Atendimento à portuguesa


Desventuras de ser turista no nosso próprio país


Aqui há uns tempos decidimos lá em casa que íamos aproveitar os tempos livres para visitar sítios que, por fazerem parte do nosso património coletivo, até parece que já lá fomos… só que não. Ainda não fomos a todos os destinos da lista – o próximo há de ser o Palácio de Monserrate, em Sintra, ou a biblioteca do Palácio Nacional de Mafra –, mas um par de incursões turísticas mais tarde, há qualquer coisa no acolhimento português que me tem intrigado.

Não quero ser injusta: desconheço as condições de trabalho de quem está nos guichés, bilheteiras, banquinhos, portas e demais postos de serviço das atrações culturais nacionais e admito que possam não ser as mais motivadoras – infelizmente, em Portugal, os deputados até podem ganhar “pouco” e precisar, por isso, de ter as suas viagens pagas duas vezes, como se tem ouvido nas últimas semanas, mas a maioria de nós ganha menos e não tem ajudas de custo para ir trabalhar. Além disso, muito das condicionantes de atendimento resultarão de ordens, desordens ou omissões superiores.

Dito isto, eis duas experiências recentes. Atraída pelas notícias sobre os 250 anos do Jardim Botânico da Ajuda e a possibilidade de um instagram com um dragoeiro de 400 anos, lá fomos de passeio numa tarde de sol.

À chegada, depois de pagar bilhete, a única informação do funcionário foi que meia hora antes da hora de fecho era bom que nos encaminhássemos para a saída. Pensei que ia viver uma verdadeira aventura na selva com o risco de perder a noção do tempo numa qualquer gruta e já não ter tempo de chegar à saída antes de o sol se pôr. Quem conhece o espaço – eu, agora, já conheço! – perceberá que meia hora, em passo normal, dá para ir e vir de uma ponta à outra duas ou três vezes. Ainda assim, cumpridores das regras, lá estávamos nós à hora de saída. Só que não deu logo para sair: o portão já estava devidamente agrilhoado e o funcionário teve de reabri-lo para deixar sair os (desejados?) visitantes.

Outra particularidade que nos é anunciada à chegada como se fosse a coisa mais normal do mundo – e não é um exclusivo deste jardim – é o facto de, “ao fim de semana”, a zona de estufas estar fechada. Aqui, a culpa estará longe de ser do funcionário, mas não deixa de ser estranho que este tipo de coisas se vão repetindo, quase a chamar-nos parvos por não aparecermos durante a semana já que, pelo mesmo bilhete, podíamos ver mais coisas. Algo que a mim pessoalmente me irrita tanto como a idiossincrasia de estar um dia de sol e ter de sair do parque infantil com a minha filha porque é horário de inverno e fecha às 18h ou às 17h30 – do género Alvito ou Quinta Pedagógica dos Olivais.

A segunda experiência pouco agradável de que queria falar, porque me entristeceu mesmo, foi uma visita também recente à Universidade de Coimbra. Além de alguns espaços estarem com sinais de degradação que começam a ir além do kitsch, o atendimento é bastante sui generis, para não dizer grosseiro mesmo.

Há vários polos, mas logo à chegada somos informados de que, se é para ir à Biblioteca Joanina, só há uma hipótese: o bilhete que dá direito a ver tudo e custa 12 euros. O preço não me choca – percebo que, se queremos condições, não pode ser tudo de borla. É a atitude, quase a castigar-nos por querermos ver um dos espaços mais sonantes. E, sobretudo, o pouco a que dá direito, além de um conjunto ainda numeroso de pessoas a abrirem e fecharem portas à passagem dos visitantes.

O atendimento, na maioria por jovens, é sobranceiro. Indicam-nos horas exatas para estarmos nos sítios, sob pena não se percebe muito bem de quê. Do género: às 16h é para estar à porta da Biblioteca Joanina e até lá têm dez minutos para visitar a Capela de São Miguel. Em cada entrada limitam-se a abrir-nos a porta e a detalhar que tipo de fotografias podem ou não podem ser feitas, não há a menor informação oral sobre os espaços que estamos a visitar. Nas salas há folhas informativas com alguns detalhes mas pouca história – e História decerto não faltará ali.

No Laboratório Chimico há uma exposição permanente de demonstrações científicas e algumas instalações, de tão permanentes talvez, não funcionam. No chão da casa de banho encontro uma aranha morta com uns três centímetros de comprimento que ficaria seguramente melhor, num frasco de formol, na dita exposição.

Vou continuar a ir para fora cá dentro, mas nem sempre nos temos sentido propriamente bem-vindos. Talvez sejamos mais críticos no nosso país, até porque não estamos de férias, mas diz-se que somos um povo hospitaleiro. Melhorar o atendimento já não era mau.

 

Jornalista

Escreve à sexta-feira