Por Professores do Instituto Superior Técnico
A pandemia COVID19 mostrou, como nunca antes, a importância e capacidade transformadora das parcerias entre universidades, centros de investigação e desenvolvimento, empresas, e administração do Estado. Num tempo em que, num contexto pós-pandémico, equacionar a recuperação económica, social (e mental) do país se torna cada vez mais importante e urgente, a questão não é, pois, como fundamentar a necessidade destas parcerias mas, antes, como as construir, como as consolidar, como as potenciar e como as tornar ainda mais eficazes.
Não existem ainda estudos em Portugal com dados que permitam definir as condições ideais para o sucesso da transferência de conhecimento e parcerias universidade-empresa. Contudo, um estudo relativamente recente da NACRO (Network of Academic Corporate Relations Officers), que pode ser encontrado online com facilidade, mostra que, do ponto de vista das empresas, os critérios mais significativos para se estabelecerem parcerias com universidades e centros de investigação são seis: (1) o alinhamento entre a qualidade da formação dada e os objetivos de recrutamento da empresa; (2) o alinhamento dos pontos fortes de I&DT da universidade com o roteiro de desenvolvimento de produtos da empresa; (3) as relações existentes entre o corpo docente e os administradores/diretores da empresa; (4) a proximidade física da universidade à empresa; (5) o historial da universidade na gestão das relações com o tecido empresarial; e (6) a flexibilidade na gestão da propriedade intelectual da universidade. O estudo mostra ainda que, para além do recrutamento de talento, a investigação e colaborações baseadas em relações individuais de longa data com investigadores é determinante no estabelecimento de parcerias.
Do ponto de vista das universidades e centros de investigação, nos últimos anos, a estratégia de promoção de parcerias com empresas tem assentado sobretudo em seis dimensões: (1) o fomento de “redes de parceiros”, por forma a trazer os desafios das empresas e, através de uma estratégia de integração de atividades colaborativas multidisciplinares, ajudar à criação de valor no tecido económico, criando oportunidades de financiamento externo para a crescente necessidade de capacitação interna; (2) a observação e acesso ao talento, interagindo com alunos, ajudando-os a interpretar os principais desafios societais, e permitindo a captação de talento; (3) o apoio ao desenvolvimento do talento: atribuindo bolsas, prémios de mérito, e criando novas oportunidades para alunos, docentes e investigadores desenvolverem atividades de caráter experimental próximo daquilo que serão os desafios das empresas, por exemplo, no suporte à criação e/ou manutenção de laboratórios; (4) o acesso ao conhecimento para aceleração da inovação: definindo estratégias para projetos de investigação e de transferência tecnológica; (5) a responsabilidade social: através de bolsas de apoio a alunos, participação em atividades de integração, ou através de um apoio continuado aos núcleos de estudantes que tanto impacto trazem à vida das academias; e (6) a criação de programas de formação avançada para profissionais que, para além da capacitação de profissionais já colocados no mercado de trabalho é também uma ferramenta estratégica na transferência de conhecimento, não só proporcionando incremento das competências (up-skill), mas contribuindo para a sua reconversão (re-skill), num processo colaborativo permanente.
A resposta do país aos desafios pós-pandemia dependerá fortemente do alinhamento que vier a ser estabelecido entre as expectativas das empresas quanto àquilo que pode ser entregue em termos de apoio à sua recuperação por universidades e centros de investigação e as estratégias prioritárias de que as universidades e centros de investigação estabelecerem para a sua missão. Esse alinhamento estratégico é indispensável para o estabelecimento do caminho de uma investigação científica e tecnológica que contribua para a inovação e aumento do valor acrescentado nos produtos produzidos, no cumprimento das prioridades estabelecidas pela União Europeia para a década: transição energética, transição digital e sustentabilidade climática. Terá pois aqui o Governo um papel fundamental, não só criando as ferramentas financeiras adequadas à promoção dessas parcerias colaborativas, como reduzindo as barreiras administrativas e a descriminação territorial para o seu estabelecimento.
Dessa forma, estando a academia e o tecido empresarial empenhados em percorrer esse caminho, como o têm vindo a demonstrar, a inclusão no PRR linhas de investimento estratégico que permitam fomentar a criação de infraestruturas de interface inovadoras que possam integrar projetos de simbiose entre o ensino, a investigação e desenvolvimento e os diversos agentes económicos poderá alavancar os processos de transferência de conhecimento e o reforço dos modelos colaborativos entre academia e empresas e é indispensável que seja pensada desde já.