O milagre e o paradoxo


Importa dar atenção a pilares fundamentais como a qualidade das instituições, aspeto muitas vezes menosprezado, mas com claro impacto na eficiência económica


Nas últimas décadas, Portugal tem registado progressos notáveis em matéria de inovação. A acumulação crescente de capital humano, o aumento da capacidade instalada de investigação e a crescente sofisticação das empresas e dos seus negócios explicam a evolução nos rankings internacionais. De facto, de acordo com o European Innovation Scoreboard, Portugal é hoje um país “strong innovator”, grupo onde encontramos a Alemanha, França ou a Áustria. Os resultados são tão ou mais reveladores dos progressos quando vemos que nem a Espanha, nem a Itália conseguem um desempenho global tão positivo. Esta evolução, assente na consolidação acelerada do sistema nacional de inovação e nas positivas alterações nas dinâmicas empresariais de inovação constitui um verdadeiro milagre estatístico que nos deve orgulhar a todos.

Em contraste, quando observamos o rendimento per capita em paridade dos poderes de compra (PIB per capita em PPC), vemos que Portugal é ainda um país pobre no contexto da União Europeia. Neste indicador, o nosso PIB per capita em PPC é inferior em cerca de 4000 mil Euros face a Espanha e em cerca de 5600 Euros face a Itália. Aqui jaz o paradoxo, se por um lado Portugal apostou com sucesso na economia do conhecimento, por outro lado continua “pobre”, com tradução obvia nos baixos salários relativos praticados. A razão direta destes resultados associa-se à produtividade em Portugal em que, segundo o Eurostat, Portugal registou 77% da média europeia, em contraste com os melhores resultados dos menos inovadores Espanha (98,6%) e Itália (105,6%). Para explicar estes resultados, somos por vezes assaltados por respostas simples e unidimensionais, muitas, normalmente, incompletas e feridas de imparcialidade técnica. De facto, vários fatores concorrem para explicar este desempenho menos positivo como a assimetria temporal de transformação no sistema de inovação (mais rápido no sistema de ensino superior e de investigação, mais progressivo no setor empresarial), a qualidade da organização das empresas, a menor inovação nos modelos de negócio, a legislação laboral ou os custos de contexto. Uma falácia é preciso combater. As diferenças de produtividade não decorrem de os portugueses trabalharem menos ou terem menos qualidade. Ao invés, a resposta tem de ser integral e multidimensional, sendo que importa dar atenção a pilares fundamentais como a qualidade das instituições, aspeto muitas vezes menosprezado, mas com claro impacto na eficiência económica.

A este respeito, o “Economic Surveys- 2019” da OCDE aponta a necessidade de investimento na qualidade da governação e das instituições como um fator determinante de melhoria da produtividade da economia portuguesa no longo prazo. Também o Global Competitiveness Report (2019), embora destacando a boa evolução de Portugal nos rankings internacionais (ocupando a posição 34 em 190 países, 2019), evidencia, no conjunto dos 10 pilares de análise, alguns aspetos preocupantes. Por exemplo, no que diz respeito à eficiência do sistema legal, a posição dePortugal é a 113ª, no que diz respeito à complexidade das leis relevantes para a economia, a posição dePortugal é a 96ª e no que diz respeito a auditoria e transparência, a posição é a 91ª. As dificuldades impostas por estas entropias são propícias ao descrédito generalizado nas instituições e nas regras, para além de elevarem de forma muito considerável a ineficiência operacional em Portugal. Para tal, basta analisar a morosidade do sistema de justiça, ou os tempos de resposta das instituições em Portugal, incluindo, aquelas que apoiam o investimento e as empresas. Acresce que a produtividade dopaís reflete também a produtividade do setor público, pelo que qualquer incremento tem necessariamente de refletir, igualmente, progressos no setor público,

Assim, afigura-se fundamental prosseguir a simplificação de processos, reduzir a carga burocrática e promover uma reforma que fomente o redesenho de processos, crie mecanismos de autorregulação ao invés de modelos de controlo-prévio e induza a inovação no setor público, para além do digital. Sem estas mudanças, a menor qualidade das instituições da governação impedirá Portugal de atingir o seu potencial de crescimento económico, perpetuarão custos de transação elevados (em tempo e dinheiro), induzindo as condições para o crescimento de fenómenos de corrupção.

