dos objetivos do governo e das autoridades reguladoras: assegurar que os produtos financeiros das mutualistas passassem a ser fiscalizados por um regulador financeiro, face à ausência de supervisão que existia. Recorde-se que, atualmente, esta supervisão recai no ministério de Vieira da Silva.

Além disso, as mutualistas com mais de 100 mil associados vão ser obrigadas a ter uma assembleia de representantes, para assegurar a “adequada representação dos associados por áreas geográficas, locais de trabalho ou grupos profissionais”, segundo o novo código.

Recorde-se que a associação mutualista é o topo do Grupo Montepio, tendo como principal empresa a Caixa Económica Montepio Geral, que desenvolve o negócio bancário e da qual, até meados de 2015, Tomás Correia também era presidente.

No ano passado, a associação mutualista apresentou nas contas individuais lucros de 587,5 milhões de euros, bem acima dos 7,4 milhões de euros de 2016 – isto depois de ter passado a estar sujeita a pagar IRC (imposto sobre os lucros das empresas), por decisão das Finanças, após um “pedido de informação vinculativa” da própria associação, apesar de manter o estatuto de IPSS – Instituição Particular de Solidariedade Social. Com essa alteração do regime fiscal, as contas beneficiaram do impacto de ativos por impostos diferidos superiores a 800 milhões de euros.

Já o presidente do banco mutualista é Carlos Tavares (ex-ministro da Economia do governo PSD de Durão Barroso e ex-presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários). No primeiro semestre do ano, a instituição financeira apresentou lucros de 15,8 milhões de euros, o que representou um aumento de 21,1% face a igual período do ano passado. A redução de imparidades e de provisões contribuiu para inverter o ciclo negativo dos exercícios passados.

Também em cima da mesa está a mudança de nome do banco, que deverá estar concluída até ao final do ano.
A instituição financeira liderada por Carlos Tavares já deu entrada do pedido de registo da marca no Instituto Nacional da Propriedade Industrial para Banco Montepio. Até 31 de dezembro corre o prazo de oposição possível, em que pode haver espaço para a reclamação por terceiros do registo da insígnia comercial.

A ideia não é nova e cumpre uma das sugestões do Banco de Portugal (BdP), que sempre defendeu a distinção entre a marca do banco e a sua acionista – Associação Mutualista Montepio. Com isso, a forma como irá apresentar-se aos clientes vai sofrer mudanças, assim como os balcões.

A necessidade de mudança já tinha sido anunciada pelo ex-presidente do banco Félix Morgado, mas acabou por criar uma guerra com Tomás Correia, presidente da mutualista, que nunca viu com bons olhos a mudança de nome. Ainda assim, admitiu recentemente que, pelo menos, a palavra Montepio se iria manter.

Ao mesmo tempo, o banco liderado por Carlos Tavares prepara-se também para reforçar a sua rede comercial com a abertura de dez balcões até final do ano. Serão pequenas unidades localizadas fora dos grandes centros urbanos, com dois ou três funcionários. “Procuramos estar mais onde os outros estão menos”, afirmou durante a apresentação de resultados.