Leitor de BD: Um pequeno país

Leitor de BD: Um pequeno país


As escolhas são todas respeitáveis e incontroversas na quase totalidade. Por ordem de nascimento, o livro abre com Edgar P. Jacobs (Blake e Mortimer). 


Um país pequeno como a Bélgica, que em anteriores encarnações políticas foi pátria de van Eyck, van der Weyden, Bruegel, Rubens, van Dyck até, na figuração actual, Ensor, Magritte ou Delvaux, entre muitos outros, só encontra na opulenta Itália nação que com ela se meça com vantagem; assim também na BD a Bélgica na Europa, pese a França – Uderzo e Goscinny, por exemplo, afirmaram-se primeiro lá e só depois no país natal; ou Jacques Martin… – ou ainda a Itália, a terceira potência do Velho Continente. Historicamente, em face da Bélgica, só os Estados Unidos, com os seus comics.

Régine Vandamme (Bruges, 1961) uma escritora que se assume leitora, seleccionou, em 2003, 19 autores para um mimoso mini coffee table book, e escolhendo, também deixou de fora, inevitavelmente: Hermann (Bernard Prince, Comanche, Duke), a ausência mais gritante, mas ainda o próprio Greg (Achille Talon), E. Aidans (Tounga), François Craenhals (Chevalier Ardent) William Vance (Bruno Brazil, Ramiro, XIII) ou Dany (Olivier Rameau).

Dito isto, as escolhas são todas respeitáveis e incontroversas na quase totalidade. Por ordem de nascimento, o livro abre com Edgar P. Jacobs (Blake e Mortimer), o “génio do estilo narrativo rigoroso e grafismo magistral”; em Hergé (Tintin), aponta o contraste entre a perfeição do herói com os múltiplos defeitos das restantes personagens, aliado à grande legibilidade do desenho. Willy Wandersteen (Bob e Bobette), apesar de Hergé lhe chamar o Bruegel da BD, está, quanto a nós, num patamar abaixo.

Segue-se o grande Jijé (Jerry Spring), autor do primeiro western humanista, com grandes cenários e enquadramentos audaciosos; Morris (Lucky Luke), o pai da expressão 9.ª Arte; Paul Cuvelier (Corentin), desenho minucioso e sensual; Raymond Macherot (Clorofila, Coronel Clifton, Sibylinne), o animalismo negro da primeira série, a autora fala-nos da espantosa paleta do desenhador; André Franquim (Gaston Lagaffe, Ideias Negras), de quem Hergé dizia que era ele o grande artista; Peyo (João e Pirolito, Schtroumpfs), a clareza imaculada; Guy Peellaert (Jodelle), com a aproximação à Pop Art; Louis Joos e a paixão pelo jazz e o claro-escuro em técnica mista; Comès (Silêncio), a grande tradição do preto-e-branco, na esteira de Milton Caniff, Hugo Pratt e José Muñoz; Claude Renard (Galileu, Diário de um Herético), dum virtuosismo deslumbrante; Sokal (Canardo), um antropomorfismo em policial desbragado; Philippe Gelluck (O Gato), ou o triunfo do nonsense; o abençoado Frank Pé (La Bête), entre Franquin e Egon Schiele; François Schuitten (As Cidades Obscuras), entre Winsor McCay e Moebius; Yslaire (Sambre), uma das mais perturbantes criações da BD, e, por fim, Thierry Van Hasselt, cujas influências vão de Alberto Breccia a Francis Baco, ou a BD a reinventar-se como pintura e talvez a fugir dela própria.

Livro de uma senhora leitora, felizes os autores que são lidos com este amor.

Les Maîtres de la BD Belge

Texto Régine Vandamme,
Editora Tournai, La Renaissance du Livre, 2003

BDteca

Abecedário
M, de Martin Milan (Christian Godard, 1971). Piloto de um táxi-aéreo, o “Velho Pelicano”, que a cada voo fica mais desconjuntado, Martin Milan é um humanista entre o fleumático e o frio, sempre do lado do mais fraco e inseparável do seu cachimbo. O humor entrelaça-se com a poesia.

 

 

 

All You Need Is Kill, tomos 1 e 2, por Takeshi Obata. “A Terra é invadida pelos Mimics, uma raça alienígena de monstros quase indestrutíveis. Durante a batalha, Keiji Kiriya um dos recrutas inexperientes a usar uma armadura blindada, é abordado por Rita Vrataski, a famosa «Pantera Blindada». Conseguirão Keiji e Rita romper o círculo vicioso da batalha interminável?” (Devir)

 

 

Churubusco, de Andrea Ferraris. Na guerra com os Estados Unidos, o soldado Rizzo refugia-se na aldeia de Churubusco, “um dos últimos bastiões da resistência mexicana que, aqui, simboliza também a dignidade da luta pelos ideiais e pela terra.” (Escorpião Azul)

 

 

 

Wolverine: Preto, Branco & Sangue, por vários autores. Livro a várias mãos e diversas histórias sobre o mutante mais carismático dos quadradinos (G-Floy).