101 mortos que não voltam a ter férias!


António Costa, além de segurar Constança Urbano de Sousa, ansiosa por férias que não teve (qual escudo até pessoal, ao estilo “melhor atacarem-na a ela ou, a seguir, ainda me atacam mas é a mim!”), optou pela fuga para a frente, ou seja, da inevitabilidade destas tragédias


Novamente os incêndios nas noticias de Portugal no mundo. Novamente as mortes a percorrerem os noticiários nacionais, perfazendo 101 em apenas dois incêndios este ano. Depois de Pedrógão, muito se prometeu, tamanha a desgraça que a todos atingiu. Costa garantiu, no calor da emoção, que apesar dos defeitos do ordenamento territorial, o governo iria prevenir a ocorrência de novos casos no futuro e atuar na prevenção dos incêndios. Depois de múltiplas conclusões precipitadas e de uma ministra da Administração Interna perdida na voracidade das labaredas, uma comissão independente foi nomeada e os resultados ansiosamente aguardados. Talvez por isso, talvez porque o OE/2018 tivesse prioridade total, a verdade é que muito se soube das reuniões interpartidárias de afinação das exigências de uma esquerda voraz na distribuição das folgas orçamentais geradas por um (bom) crescimento económico, sustentado em exportações e não no consumo, como o governo tinha preconizado, e pouco ou nada se soube de reuniões visando prevenir futuras tragédias originadas pelos fogos.

Mas depois de um verão anómalo, com uma seca em setembro que, dizem as estatísticas, não havia há 87 anos, depois de serem desmobilizados meios de prevenção de incêndio em 30 de setembro, apesar dos avisos da Liga de Bombeiros de que havia sérios riscos de este verão anómalo se prolongar, cerca de 30 aviões, 4 mil homens e 800 veículos foram dispensados no final da fase Charlie. Razões economicistas? Seguramente, também, mas sobretudo aquela crença bem portuguesa que nada de mal nos volta a acontecer – chegou uma vez, caramba!!! Azar dos azares, sobretudo para as populações dramaticamente atingidas, dias depois da publicação do relatório da tal comissão independente com conclusões que a todos nos envergonham, mas sobretudo à Proteção Civil por manifesta inépcia operacional, em 15 e 16 de outubro houve mais de 500 fogos, 36 mortos, 63 feridos e sete desaparecidos (no momento em que escrevo o texto).

No calor dos acontecimentos, a ministra novamente consumida pelas labaredas referia aos quatro ventos que não se demitia (as tais nomeações politicas de responsáveis inexperientes para funções da Proteção Civil apenas pela cor política são da responsabilidade de quem?) e António Costa, sempre assertivo e de forma arrogante perante um país incrédulo com o que sucedia, garantia que estas tragédias iriam voltar a acontecer, em vez de tranquilizar os portugueses carentes de garantias, mesmo que achassem perante os factos que os políticos só dizem o que gostamos de ouvir. Desta vez, António Costa, além de segurar Constança Urbano de Sousa, ansiosa por férias que não teve (qual escudo até pessoal, ao estilo “melhor atacarem-na a ela ou, a seguir, ainda me atacam mas é a mim!”), optou pela fuga para a frente, ou seja, da inevitabilidade destas tragédias. Pode até ter razão mas, neste momento e nesta hora, tudo isso era o que os portugueses não precisavam de ouvir. Quanto a Marcelo, não o vi aparecer, e a borrasca era grande e justificava-o plenamente. Terá tido receio de ser confrontado com estas intempestivas declarações de Costa? Faltou a palavra do Presidente, e tanta era a desorientação governamental que os portugueses precisavam dela, isso é certo!

As horas seguintes foram de debates sobre tudo e sobre nada. Os peritos na TV sucediam-se, as razões para o sucedido eram diversas, entre “o tempo punha-se a jeito para os fogos”, “o ordenamento territorial é desastroso”, “as pessoas não têm dinheiro para limpar matas”, “as comunicações continuaram a não funcionar porque as calhas técnicas continuam por utilizar”, apesar de uma vez (e bem) Costa ter a elas aludido (“só” passaram quatro meses desde Pedrógão e as palavras de Costa caíram em cesto roto!), “os criminosos que ateiam fogos não são presos e ninguém investiga os beneficiários dos fogos”, “as precárias verbas governamentais para vigilância ou prevenção (apenas 25M, ao que diziam) por contraposição aos valores largamente despendidos com correções salariais ou admissões na função publica” – ou seja, os mortos iam sendo o mote para todos darem sábias lições do que devia ter sido feito. Tudo na velha ladainha da fatalidade, do primado da teoria sobre a ação. Tudo no velho exemplo de “casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”. Mas há algo publicado nas redes sociais que é cruel mas não deixa de ser verdade: “Os que morreram não voltam a ter férias!”