JO. A menos de 100 dias, Tóquio parece cada vez mais distante

JO. A menos de 100 dias, Tóquio parece cada vez mais distante


Os Jogos Olímpicos de Tóquio arrancam a 23 de julho, mas o aumento de casos no país e no mundo coloca a realização novamente em dúvida.


Faltam já menos de 100 dias para o arranque dos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, que deveriam ter acontecido no verão do ano passado, mas acabaram adiados devido à pandemia mundial da covid-19. A pouco mais de três meses da cerimónia inaugural, no entanto, o futuro não parece risonho, e tudo e todos parecem estar contra a realização da maior competição desportiva a nível mundial. Se foi a pandemia que obrigou ao seu adiamento em 2020, e se existia uma esperança coletiva que o evento pudesse ser uma despedida ao mal-estar e às dificuldades trazidas por essa epidemia, um estilo de “luz ao fundo do túnel”, essa esperança parece esvanecer-se cada vez mais, com uma nova onda mundial de casos de covid-19, mais obstáculos na administração das diferentes vacinas, e uma população nipónica bastante atrasada no seu próprio processo de vacinação, atingindo apenas 1% dos habitantes do país.

Ao i, José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico de Portugal, ainda assim, garantiu que não tem, até ao momento, qualquer indicação de que o evento venha a ser adiado ou cancelado, garantindo que “há medidas de condicionamento e de segurança sanitária que estão anunciadas e que serão cumpridas”. José Manuel Constantino afirma que o Comité está a trabahar sobre o “pressuposto” que “os Jogos se vão realizar na data anunciada”.

Nas mãos dos organizadores do evento estão difíceis opções. Um segundo adiamento não é uma escolha provável, pelo que ficará o cancelamento total da competição – uma realidade que só se verificou em 1916, 1940 e 1944, devido às guerras mundiais de então – ou a sua realização, dentro dos moldes possíveis, com limitações e medidas restritivas. Nenhuma das opções, no entanto, augura bons resultados. Caso o Comité Organizador avance com a realização do evento, que se mostra a opção mais popular dentro do órgão, estima-se que Tóquio vá receber cerca de 90 mil visitantes – entre atletas, dirigentes e jornalistas. Este número, relativamente reduzido em comparação a outras edições dos Jogos Olímpicos, resulta da proibição que o Japão colocou à participação de espetadores estrangeiros no evento, uma das medidas inéditas destes Jogos, fazendo com que as comitivas dos diferentes países passem a não poder contar com o apoio dos adeptos nacionais. Uma realidade cujos efeitos José Manuel Constantino diz não poder antever, garantindo ainda que “seguramente seria bem mais acolhedor não estar sujeito a esta obrigação”.

Ainda assim, a chegada e a convivência de 90 mil pessoas poderá resultar num aumento exponencial de novos casos positivos de covid-19, num país que vacinou, até agora, apenas 1% da sua população, e que tem visto já, neste mês de abril, um novo surto de casos, ultrapassando a barreira dos 500 mil casos positivos desde o início da pandemia.

Já o cancelamento do evento é uma realidade que, pelo menos para o Comité Olímpico Internacional, está “definitivamente” fora da mesa. “Continuamos a receber todo o apoio. Todos os planos estão pensados num contexto da pior das hipóteses, e esperamos influenciar a opinião pública através das medidas de segurança”, garantiu John Coates, principal representante do Comité Internacional na organização dos Jogos de Tóquio, citado pela Reuters. A população nipónica, no entanto, não parece estar tão certa sobre a impossibilidade do cancelamento dos Jogos, e, pelo menos 70% dela, segundo a agência noticiosa japonesa Kyodo News, acha que essa seria a melhor medida a tomar.

O futuro dos Jogos é ainda incerto, mas as entidades organizadoras parecem focadas em levar avante o evento, até porque, em caso de adiamento ou cancelamento, o calendário desportivo mundial será também fortemente afetado, com o Campeonato Mundial de futebol a decorrer em 2022, no Catar, tal como os Jogos Olímpicos de Inverno, que se vão realizar em Pequim, também em 2022.

Ainda que as instituições neguem a necessidade de um adiamento ou de um cancelamento, só os próximos três meses e a evolução da pandemia ditarão se os Jogos se vão ou não realizar, tendo já começado com o pé esquerdo, após o cancelamento de alguns dos ‘eventos teste’ que serviriam para experimentar a eficácia das medidas de combate à pandemia no contexto dos Jogos, durante este mês de abril, e o bloqueio da passagem da chama olímpica em algumas cidades japonesas, com o receio de se criarem grandes aglomerações nas ruas, tal como aconteceu em Osaka e em Matsuyama.

 

Polémica e receios

Por entre o receio dos atletas e das comitivas de participar nos jogos e o discurso assertivo do Comité Olímpico Internacional, que garante que “não há um plano B”_para estes Jogos, um dos pontos mais polémicos deste período pré-Jogos foi a retirada da Coreia do Norte, que argumentou querer “defender” os seus atletas da pandemia global da covid-19. A ausência do país eremita é uma forte machadada nos esforços mundiais para conciliar o regime de Kim Jong-un com o vizinho do sul, cujo Executivo acredita, ainda assim, que os norte-coreanos possam ainda repensar a participação no evento. Os Jogos ficaram também já marcados pela polémica envolvendo Yoshiro Mori, antigo presidente do Comité Organizador japonês, que acabou por abandonar o lugar, após ter defendido que o tempo dado às mulheres para falar nas reuniões do Comité devia ser limitado, porque “falam demasiado”. Os comentários caíram mal, e acabaram por colocar mais um entrave na já extremamente difícil organização dos Jogos.