MOSCOVO – No Clube Beta, no início da noite paira no ar a mágica senhora das paixões. Os homens dispersam-se entre elas e ela, e ela é apenas a bola. Há quem esteja na dúvida, trocando os olhos; há quem tenha tomado a sua opção como um tipo, na minha frente, sentado ao balcão, de olhos fixos na televisão. Percebe-se que lhe agradam mais as formas da perfeição redonda do que as curvas das outras perfeições, se calhar para ele não tão perfeitas. Subitamente, no ecrã, há o remate bruto, certeiro. Golo da Suíça. Ele grita. Esquece a neutralidade dos suíços e coloca-se a seu lado. Um golo do quilé, diria o grande Assis Pacheco. O homem levanta o copinho de vodca e brinda: “Haraxó!” (Muito bem!) Está contente consigo próprio. Envaidecido mesmo.
E eu recordo uma história velha, acho que contada pelo Duda Guennes, figura injustamente caída no olvido, dono de um humor empolgante. Também sobre um homem sozinho, sisudo, numa mesa escondida de um tasco no qual todos se excitavam com um jogo do Brasil, pouco importa contra quem. Brasil de Pelé, Tostão e Jairzinho e Rivelino e o diabo a quatro.
O Brasil ataca, mas nada de golos. A rapaziada enerva-se, discute, solta palavrões, insulta o árbitro até à quinta geração, porteira, mulher-a-dias e tudo. Sinistro, no seu canto, o homem mantém-se num silêncio obtuso. O olhar fixo, quase demente.
Foi quando Pelé esqueceu os companheiros e fez tudo sozinho, driblando meia equipa adversária, contornando o guarda-redes, chutando vitorioso para a baliza vazia.
Então, o solitário deu um murro na mesa, violento. E gritou como um possesso orgulhoso: “Comigo é assim!”