Braga. A princípio eram verdes, os minhotos encarnados

Braga. A princípio eram verdes, os minhotos encarnados


Fundado em 1921 por simpatizantes do Sporting, o Sporting de Braga não tardou a tornar-se vermelho. Em 1945, José Szabo, uma das grandes figuras da história do futebol português, criou o Arsenal do Minho.


Diz a velha lengalenga; o Porto trabalha; Braga reza; Coimbra estuda; e Lisboa diverte-se… Já agora, todas gostam de futebol, algo mais indesmentível do que o estabelecido na ladainha. Braga pode muito bem ser a Cidade dos Arcebispos, mas também ninguém pode impedir um clérigo de se entusiasmar com o nobre desporto bretão. Por isso, na década de dez de 1900, já havia na capital do Minho clubes como o Liberdade Football Club, o Sport Clube de Braga ou o Estrela Football Club. Disputas acesas no Campo das Goladas. Depois, um grupo de rapazes adeptos do Sporting Clube de Portugal começou a juntar-se. Jogavam de verde, pois claro. Ou todos de verde ou de camisola cortada a meio, fatia branca/fatia verde, calções pretos. Aquele que ficou conhecido para os lados do Campo Grande como o equipamento Stromp, em homenagem ao grande Francisco, fundador dos leões de Alvalade e sua primeira grande estrela.

Nestas coisas de contar adeptos fico sempre de pé atrás. Não dou muito para o peditório, confesso. Parece que Braga, além de abundar em eclesiásticos tem muitos benfiquistas. Quando o Sporting Clube de Braga foi fundado oficialmente, no dia 19 de Janeiro de 1921, os moços que tinham escolhido as camisolas verdes foram perdendo a maioria e o equipamento passou a ser igual ao do Sport Lisboa e Benfica, sobretudo quando vários jogadores do Estrela Football Club, de profundas simpatias encarnadas, se mudaram para a nova agremiação extinguindo a antiga. Minhotos encarnados mas ainda não arsenalistas, como agora. Para isso foi preciso esperar vinte e cinco anos.

O húngaro József Szabó, com todos os acentos no original, que depois se tornou simplesmente José Szabo, foi um dos principais cabouqueiros do futebol português. Chegou um belo dia de 1926 à Madeira, jogando pelo Szombathely, por empréstimo do Ferencvaros, ficou no Nacional, seguiu para o Marítimo, agradado pelo clima e por estar longe de uma Europa que temia nova guerra, acabou contratado pelo FC Porto em 1930, levando com ele para a Invicta um tal de Artur de Sousa, o Pinga. Foi treinador e jogador dos azuis e brancos, venceu o primeiro campeonato nacional, em 1934-35, e resolveu viajar até Inglaterra e cultivar-se junto do campeão Arsenal e do seu treinador, George Allison, o aluno preferido do grande Herbert Chapman, inventor do WM, que morrera no ano anterior.

O método-Arsenal. Szabo regressou de Londres transformado e transformou as equipas portuguesas que treinou. Esteve uma época no Sporting de Braga (1936-37) antes de rumar ao Sporting. Os métodos de treino que aprendeu no Arsenal foram revolucionários: à frente dos leões ganhou seis Campeonatos de Lisboa, três Campeonatos Nacionais, dois Campeonatos de Portugal (o segundo já com a designação de Taça de Portugal) e a Taça Império, frente ao Benfica. Atingiu o ponto mais alto da sua carreira e lançou jogadores como Peyroteo e Jesus Correia. Regressou ao FC Porto em 1945, mas passou ainda por Braga uns meses. Meses em que mudou definitivamente a imagem do clube.

O Arsenal seria o farol da vida do húngaro Szabo. De tal forma que, ao voltar ao Sporting de Braga, na altura ainda a lutar pela sobrevivência na II Divisão, propôs à direcção do clube que os equipamentos passassem a ter mangas brancas, como o dos eméritos londrinos. Fez-se a experiência. Primeiro nas segundas categorias. O povo gostou. Rapidamente os adeptos aceitaram com agrado a mudança e na época de 1946-47 é vestido à Arsenal que o Braga se torna, pela primeira vez, campeão da II Divisão comemorando uma inédita subida. Durante nove anos consecutivos, o novo Arsenal, que a imprensa rapidamente tratou de alcunhar de Arsenal do Minho, manteve-se na divisão principal. O Sporting de Braga, que ao contrário do que muitos pensam, nunca teve qualquer ligação ao Sporting maior do que a de acumular simpatizantes, ia ganhando o seu espaço. Hoje, à beira dos cem anos de vida, já as camisolas e o emblema em tons de verde mergulharam nas ondas turvas do esquecimento.