Cascais, Horasis e uma Nova Globalização


A globalização económica talvez tenha sido um sucesso. Mas precisamos de mais do que isso. Precisamos de uma nova globalização.


O que é que uma princesa da Noruega, um chefe de Estado da região do Cáucaso e uma das maiores fortunas asiáticas fazem na mesma sala? Participam no Horasis. Que, não por acaso, teve lugar em Cascais no início deste mês.

Volto ao tema mesmo depois de as centenas de horas de debate já terem terminado e dos participantes terem voado de regresso às suas origens espalhadas pelos quatro cantos do globo. E porquê? A razão é simples: Portugal e Cascais continuam a ser impactados pelas ondas positivas deste grande evento muito para além da sua duração.

Mas, antes de mais, o que é o Horasis?

Para facilitar as coisas, há quem diga que é uma espécie de Davos. Em ponto mais pequeno.

A comparação não é rigorosa. Primeiro, nem Cascais nem o Horasis forçam comparações com Davos.

Cascais será sempre Cascais. Davos é Davos uma vez por ano.

Segunda, até acontece que esta vila portuguesa no coração do espaço euro-Atlântico é maior do que a sua congénere alpina na Suíça.

Terceiro, se em Davos estão sentadas as superpotências, o clube dos ricos, em Cascais está um concerto de nações – das mais ricas às emergentes, passando até pelos estados sem território e pelos territórios sem nação. Depois, e este é um traço distintivo, 80% dos participantes no Horasis vêm do mundo empresarial. Há representantes das indústrias mais inovadoras, os empreendedores mais disruptivos e os cientistas que testam todas as fronteiras de possibilidade. Em resumo, tudo gente que está mesmo a fazer a diferença no mundo real. Ora se em Davos se discutem tendências, em Cascais os participantes do Horasis criam-nas. É por isso que no Horasis não se trata de conversa: trata-se de ação.

Quarto e último lugar: o Horasis escolheu para sua casa um lugar que é, pela sua história, tradição e vocação, o espaço natural não apenas para discutir a globalização, mas para a criar e moldar.

Essa é uma vantagem comparativa única que Portugal e Cascais têm sobre boa parte do mundo mas que teimamos em não compreender. Representado ao mais alto nível por vários ministros, o Governo português parece ter percebido bem a importância de estar no Horasis.

Não se trata apenas dos muitos milhões de euros de investimentos que começam a ficar no país em função desta reunião – lembro que o valor somado de todas as empresas que estiveram no Horasis representadas ultrapassa largamente o PIB nacional. Não se trata apenas de Portugal, através da qualidade de vida, e atmosfera cosmopolita e tolerante de Cascais, estar a conseguir captar e fixar alguns destes conhecimentos e competências no nosso país – alguns dos quais, inclusivamente, já compraram casa e vivem entre nós.

Trata-se, sobretudo, de aumentar a notoriedade e o “poder suave” do nosso país no mundo.

Em abril de 2019, por cá foi discutida a forma de “catalisar os benefícios da globalização”.

Como contributo, que é pessoal mas que reflete a disposição nacional, sustentei que, apesar do mau nome, a globalização tem sido a maior responsável por tirar milhões da pobreza em todo o mundo, por ter aumentado exponencialmente o conforto e a esperança de vida de biliões de pessoas, por ter tornado os conflitos militares mais improváveis porque somos todos mais interdependentes.

Todavia, a globalização também gerou níveis de desigualdade inaceitáveis. É urgente quebrar esta ligação entre prosperidade económica para o maior número e graus de desigualdades crescentes.

A globalização económica talvez tenha sido um sucesso. Mas precisamos de mais do que isso. Precisamos de uma nova globalização. Uma globalização social e moral. No sentido de trazer responsabilidade e valores e humanidade a ação dos atores estaduais ou não estaduais.

Essa globalização, ainda que de forma ténue, já está em curso através de lideranças inspiradoras como o Papa Francisco. Precisamos de mais lideranças como essas nas empresas e também na política.

Precisamos sobretudo de mais lugares onde nos possamos encontrar para, nas nossas diferenças, construirmos uma humanidade comum.

É esse o grande legado do Horasis em Cascais. É isso que continuará a deixar ao nosso país nos próximos anos.

 

Escreve à quarta-feira