Erasmus+. Ir para fora não é só para  os crescidos

Erasmus+. Ir para fora não é só para os crescidos


Novas tecnologias e competências digitais, combate ao abandono escolar precoce, criatividade e cultura são os temas mais comuns dos projetos financiados pelo programa Erasmus+ Ensino Escolar. Desde 2014 já participaram em atividades no estrangeiro mais de 2000 estudantes e professores. Oferta começa no pré-escolar


Erasmus é sinónimo de estudantes universitários, um período de estudo no estrangeiro, copos e até romance. Mas desde 1995 que há um programa destinado aos estudantes mais novos, com atividades a partir do pré-escolar. Cada vez há mais projetos financiados pela Comissão Europeia nas escolas nacionais e o passa-palavra tem feito aumentar o número de participantes. Desde 2007, revelou ao i a Agência Nacional Erasmus+ Educação e Formação, o programa já envolveu 34 mil professores, funcionários e alunos, o que inclui jovens no ensino regular, mas também os que frequentam o ensino noturno. Itália, Turquia, Espanha, Polónia e Roménia são os principais destinos – entre 2014, estes países representaram 41% das escolas parceiras dos projetos portugueses. Novas tecnologias, combate ao abandono escolar e cultura são alguns dos temas mais comuns entre os projetos financiados por Bruxelas.

Da origem até hoje

O Erasmus destinado aos estudantes universitários começou em 1987, comemora este ano três décadas e nunca mudou de nome. Em 1995, quando a oferta de internacionalização foi alargada a outros níveis de ensino, surgiram novas designações que acabaram por não ficar tão conhecidas.

Foi nesta altura que apareceu o Programa Sócrates, que passou a dividir-se em três vertentes: o Comenius, para a população do ensino escolar; o Erasmus, que se manteve dos estudantes universitários; e o programa Leonardo da Vinci, para o ensino profissional. Em 2014, Bruxelas reforçou o investimento no programa e lançou o “Erasmus+”, um programa que passou a abranger todas as iniciativas. Além dos intercâmbios de estudantes universitários, hoje podem candidatar-se a projetos e parcerias no estrangeiro associações sem fins lucrativos, funcionários, professores e alunos de escolas de ensino básico e secundário.

Quem apanhou os primeiros anos do projeto para alunos mais jovens conta que não foi fácil ganhar coragem para organizar viagens para o estrangeiro. Fernanda Machado, professora de Língua Portuguesa em Resende, lembra que, quando levou os primeiros alunos a Chipre, o projeto já existia na escola há três anos, mas ainda ninguém se tinha aventurado a levar estudantes para fora. “Os professores e colegas, mesmo dos outros países, achavam que isso de trazer alunos comigo seria um perigo, mas correu sempre tudo muito bem”, explica a professora, na altura na Escola Preparatória de Resende, que hoje faz parte de um mega-agrupamento.

Depois da primeira viagem a Chipre seguiu-se, em 2002, outra com rumo à Bulgária. “Tivemos a oportunidade de levar alunos connosco, os meus colegas chamaram-me maluca, mas eu sabia que aquilo era importante para eles. Para alguns era a primeira vez que andavam de avião. Vinham de lá sempre muito felizes, o facto de ouvirem tantas línguas, de tentarem comunicar, o contacto com alunos de outras escolas, o brincar com miúdos de outras culturas, fazia com que a experiência fosse muito feliz.”

Hoje há 80 escolas que, anualmente, coordenam projetos financiados no setor do Ensino Escolar pelo Erasmus+, de programas de mobilidade a parcerias estratégicas com escolas ou associações no estrangeiro.

É o caso do Agrupamento de Escolas de Albufeira Poente, que este ano tem três projetos ativos. Num deles são mesmo coordenadores a nível internacional: trata-se do projeto “Mini Entrepreneurs at School” (Pequenos empreendedores na escola), que une professores e alunos de Portugal e de outros cinco países europeus – Itália, Roménia, Estónia, Turquia e Alemanha.

A ideia é serem uma espécie de incubadora de empresas do terceiro setor, apoiando os alunos a desenvolver projetos e a adquirir novas ferramentas de trabalho e de partilha interpessoal. A preparação inclui visitas a empresas do concelho e sessões de brainstorming, sempre com uma preocupação de integração de alunos com necessidades especiais.

Além deste projeto, existem algumas iniciativas que implicam viagens ao estrangeiro, explicou ao i o diretor do Agrupamento de Escolas de Albufeira Poente. “O impacto é para toda a escola. Há muitos trabalhos a serem feitos e todos eles participam, desde o pré-escolar até ao secundário. Há um envolvimento do agrupamento inteiro”, diz Aurélio Pires Nascimento.

Dionísio Ferreira, um dos coordenadores dos projetos Erasmus+ no Agrupamento de Escolas de Resende, já perdeu a conta ao número de escolas em países europeus que visitou e com as quais desenvolveram parcerias.

Para um mega-agrupamento num meio maioritariamente rural, este tipo de iniciativas tem ainda mais impacto, admite. “O impacto é de caráter cultural: prende-se com o confronto de outras realidades pedagógicas, sociais, de ordem linguística. É uma abertura de horizontes. No nosso agrupamento, já umas várias dezenas de alunos tiveram a oportunidade de visitar outros países e isso gera um incentivo e uma consciencialização da importância da aquisição de competências como o inglês, que não teria o mesmo efeito se não passassem por esta experiência”, diz o professor.

William Dias, estudante do 11.o ano em Resende, tinha 14 anos quando participou num meeting na cidade de Hagenow, na Alemanha. “Foi uma semana fantástica, diverti-me imenso e a melhor experiência que tive foi a interação com pessoas de diversas culturas, oriundas de países diferentes que ali se juntaram”, lembra.

Para William, o Erasmus+ acaba por ser muito importante para o desenvolvimento de todos os que participam no programa, sobretudo pelo incentivo a falarem outra língua.

Rafael Sousa, de 17 anos, também cresceu no interior de Portugal, no concelho de Resende, e aos 13 anos teve a oportunidade de viajar com o Erasmus+. “Fui a Guadalupe (Caraíbas). Para mim este programa é muito importante, uma vez que dessa forma os meninos podem sentir-se um pouco mais livres e saem um pouco da rotina diária deles”.

Aos 16 anos, Jéssica Loureiro também não esquece a viagem que fez à Alemanha aos 13 anos. “Apresentámos os teatros que treinámos na escola, vimos os das outras escolas. Nem todos têm capacidade económica de viajar e isto é tudo por conta da escola – podemos, sem gastar dinheiro, aumentar a nossa cultura e desenvolver a língua inglesa”.

Em 2014, a Comissão Europeia decidiu que nos próximos sete anos haverá um investimento de 14,7 mil milhões de euros no programa Erasmus+ em todos os níveis de ensino, o que representou um aumento de 40% face aos sete anos anteriores.

Segundo dados fornecidos ao i, há 300 instituições a beneficiar do programa em todas as vertentes, desde escolas ao ensino universitário. Só no ensino escolar básico e secundário registaram-se, desde 2014, mais de 2000 experiências de mobilidade. A maioria das escolas que participam no programa encontram-se no Norte do país (36%), seguindo-se A região Centro e só depois escolas de Lisboa.