Em junho, dissemos ser preciso ajudar a TAP no contexto do generalizado auxílio às transportadoras aéreas europeias, contudo, prevenindo, que junto com o auxílio viria a obrigatoriedade de reconversão empresarial e metas de melhoria de rentabilidade sem práticas de encapotada distorção da concorrência.
Em junho também dissemos que o auxílio à TAP deveria ser observado como conjuntural (pandemia), já que o vital para Portugal são os aeroportos por hoje as numerosas companhias budget compensarem a descida das companhias “bandeira”. A Alitalia já mal chega a 10% dos passageiros internacionais enquanto só a Ryanair transporta 30%, mutação só viável graças à capacidade dos aeroportos italianos.
Com as notícias sobre o redimensionamento da TAP vindas a público é agora possível complementar o artigo observando os “grandes números” do especial desafio que Lisboa enfrenta ao ser a capital-destino turístico europeu que mais depende do transporte aéreo.
1. Não é com a debilitada TAP que Lisboa conseguirá capturar a procura de 65 milhões de passageiros aéreos.
A TAP no seu auge transportou dezassete milhões de passageiros, dos quais quinze em Lisboa. Agora, a capacidade da TAP terá de contrair à volta de 25%, num adverso contexto da saída do sócio estratégico (JetBlue) e da renacionalização (limitação de futuros investimentos pelas leis da concorrência EU).
Ora, em Lisboa, mesmo com otimismo da TAP em apenas baixar de quinze para doze milhões/estacionar dez anos neste patamar (até 2030) e começar a crescer a uma taxa anual de 2%, só no longínquo ano de 2042 a TAP voltaria a transportar em Lisboa quinze milhões.
2. A principal preocupação deve passar por criar condições aeroportuárias para atrair as outras companhias que irão transportar mais de 70 % dos passageiros em Lisboa.
Quem transportará os 45-50 milhões de passageiros além do provável limite TAP, as companhias legacy com hub próprio ou as budget com polarizados núcleos? No ano 2018 (fonte IATA), a primeira transportadora em passageiros internacionais foi a Ryanair com 137 milhões, secundada por EasyJet com 80 milhões, ficando-se Lufthansa por 51 milhões.
Ainda há poucos dias se soube que a Ryanair, aproveitando a baixa de preços dos construtores de aeronaves, acordou a compra de mais setenta e cinco Boeing 737 MAX, subindo o total da sua encomenda para mais de duzentas aeronaves, a serem entregues na totalidade até Dezembro de 2024. É sabido que o crescimento de Lisboa se concentrará nos voos europeus (mais de 80% do total) para o segmento estadias de curta-duração, o reinado das budget, não havendo dúvidas que será com elas que a maioria da procura será satisfeita.
A maior preocupação do Governo deveria ser a criação de um aeroporto de Lisboa com capacidade, além atender a TAP, cativar com o seu nível de serviço/pontualidade / preço, as bases das transportadoras budget que irão deter a maior fatia do tráfego em Lisboa.
Foi o que fez Barcelona, cujo aeroporto em relação a Lisboa tinha o handicap de não ser base de transportadora “bandeira”. No final do século passado, antevendo a aceleração do turismo, o aeroporto arrancou com a ampliação para um sistema de três pistas (duas paralelas) e a construção de um mega Terminal de um milhão de metros quadrados de área Placa/Stand, infraestrutura com que no ano passado movimentou 52 milhões de passageiros.
3. Com a solução da concessionária Vinci, Lisboa teria no ano 2062 só 70% da área Placa/Stand que Barcelona tinha no ano de 1995.
A espanhola AENA, a primeira operadora mundial em volume de passageiros (ano 2017) com 315,6 M é uma competitiva Operadora, para a referência Boeing 737-400 os seus aeroportos de Madrid e Barcelona apresentam com 13 euros a mais baixa taxa europeia, logo seguidos por Amesterdão com 14 euros, vindo depois Munique com 17 euros..
A experiente operadora espanhola, apesar dos seus dois hubs já serem muito maiores que Lisboa – o hub Madrid é seis vezes a Portela e o hub Barcelona três vezes – no seu plano estratégico em curso indica um investimento de 2835 milhões para criar Madrid-80MPAX (1571 milhões) e Barcelona-70MAX (1264 milhões), o que significa que Barcelona, que já dispõe um par de paralelas 3900m x 60m /2700m x 60m + Pista cruzada com 2700m x 45m, ganhará um suplementar terminal internacional, subindo a respetiva área Placa/Stand para um total de 2 350 000 metros quadrados.
A Vinci, ao fim de sete anos de concessão em que a única medida foi eliminar uma pista na Portela para usar como estacionamento em detrimento da segurança / fiabilidade, indica um investimento de 1150 milhões – grande parte a ser desperdiçado em desfazer para refazer – para a plataforma Portela ficar com uma única pista de 3700m x 45m, cujo taxiway atravessa a própria pista e, do outro lado do rio, a BA Montijo ficar só com uma pista para uso civil e militar de 2400m x 45m, apenas com 2050m para aterrar e cujo taxiway nem sequer abrangeria todo o comprimento da pista.
E, pasme-se, para o mesmo volume de tráfego 65-70MPAX, a diferença de área Placa/Stand entre Barcelona e solução Vinci (Portela + Montijo) aumentaria para quatro vezes. Lisboa teria no ano 2062 só 70% da área Placa/Stand que Barcelona dispunha no distante passado de 1995.
4. Avaliação Ambiental Estratégica irá pôr à mostra a ineficácia e tacanhez da solução Vinci “HUB Portela + Montijo”.
A Vinci, a concessionária de Lisboa até ao ano 2062, cresceu rapidamente no setor aeroportuário através de aquisições, com a compra da ANA, sendo a sua entrada nos aeroportos de maior porte. Em Portugal, na leonina posição de concessionária de todos os aeroportos, a Vinci procura impor a sua proposta global “Reforço do hub Portela + Montijo” quando apenas apresentou o parcial estudo para o Montijo, que representa menos de 25% da totalidade do tráfego.
A solução que a concessionária quer impor, entre muitas outras coisas, passou ao lado de afetar mais 250 mil pessoas com ruído excessivo ou Portugal perder milhões de turistas por falta de capacidade aeroportuária /taxas excessivas. Tudo isto e muito mais será agora examinado na Avaliação Ambiental Estratégica que em boa hora a Assembleia da República votou como necessária para a decisão sobre o aeroporto de Lisboa.