Por Teresa Peña, Professora Catedrática e Presidente do Conselho Pedagógico do Instituto Superior Técnico
A crise na saúde trouxe um salto quântico na digitalização em todos os aspetos da Sociedade. As Universidades não foram exceção. De um dia para o outro em 2020 foram levadas ao ensino remoto de emergência. Em 2022 voltámos às salas de aula físicas e regressámos “à normalidade”. Queremos voltar ao ponto onde estávamos e retomar as práticas de ensino e aprendizagem anteriores à pandemia?
Durante a pandemia renovámos cartões de cidadão sem deslocações e perda de horas em serviços públicos, assinámos documentos eletronicamente, marcámos, tivemos consultas e agendámos vacinação online, recebemos confirmações e prescrições médicas por SMS, acedemos ao registo de vacinas e exames médicos por apps, encomendámos online o essencial e o supérfluo, fizemos reuniões familiares e profissionais à distância.
Em várias dimensões, fomos interiorizando com enorme rapidez estas novas possibilidades e criámos novas rotinas. Compensámos o isolamento com a conectividade. Felizmente o isolamento parece estar a findar: a conectividade não permite uma experiência social e humana completa. Mas não devemos voltar atrás no que ganhámos em conexão e acessibilidade.
Nas Universidades, professores e alunos voltam a estar juntos no espaço físico da sala de aula. Mas o que aprendemos com as ferramentas digitais está à distância de um click difícil de recusar. As aulas de dúvidas (“office hours”) através de plataformas digitais são o primeiro exemplo de práticas que ficarão. Dão flexibilidade na mobilidade no espaço e na gestão do tempo. E são ainda mais adequadas que a aula-palestra presencial para discutir o detalhe de um problema/tema que preocupa um dos estudantes, para partilhar impressões individuais e dar feedback.
Já nas suas Notas Histórico-Pedagógicas de 1922, Alfredo Bensaúde, fundador do Instituto Superior Técnico, parte do princípio da adaptação do ensino ao indivíduo ser fundamental: “A primeira circunstância a considerar, ao criar-se o Instituto, foi a qualidade da matéria prima aluno; do seu modo de ser depende a escolha dos métodos destinados a tirar o melhor proveito (…) das suas disposições naturais”. Este princípio é atual e reforçado pelos desafios de hoje. Por isso a reestruturação recente dos cursos do Técnico (IST), pensada antes da pandemia e implementada só agora, alargou a componente opcional dos cursos, abrindo-os aos interesses e capacidades individuais.
Provocar pensamento e não apenas transmiti-lo
Este princípio da flexibilidade determinou o desenho curricular, mas há dois princípios que queremos para alicerce da sua implementação: 1) Ensino sustentado numa matriz de “Research School” e de Ciência que permite mudar o mundo para melhor; 2) Educação inseparável da sua experiência e vivência.
A missão da Universidade é dar poder e capacidade aos estudantes para lidarem com problemas inesperados. As Universidades prepararam o indivíduo para melhor construir o futuro. Ora este futuro é cada vez mais incerto, na rapidez das transformações da globalização e da era digital. O Mundo, a Tecnologia e a Ciência, a própria existência são cada vez mais voláteis, como a pandemia expôs.
No atual contexto, o conhecimento é um instrumento, um método, não um “estado”. Sem abandonar o valor fundacional de “transmitir conhecimento”, devemos transferir práticas e metodologias de conhecimento, “provocar pensamento”, responder ao que a pandemia também catalisou: o compromisso de colaboração da Universidade com a Sociedade.
Numa era de rápida evolução do conhecimento, tecnologia e interatividade remota generalizada em redes, como aumentar a capacidade de aprendizagem profunda e contínua? Como preparar a nova geração para o desconhecido, a incerteza e a flexibilidade? Como implementar e incentivar a aprendizagem colaborativa e o trabalho de projeto em equipa que sustentam os resultados da Ciência, da Tecnologia e da Indústria? Embora falte o tempo histórico para distanciação, as mudanças impostas pela crise pandémica sugerem respostas.
A interpenetração do espaço físico e digital na sala de aula, a fusão do ensino digital e tradicional é um caminho possível para motivar e criar pensadores originais e atitudes colaborativas. A aprendizagem ativa a partir de casos de estudo e projetos, o ensino de proximidade com vários atores, investigadores e alunos graduados, o incentivo à criatividade e ao questionar podem apoiar-se em recursos digitais no ensino.
As tecnologias de realidade aumentada e o Meta universo poderão vir a afetar o Ensino, mas sendo anunciadas há cerca de uma década, não estão consolidadas ainda para uso generalizado. Mais perto estão já pacotes para outras atividades síncronas e assíncronas que a bibliografia de revisão da indústria edtech considera ter potencial imediato. São baseados nas tecnologias móvel e de redes sociais. Há as ferramentas síncronas de suporte às aulas interativas e as assíncronas para orientação de estudo, gestão de trabalho autónomo do estudante, revisão por pares e autoavaliação.
Irão ser precisos recursos para ligar estas ferramentas num sistema de gestão pedagógica integrado único e formar professores. Os estudantes já estão prontos! Será investimento com retorno, pois as aulas presenciais têm de assegurar mais personalização na aprendizagem, mais “alta-costura” e menos “pronto a vestir” na Educação Avançada.