Um digesto de BD

Um digesto de BD


Méga Spirou oferece o equivalente a dois álbuns completos e todo o seu arsenal de gags, tiras e histórias curtas de pendor humorístico


Já há muitos anos que a revista Spirou é o verdadeiro “hebdomadário dos jovens dos 7 aos 77 anos”, desde que a rival Tintin, que ostentava essa frase na capa, cessou a publicação, em 1988. Spirou sai desde 1938, e não conhecemos melhor com semelhante modelo. Trimestralmente, a editora de Marcinelle lança também um grosso volume de quase 200 páginas, intitulado Méga Spirou, que, pelo preço módico de 5,90€ (mais um euro por cá), oferece o equivalente a dois álbuns completos e todo o seu arsenal de gags, tiras e histórias curtas de pendor humorístico, destinados à faixa etária em que também se encontra este leitor…

Neste n.o 20, as narrativas longas são Louca, de Bruno Dequier, série que conjuga o mundo do futebol com o fantástico, e Champignac, de BéKa e Etien, já referido na semana passada e a que queremos voltar.

Algumas das outras: Kid Paddle, de Midam, na capa da edição, ao pé de quem o insuportável Titeuf faz figura de bem-comportado; do mesmo Midam, com desenhos de Adam, o hilariante Game Over, com um desaustinado guerreiro de fantasia medieval e a sua “bela” dama, sempre ameaçados pelos terríveis blorks, monstros que são uma espécie de coisos; e acrescentemos Nelson (de Bertschy), um demónio endiabrado acolhido por uma rapariga e o seu cão; o ternurento Dad (de Nob), pai celibatário de quatro filhas, das fraldas à adolescência; Mamma Mia!, texto do grande Lewis Trondheim e desenhos de Obion, em que observamos o universo feminino multiplicado por quatro, da bisavó à bisneta; Tamara, jovem com romantismo e peso a mais, de Zidrou, outro grande autor, com traço de Darasse e Boss; e Les Vacheries des Nombrils, do casal Dubuc e Delaf, grupo de três teenagers em que Vicky e Jenny tentam aproveitar-se da ingenuidade benfazeja de Karinne, com resultados nem sempre os esperados. A não perder, os conhecidos em edição portuguesa: O Pequeno Spirou, da extraordinária dupla Tome & Janry (o primeiro, falecido em outubro, é aqui homenageado); o patusco Agente 212, de Cauvin e Kox; e Cédric, do mesmo Cauvin, com desenhos de Laudec, uma criança como todas as outras que, dada a avançada idade do seu criador, continua a brincar com os amigos na rua, algo que a selvajaria social que nos submerge deixou de permitir.

O veterano Raoul Cauvin (Antoing, 1938) é, de resto, uma figura que marca presença triplamente neste Méga Spirou, uma vez que assinalando, com o desenhador Willy Lambil (Tamines, 1936), 50 álbuns dos Túnicas Azuis, cujo palco da Guerra da Secessão é pretexto para muito mais do que uma série humorística, concede entrevista conjunta, retratando-se a si mesmos num gag. Nessa conversa ficamos a saber que durante o meio século de trabalho em conjunto estiveram cinco anos de relações cortadas, cabendo à redação fazer a ponte entre argumentista e desenhador…

Méga Spirou #20

Editora Dupuis, Marcinelle, dezembro de 2019

 

BDTECA

Um novo Blueberry… O tenente sulista desertor e malcomportado, agora revisto e reinterpretado por Joann Sfar e Christophe Blain, em dois álbuns. Sfar é uma garantia no argumento, e o que vimos dos desenhos de Blain entusiasma, pois parece resistir à tentação, provavelmente inalcançável, de imitar Giraud. O primeiro tomo apareceu no mês passado: Une Aventure du Lieutenant Blueberry – Amertume Apache (Dargaud, 2019).

 

… e Duke, outra vez Já saiu no país de origem o quarto álbum do processo de autodescoberta de Morgan Finch, aliás Duke, um western extraordinário de Hermann, com argumento do filho, Yves H. A edição portuguesa não deve tardar. Duke – La Dernière Fois que J’ai Prié (Le Lombard, 2020).

 

Mariana A história de Portugal, à beira dos 900 anos, está cheia de episódios por esclarecer. As Cartas Portuguesas, publicadas em Paris, em 1669, tiveram repercussão internacional. Atribuídas a Sóror Mariana Alcoforado (1640-1723), do Convento de Nossa Senhora da Conceição, em Beja, dirigidas ao cavaleiro de Chamilly, militar francês a combater nas Guerras da Restauração, a sua autoria ainda hoje é controversa, havendo quem defenda tratar-se dum apócrifo. De qualquer modo, inocente ou culpada de amor epistolar, a freira de Beja é uma figura nacional. Mariana, de Paulo Monteiro, é uma apresentação desta figura a um público jovem (edição: Panóplia d’Encantos, 2019).