 

 

 

 

 

O milagre e o paradoxo


Importa dar atenção a pilares fundamentais como a qualidade das instituições, aspeto muitas vezes menosprezado, mas com claro impacto na eficiência económica


Nas últimas décadas, Portugal tem registado progressos notáveis em matéria de inovação. A acumulação crescente de capital humano, o aumento da capacidade instalada de investigação e a crescente sofisticação das empresas e dos seus negócios explicam a evolução nos rankings internacionais. De facto, de acordo com o European Innovation Scoreboard, Portugal é hoje um país “strong innovator”, grupo onde encontramos a Alemanha, França ou a Áustria. Os resultados são tão ou mais reveladores dos progressos quando vemos que nem a Espanha, nem a Itália conseguem um desempenho global tão positivo. Esta evolução, assente na consolidação acelerada do sistema nacional de inovação e nas positivas alterações nas dinâmicas empresariais de inovação constitui um verdadeiro milagre estatístico que nos deve orgulhar a todos.

Em contraste, quando observamos o rendimento per capita em paridade dos poderes de compra (PIB per capita em PPC), vemos que Portugal é ainda um país pobre no contexto da União Europeia. Neste indicador, o nosso PIB per capita em PPC é inferior em cerca de 4000 mil Euros face a Espanha e em cerca de 5600 Euros face a Itália. Aqui jaz o paradoxo, se por um lado Portugal apostou com sucesso na economia do conhecimento, por outro lado continua “pobre”, com tradução obvia nos baixos salários relativos praticados. A razão direta destes resultados associa-se à produtividade em Portugal em que, segundo o Eurostat, Portugal registou 77% da média europeia, em contraste com os melhores resultados dos menos inovadores Espanha (98,6%) e Itália (105,6%). Para explicar estes resultados, somos por vezes assaltados por respostas simples e unidimensionais, muitas, normalmente, incompletas e feridas de imparcialidade técnica. De facto, vários fatores concorrem para explicar este desempenho menos positivo como a assimetria temporal de transformação no sistema de inovação (mais rápido no sistema de ensino superior e de investigação, mais progressivo no setor empresarial), a qualidade da organização das empresas, a menor inovação nos modelos de negócio, a legislação laboral ou os custos de contexto. Uma falácia é preciso combater. As diferenças de produtividade não decorrem de os portugueses trabalharem menos ou terem menos qualidade. Ao invés, a resposta tem de ser integral e multidimensional, sendo que importa dar atenção a pilares fundamentais como a qualidade das instituições, aspeto muitas vezes menosprezado, mas com claro impacto na eficiência económica.

A este respeito, o “Economic Surveys- 2019” da OCDE aponta a necessidade de investimento na qualidade da governação e das instituições como um fator determinante de melhoria da produtividade da economia portuguesa no longo prazo. Também o Global Competitiveness Report (2019), embora destacando a boa evolução de Portugal nos rankings internacionais (ocupando a posição 34 em 190 países, 2019), evidencia, no conjunto dos 10 pilares de análise, alguns aspetos preocupantes. Por exemplo, no que diz respeito à eficiência do sistema legal, a posição dePortugal é a 113ª, no que diz respeito à complexidade das leis relevantes para a economia, a posição dePortugal é a 96ª e no que diz respeito a auditoria e transparência, a posição é a 91ª. As dificuldades impostas por estas entropias são propícias ao descrédito generalizado nas instituições e nas regras, para além de elevarem de forma muito considerável a ineficiência operacional em Portugal. Para tal, basta analisar a morosidade do sistema de justiça, ou os tempos de resposta das instituições em Portugal, incluindo, aquelas que apoiam o investimento e as empresas. Acresce que a produtividade dopaís reflete também a produtividade do setor público, pelo que qualquer incremento tem necessariamente de refletir, igualmente, progressos no setor público,

Assim, afigura-se fundamental prosseguir a simplificação de processos, reduzir a carga burocrática e promover uma reforma que fomente o redesenho de processos, crie mecanismos de autorregulação ao invés de modelos de controlo-prévio e induza a inovação no setor público, para além do digital. Sem estas mudanças, a menor qualidade das instituições da governação impedirá Portugal de atingir o seu potencial de crescimento económico, perpetuarão custos de transação elevados (em tempo e dinheiro), induzindo as condições para o crescimento de fenómenos de corrupção.