Dia de São João: na Foz sim, no Bulhão não!


Ex.ma Senhora Arlete Soeiro 3.a subsecretária da secretária-adjunta Programa de Auxílio aos Povos Indolentes e Falidos Gabinete do secretário-geral Ban Ky-moon Sede da ONU, Nova Iorque, EUA Dr.a Arlete, Socorro-me de si no intuito de superar esta sufocação: tem de me ajudar a obter o “sim” do secretário-geral! Não, não o pedi em casamento. Trata-se,…


Ex.ma Senhora Arlete Soeiro

3.a subsecretária da secretária-adjunta

Programa de Auxílio aos Povos Indolentes e Falidos

Gabinete do secretário-geral Ban Ky-moon

Sede da ONU, Nova Iorque, EUA

Dr.a Arlete,

Socorro-me de si no intuito de superar esta sufocação: tem de me ajudar a obter o “sim” do secretário-geral! Não, não o pedi em casamento. Trata-se, isso sim, de obter uma resposta afirmativa para vir festejar o S. João connosco, aqui no Porto. O Sr. Ban Ky-moon bem que o merece!

Fizemos recentemente un tour d”horizon e todos – isto é, todos os que realmente contam aqui na Foz – concordámos: o Ban tem que vir. A prima Julinha foi veemente ao concluir em voz alta: querido Ky, quero-o cá! Sem dúvida todos o queremos cá. Ele merece. Basta fazer un tour d”horizon e percebe-se porque o merece: israelitas e palestinianos têm vindo a abraçar-se em público; as crianças sudanesas comem atum à discrição; na Índia deixou de haver violações todos os dias; o mundo árabe tem dias em que é democrático; o sistema financeiro internacional é só músculo; os mares ainda não subiram 4 metros; enfim, o Brasil tem a Copa que quer e Portugal a dívida que pode!

Não são todas estas razões suficientes para trazer Mr. Moon ao S. João e levá-lo à má fila pelos Aliados abaixo só para contar quantas marteladas leva na cabeça e em quanto tempo bate o recorde do campeão em título, o Luís Filipe Menezes? Brinco, faço humor, digo, ou melhor, escrevo, coisas sem nexo, tal é o nervosismo em que me põe o silêncio do Ban.

Não, nada há a temer. Nós aqui na Foz festejamos o S. João como deve ser. Nada de martelinhos de plástico! Os poucos a uso são os das criancinhas, mas sem aqueles horríveis apitos. De qualquer forma, só conseguem bater com eles nos nossos joelhos e, claro, na cabeça umas das outras, o que não incomoda ninguém. Aos adultos distribuímos alhos-porros. Mas só entre a meia-noite e a uma da madrugada. É o suficiente para afugentar o mau-olhado e para criar borbulhas a todos e eczema a várias primas.

Na Foz falamos o melhor português de Coimbra, onde quase todos cursámos Direito. Não haverá nada daqueles impropérios, género “bou bêlos bem amassados, c…!”, ou “banham bêr! o bimbo tá bibo, c…!”. Nada disso, na Foz nem marteladas nem blasfémias nem empurrões nem mau hálito – aqui não há sangria nem couratos, é só bolinhos e vinho do Porto.

Também não comemos francesinhas – um costume com laivos pedófilos, não acha? Comemos as deliciosas tchekas da prima Constantina. Receita que é a única memória autorizada da sua aventura com o adido britânico em Praga. Mr. Bronkwsing fez serviço no Porto nos anos 50 e a prima, iludida, fugiu com ele. Ao que parece terá dito: “Porto por Porto, antes Praga!” Mas Praga revelou–se uma praga e a prima regressou ao Porto sem oficial inglês, com a roupinha que tinha vestida e a tal receita das tchekas que em breve se tornaram famosas nas noites de brídege.

A Ana Lúcia, uma prima muito muito afastada que se tornou maoista nos anos 70, fartou-se de fazer troça dizendo que seria mais moderno chamar KGB às tartes da prima Constantina. Mas ninguém trinca uma tcheka a pensar na polícia política de Lenine, nem há razão nenhuma para que o seu molho de framboesa nos lembre o terror vermelho.

Dr.a Arlete: imprimimos um belíssimo cartaz: “Mr. Moon arrives by moon to stay all the night at St. John”s Day.” Não acha uma maravilha este trocadilho tão intensamente britânico? É claro, o primo João Mctoskw é de ascendência escocesa, nunca provou Porto, só bebe whisky numas almoçadeiras imensas e já esqueceu o pouco inglês que a mamã lhe ensinou – comentou: “Que confusão é essa de uma lua à tarde e de uma noite de dia?” Mas, juro-lhe, foi o único que não percebeu!

Inclino-me, espero, suspiro e retiro-me,

Ricardo Barata de Leão

ricardobarataleao@gmail.com