Foi vice-presidente de Luís Filipe Vieira [LFV] durante vários anos mas em 2016 já não fez parte das listas. Foi afastado?
Fui eu que voluntariamente saí.
O que se passou para se separarem?
Em 2009 fui eleito para vice-presidente do Benfica e de imediato assumi as funções como administrador da SAD, que desempenhei até 2012. Em 2012, e porque tinha assumido algumas discordâncias, saí de administrador da SAD e mantive-me como vice-presidente do Benfica, cargo que exerci até 2016 – com algumas manifestações públicas de discordância, nomeadamente em três grandes momentos: a questão dos direitos televisivos, em que acabei por obter vencimento; a questão do projeto europeu, que continua adiado; e a ideia de que em determinado momento a estrutura desportiva não correspondia aos desígnios, aos anseios dos sócios e simpatizantes do Benfica. Isso levou-me a afastar-me da direção de LFV, rutura essa assumida muito antes desse afastamento, na assembleia-geral de junho de 2016, em que eu disse que não havia nada em cima da mesa, em que disse que me ia embora. O resto são pequenas histórias…
Não houve desentendimentos a nível pessoal?
Não tenho por princípio, quando estou em instituições, assumir ruturas por questões pessoais. Acho que há identificação com projetos, ideias, caminhos. Neste caso, houve uma fase em que havia coincidência de projetos e a partir de certo momento percebi que essa coincidência já não existia. Entendi que, depois da recuperação económica, era chegado o momento do grande projeto desportivo para o Benfica – com aposta nalgumas modalidades para ser campeão europeu e noutras para ser hegemónico em termos nacionais, e depois na construção de uma equipa que pudesse levar o Benfica ao título de campeão europeu. Ou pelo menos candidato a esse título.
E como se fazia isso?
Isso fazia-se, e faz-se, com um caminho que concilie a formação com aquisição de jogadores de forma pontual para colmatar as falhas da formação.
Quase uma mistura do que fez Rui Vitória, que valorizou jogadores da formação, com o que fez Jorge Jesus, que apostou mais na contratação de ‘jogadores feitos’?
Diria que é uma junção de duas formas de estar no futebol que tem garantido títulos e presenças significativas de alguns clubes no panorama europeu. Com formação só é impossível ganhar, e o futebol português não tem dimensão para se investir centenas de milhões, pelo menos mantendo-se o Benfica dos sócios – haverá outros modelos, mas o meu é de um Benfica dos sócios. Com uma junção dessas duas realidades, formação e aquisição muito cirúrgica, o Benfica tem todos os anos a obrigação de lutar para ser campeão europeu. Pode não o conseguir um ano, dois anos, três anos, mas tem de conseguir ao fim de um determinado tempo. Com a sua quantidade de massa adepta que é uma coisa única, o Benfica tem obrigatoriamente de ser candidato a um desses títulos.
Mas a Liga dos Campeões é sempre dominada por um lote restrito de clubes. São sempre os mesmos.
O Liverpool estava há trinta anos sem ganhar.
Mas faz parte dos colossos, vem do campeonato mais rico e competitivo do mundo. E tem um orçamento que não tem nada a ver com a nossa realidade.
O primeiro passo para uma conquista desse tipo é começar a acreditar. É difícil? Claro que é. É impossível? Não. Nos anos 60 seria muito mais difícil o Benfica ser campeão europeu.
Acha?
Acho. O Benfica era desconhecido na Europa, a Europa do futebol não passava pelo Benfica. O Benfica hoje é um clube muito respeitado, em termos europeus, pelo seu passado. Nessa grandeza, nessa dimensão, e tendo um projeto específico, que não faça do Benfica um entreposto de jogadores, que não faça do Benfica um clube que compra jogadores para emprestar ou para dar ganhar comissões a terceiros, mas uma entidade virada para o êxito desportivo, acho que isso é possível. O Benfica é um clube dos sócios para ganhar no campo, não é um clube pertencente a fundos ou a alguém muito rico, e cujo único objetivo é comprar e vender jogadores para dar a ganhar a quem tem a maioria do capital social. Essencialmente não é um projeto financeiro, não é um projeto meramente especulativo, é um projeto de vitórias, feito de amor, de paixão e de dedicação de muitos sócios. Ver determinados adeptos, por vezes com rendimentos muito pequenos que fazem sacrifícios para acompanhar a equipa nas deslocações, a serem maltratados, a serem diabolizados, a serem afastados é talvez a coisa que mais me custa. Como presidente do Benfica não farei distinções entre adeptos, sejam do camarote presidencial, dos camarotes de empresa, ou do topo norte ou topo sul. Não me peçam para ser conivente com processos de legalização de grupos de adeptos se esses grupos de adeptos não quiserem ser legalizados, até porque entendo que a legislação que obriga a essa legalização é inconstitucional.
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