Alimentação. Ainda sabemos o que podemos comer?

Alimentação. Ainda sabemos o que podemos comer?


Há cada vez mais estudos sobre os alimentos e muitos são até contraditórios. Devemos beber leite? 


Cuidar da alimentação é uma preocupação cada vez maior dos consumidores. Já ninguém convence os portugueses de que as carnes vermelhas não fazem mal à saúde, de que as processadas podem ser comidas sem restrições ou de que o azeite faz mal. Contudo, há alimentos que ainda nos deixam confusos, muito por culpa dos estudos:o que fazer, por exemplo, com o leite, os ovos, o café e a soja? Ainda sabemos o que comer? 

Os estudos sobre a alimentação “confundem um pouco o consumidor”, admite Lilian Barros, ressalvando contudo que haver várias pesquisas é positivo para ir actualizando o conhecimento. Mas quando o tema é alimentação o que é certo ou errado acaba por se tornar um pouco relativo, avisa a nutricionista: “Não há alimentos bons e maus, temos é de saber moderar. O alarmismo nunca é boa solução.”

O último aviso veio da Organização Mundial de Saúde: as carnes processadas consumidas diariamente aumentam 18% o risco de cancro. Só que este alerta não é propriamente “uma grande novidade”, diz Lilian Barros. Na verdade, o que a OMS fez foi reforçar uma ideia que já estava enraizada: “Os nutricionistas sempre recomendaram as carnes brancas em substituição das vermelhas e as processadas sempre foram algo que tentámos evitar”, justifica.
Maria de Lourdes Modesto também não foi apanhada de surpresa por esta notícia: “Trabalhei com uma professora em Coimbra que já falava da influência do fumo nos enchidos e da eventual participação no aparecimento de cancro. E isto foi há mais de 20 anos”, conta a educadora de economia doméstica, acreditando que com o tempo o receio vai desaparecer.

ALIMENTOS PONTO POR PONTO O certo é que alguns alimentos que antigamente eram aconselhados para um consumo regular deixaram de o ser. E o contrário também já aconteceu. O que fazer quanto ao leite? “Antigamente era aconselhado para evitar a osteoporose e agora começa-se a fugir a essa recomendação”, explica Lilian Barros. Provavelmente é uma questão de modas, diz Maria de Lourdes Modesto: “Agora por exemplo é o leite, toda a gente passou a ser alérgica à lactose.” O café também já foi alvo de duras críticas e encarado como um detonador de ataques cardíacos. “As investigações mais recentes comprovam que afinal o consumo moderado não interfere com a tensão arterial. Um consumo regular de dois ou três por dia, dependendo de pessoa para pessoa, tem imensos benefícios, nomeadamente na prevenção de algumas doenças degenerativas do sistema nervoso central, como o Parkinson ou o Alzheimer.” Veredicto: beber, mas não em excesso. 

Também a soja, alimento até há pouco tempo considerado saudável e que foi entrando nos hábitos dos portugueses, está debaixo de fogo. Lilian Barros afirma que este alimento é “controverso”, até porque muito do que encontramos no mercado é transgénico e portanto acaba por não ser benéfico: “Em excesso, parece estar associada a algumas alterações ligadas ao cancro da mama, e até haver mais estudos não convém exagerar.” A resposta é portanto “nin”, porque neste ponto existem muitas dúvidas, até para os nutricionistas.

E os ovos? Já ouvimos que não podemos comer mais de dois por semana, mas também já se concluiu que não fazem mal nenhum. Para a nutricionista não há dúvidas: “São bons.” Podem ser consumidos sem receios, até porque o colesterol alimentar não influencia directamente o colesterol sanguíneo.

Os ovos, aliás, têm sido “injustamente tratados”. Houve “uma altura em que se batalhou muito contra eles”, ignorando que antigamente se faziam “diversas refeições à base deste alimento, como a omelete ou o pastelão”, conta Maria de Lourdes Modesto.

Já no capítulo das gorduras, Lilian Barros é peremptória: “Defendo o azeite. É 100% gordura – portanto engorda –, mas é uma gordura saudável, com um poder lipídico bastante interessante do ponto de vista da saúde”, garante. Como alternativa, temos o menos tradicional óleo de coco.

COMER SAUDÁVEL Nos cursos, ensinaram a Maria de Lourdes Modesto que os hábitos alimentares eram os mais difíceis de mudar. “Isso talvez fosse verdade nos países do Oriente ou assim”, defende sem margem para dúvidas. O caso português contudo não se mede por esta bitola: “Somos muito adeptos da mudança e vimos que de repente as pessoas passaram a comer de uma maneira muito diferente”, também porque as mulheres passaram a trabalhar fora de casa. Todos os alimentos têm prós e contras, e por isso a chave está na variedade: “Deve-se comer com a maior diversidade possível e ter em conta que já não é preciso comer as mesmas quantidades que se comiam: agora subimos de elevador e em casa temos o aspirador. Gastamos menos calorias.”

Lilian Barros explica que uma alimentação saudável é acima de tudo uma alimentação personalizada. “Não há uma tampa para todos os tachos”, mas há regras que podem ser aplicadas a todos. Repartir as refeições ao longo do dia (não passando mais de três horas sem comer), ter a certeza de que existe uma prevalência de vegetais, hortícolas e cereais integrais, optar por carnes mais magras – como as brancas – e consumir mais peixe que carne. E para rematar uma questão fundamental: a água. “Não podemos esquecer a hidratação. Em consulta, é uma das minhas primeiras recomendações”, remata a nutricionista.