Artur Pastor. Gentes e costumes de um Portugal de outrora


Em 1942 realiza o primeiro trabalho fotográfico, para acompanhar a tese de final de curso. Em Évora encerra assim a formação de Regente Agrícola, ou pelo menos a académica, já que o estudo no terreno, agora de Rolleiflex em punho, está apenas a começar, ensaiando os primeiros passos ainda no Alto Alentejo. Mais de 70…


Em 1942 realiza o primeiro trabalho fotográfico, para acompanhar a tese de final de curso. Em Évora encerra assim a formação de Regente Agrícola, ou pelo menos a académica, já que o estudo no terreno, agora de Rolleiflex em punho, está apenas a começar, ensaiando os primeiros passos ainda no Alto Alentejo. Mais de 70 anos depois, retomamos os caminhos de Portugal e de Artur Pastor, o fotógrafo nascido em Alter do Chão, em 1922, que registou motivos nacionais de norte a sul do país, numa empreitada etnográfica que abandona agora o território da sombra.

“A ideia é revisitar certas paisagens naturais e algumas urbanas. Aquele Portugal do Artur Pastor é um pouco um Portugal de outrora. O que sentimos nas fotos dele é que nos podemos rever numa certa identidade e cultura portuguesas, o que é ser português, se é que essa questão ainda se pode pôr ou não. As tradições, as raízes, estão nas suas fotos. Do Douro ao Algarve, há um retrato notável do país”, destaca Fernando Carrilho, que realiza o documentário “A Paisagem de Artur Pastor”.

A obra, de 55 minutos, é exibida hoje no Cinema São Jorge às 21h30. Concebida para acompanhar a exposição dedicada ao trabalho do fotógrafo, poderá voltar a ser vista no Arquivo Fotográfico de Lisboa, um dos pontos por onde passa esta mostra, patente ao público a partir de dia 5 de Junho. Além das instalações da Rua da Palma, as fotografias de Artur Pastor, que se fixou em Lisboa em 1953, fazem escala no Pavilhão Preto do Museu da Cidade e ainda na loja de fotografia Colorfoto, em Alvalade.

“O documentário aproveita toda a pesquisa feita em torno da sua obra. É uma maneira de deixar um registo e um património do trabalho de investigação que foi feito pelo arquivo municipal”, descreve Fernando, a propósito de um espólio adquirido pelo arquivo em 2001, dois anos depois da morte do autor, caído no esquecimento a partir da segunda metade dos anos 70. O arquivo guarda agora séries sobre a Nazaré (1950), o Algarve (1960), Lisboa, Évora, a recolha do património construído de todo o país (1980) e a Expo-98.

“O meu espanto é o facto de ser praticamente desconhecido do grande público. É escassamente referenciado na história da fotografia portuguesa, mas foi um fotógrafo extremamente importante nos anos 40, 50 e 60. Premiado internacionalmente, com fotografias nas mais prestigiadas revistas internacionais, praticamente eclipsou-se após o 25 de Abril, por alguns motivos. Um deles é o facto de a sua obra ter estado fechada ao público. Só agora, em 2014, será exibido parte deste vastíssimo acervo.”

Um acervo datado, que sedimenta esta viagem a um Portugal desaparecido, já bem distinto da fase colorida de Pastor, iniciada na década de 80, naquele que constitui “um período menos interessante”, comparando com a riqueza e a heterogeneidade do material recolhido pelo homem que pertenceu aos quadros do Estado durante cerca de 30 anos como engenheiro técnico agrário, que assinou milhares de fotografias ao serviço de diversos organismos oficiais e grandes empresas, sobretudo no campo da agricultura e do turismo, e que cobriu todas as regiões continentais e insulares.

“Motivos do Sul”, com o tema Alentejo, Algarve e serra da Arrábida, no Círculo Cultural do Algarve, Faro, foi a primeira das suas 14 exposições individuais, realizada em Janeiro de 1946, na qual partilhou 300 trabalhos. Em 1986, o Palácio Galveias recebia “Apontamentos de Lisboa”. Após a sua morte, mostras como “Artur Pastor, O Domador da Rolleiflex”, na galeria Colorfoto, no Porto, em 2006, ou “A Nazaré de Artur Pastor”, na Biblioteca Municipal da Nazaré, em 2008, davam seguimento à evocação de um nome que deixou a sua marca não só na película 6×6 mas também no moderno formato de 35 mm, ajudado pela sua Nikon. Fora de portas, nos anos 40, desfilou por salões de fotografia entre Madrid e São Paulo.

“Fotografou o país de ponta a ponta, os costumes ligados à agricultura, à pesca. A par desse trabalho de funcionário público, com o registo das actividades agrícolas, desenvolvia a fotografia artística, com um cunho mais pessoal. Embora todas as fotos sejam muito cuidadas, as melhores são a preto-e-branco.”