Blaya. Buraka, aulas de kuduro e um disco “Superfresh”


Em 2008, quando Blaya foi chamada para o casting de bailarinas dos Buraka Som Sistema, nem sequer sabia dançar kuduro. “Fazia aqueles movimentos que todos os tugas fazem, completamente ao contrário do movimento certo”, ri-se, enquanto mexe os braços no escritório da Enchufada, a editora dos Buraka, em Santos, Lisboa. Debaixo da mesa está o…


Em 2008, quando Blaya foi chamada para o casting de bailarinas dos Buraka Som Sistema, nem sequer sabia dançar kuduro. “Fazia aqueles movimentos que todos os tugas fazem, completamente ao contrário do movimento certo”, ri-se, enquanto mexe os braços no escritório da Enchufada, a editora dos Buraka, em Santos, Lisboa. Debaixo da mesa está o seu cão, Abraão, um pitbull com quase cinco anos, que vai interrompendo a entrevista de vez em quando com o barulho de beber água. “Depois fui vendo vídeos [de kuduro] no YouTube e como apanho facilmente as coisas, consegui apanhar e dar-lhe o meu lado.”

Conductor, um dos produtores da banda, já conhecia Blaya “da altura em que rappava” e telefonou-lhe a perguntar se estava interessada em fazer o casting. “Mandou-me as músicas, disse-me para coreografar, fiz o casting e entrei”, recorda.

A partir daí foi tudo quase tão rápido como o sucesso da banda portuguesa de kuduro progressivo. “Uma semana depois já estava em Santa Maria da Feira para dançar num concerto. Lembro-me de estar no backstage a aprender com a Pongolove [que colabora na canção ‘Kalemba (Wegue Wegue)’] porque ela sabia”, conta. “Fui para o palco e inventei. Não percebia nada do que estava a fazer, estava para ali a mexer-me… Sempre foi tudo muito improviso.”

DAMA DO MIRC Na verdade, Blaya chama-se Karla Rodrigues, mas pouca gente a trata pelo nome próprio. “Quer dizer, ia ser estranho se a minha mãe me tratasse por Blaya”, ri-se. A alcunha veio dos tempos do mIRC (o chat mais popular do final dos anos 90), quando usava o nome “Dama”. “Tinha 15 anos, ia muitas vezes ao Algarve e lá chamavam-me Blaya em vez de Dama. Não sei de onde é que isso saiu, mas depois isso bazou [o mIRC] e eu fiquei com o nome.”

Blaya nasceu em Fortaleza, no Brasil, mas mudou-se com os pais para Portugal com dois meses. “Morei em Mora, em Moura, em Quarteira, até que parámos em Ferreira do Alentejo”, conta. Começou a escrever letras e a rappar aos 14 anos, até que parou de cantar para dançar. “No Alentejo o rap não tinha muita saída”, explica.

Chegou a fazer parte de um grupo de hip-hop feminino com Dama Bete, as Blacksystem, mas foi nos Buraka Som Sistema que se tornou conhecida, primeiro como a bailarina dos calções curtinhos e depois como MC.

LEGGINGS DE CANÁBIS Ter uma atitude provocadora e roupas que chamem a atenção faz parte do espectáculo, diz-nos. “Tento sempre ter roupas fluorescentes ou mais curtas. É que são uma data de homens em palco, então tem de haver uma coisa mais feminina”, conta. “Gosto de ter estas roupas para o concerto, e depois não as visto em mais lado nenhum.”

Nesse dia recebeu umas leggings de “uma marca australiana que não há cá com umas folhas de canábis”. A foto das leggings está no Instagram e no Facebook, tal como outras onde aparece ao lado de Abraão, de biquíni numa piscina insuflável que comprou para o terraço de casa, em digressão, ou a mostrar as tatuagens.

TATUAGENS Blaya já perdeu a conta às tatuagens que tem espalhadas pelo corpo. “Tenho o meu cão, os meus avós, coisas da minha família, de Buraka e depois tenho umas mais visuais, como uma pulseira e um colar”, enumera. Na barriga tem tatuada uma frase de James Brown “The only thing that can solve most of our problems is dancing”, e é de facto a dança que lhe ocupa grande parte do tempo.

Há dois anos que dá aulas de kuduro na Jazzy Dance Studios, em Lisboa, todas as segundas-feiras – quando não está em digressão. “Um amigo dava lá aulas de dancehall, mas foi para a Suécia e tinha de arranjar alguém para o substituir. Sugeri dar aulas de kuduro e começaram a aparecer pessoas.”

Com as aulas e os concertos de Buraka tem agora também de conciliar a apresentação de “Superfresh”, o seu primeiro EP a solo, lançado esta semana e disponível para download gratuito em optimusdiscos.pt. O projecto não tem nada a ver com kuduro e é uma mistura de electrónica, R&B, funk e rap, que Blaya há muito tempo planeava, mas não tinha tempo para concretizar.

BEF “Quando sonhavas com a Blaya num biquíni da Armani/ Eu ‘tava toda nua numa praia em Miami…” É assim que começa “Superfresh”, canção que dá nome ao álbum, escrita pelo rapper Regula, amigo de Blaya. “Pedi-lhe para ele escrever uma música sobre mim, porque havia aí muita gente a falar sobre o meu rabo nas músicas”, ri-se.

A letra diz isso mesmo: “Rappers elogiam e falam do ass/Mas acredita, nenhum deles toca no meu bef.” E mais. “Fala de coisas que se passaram mesmo comigo, como eu estar em Miami, ir a um clube de strip e ter amigas malucas. Isso é tudo verdade.”

Noutro registo mais romântico, “Eu Quero Mais”, foi escrita pela própria. “Escrevi muito rápido, saiu-me, fui imaginando o que é que uma rapariga pode fazer e faz quando está com um rapaz”, conta.

BI O ano passado assumiu a sua bissexualidade numa entrevista à revista LGBT “Qüir”, o que lhe valeu um Prémio Arco- Íris da ILGA por ser “uma referência importante junto de jovens que precisam de modelos positivos para construírem a sua identidade”.

Não foi uma cena que tive de assumir”, diz. “Já é uma cena que sou há muito tempo e não houve um momento em que tive de dizer ‘olha sou bi’. Mas perguntaram-me se havia algum tipo de problema com o público por ser bi, eu disse que não e fizeram logo uma grande manchete com isso.”