Jotas. Jovens mulheres lideram na política

Jotas. Jovens mulheres lideram na política


Rita Matias (CH),  Sofia Pereira (PS) e Catarina Marinho (CDS). O que têm em comum três  mulheres na política? Do aborto à imigração, saiba o que pensam as jovens promessas das ‘jotas’.


‘Há jovens a ser empurrados para transições [de género]’
Rita Matias
Deputada e Coordenadora da Juventude do CHEGA

Enquanto mulher na política sente que tem o mesmo espaço que colegas homens ou ainda há algumas barreiras a ultrapassar?             
Acredito que existem desafios que as mulheres enfrentam. Por exemplo, a conciliação da maternidade com uma carreira profissional ativa, mas não atribuo a isso uma responsabilidade necessariamente patriarcal. Não abraço uma lógica de discurso de vitimização. Reconheço que ser mulher na política é desafiante mas, nos dias de hoje, ser mulher de direita conservadora ainda é mais.

Mas na maioria dos partidos, incluindo o Chega, ainda há mais deputados homens do que mulheres…
Reconheço que há uma presença feminina bastante ativa no Chega, sem nunca nos termos preocupados em ter qualquer tipo de política positiva para a atrair. Não gosto de abraçar um discurso de quotas de género. Acredito que como o ambiente foi masculino durante muito tempo, há uma tendência quase hereditária de o manter masculino. Ao mesmo tempo, esta década tem sido marcada por rostos femininos. Temos o caso da Meloni, da Katalin Novák, que foi a primeira Presidente da República na Hungria, e vários casos em Espanha de lideranças ao nível regional, ligadas ao VOX.

Que alternativas propõe às quotas de género?
Há coisas bastante simples, como uma creche no Parlamento, que já existe, mas com mais proximidade física e com a possibilidade de ter espaços de amamentação, por exemplo.

Considera que há papéis para homens e outros para mulheres?
Não, de todo. Acredito que, por uma questão fisiológica, de recuperação de um parto e da dependência que o bebé tem de uma mãe, é mais difícil para uma mulher, num dado período da vida, estar tão ativa e presente numa carreira profissional. Depois há características que normalmente atribuímos aos homens, como a força e a resiliência. Não quer dizer que as mulheres não as tenham, mas o assédio e a violência verbal são particularmente hostis para as mulheres.

A Rita já disse várias vezes que se considera antifeminista. Porquê? Reconheço que o movimento feminista desde a sua origem não foi feliz na forma como fez as suas lutas, a partir do momento em que decidiu antagonizar homens versus mulheres e abraçar uma lógica marxista de dividir a sociedade entre oprimidos e opressores.

Mas reconhece que muitos dos direitos das mulheres foram conquistados graças a esse movimento…
Claro que é ótimo uma mulher votar e uma mulher poder ser eleita, mas os relógios estragados acertam pelo menos duas vezes ao dia. Não tenho qualquer desejo de que as mulheres não possam votar, mas não consigo abraçar aquilo que foram os filhos degenerados do feminismo e esta corrente que banalizou o conceito de género. De repente, qualquer pessoa se pode identificar como mulher e invadir a privacidade e algumas das conquistas das mulheres.

Preocupa-a que a comunidade LGBTQIA+ esteja a ganhar mais expressão?
Acho que a homossexualidade está cada vez mais em extinção em Portugal e no Ocidente. É uma questão de tempo até termos mais diversidade para além da homossexualidade. O que me preocupa é que cada vez mais crianças ou jovens que não têm uma atração sexual heteronormativa sejam empurrados para processos de transição social ou física, como se fossem pessoas transsexuais ou transgénero, que muitas vezes não são. Às vezes só por um desejo de integração, um último socorro ou um último pedido de atenção.

Há dados que comprovem que existe esse ‘contágio social’?
Infelizmente dados portugueses não temos, porque as nossas instituições ou não se debruçaram ou não se querem debruçar sobre a matéria. Mas reúno-me cada vez mais com psiquiatras em Portugal, à porta fechada, e percebo que esse fenómeno de contágio está a acontecer.

Isso é uma das ameaças da cultura woke?
A cultura woke está-se a tornar uma ameaça cada vez maior. Começou a adotar um léxico de diversidade, equidade e igualdade que não tem feito outra coisa que não discriminar e trazer ainda mais injustiça. A partir do momento em que começamos a engavetar a sociedade e a criar nichos de minorias, estamos a criar uma hierarquia profundamente perversa. Eu professo uma fé cristã, que é cada vez mais minoria na sociedade, e não quero que me dêem mais tempo de antena por isso. Quando assumimos que uma pessoa racializada é, à partida, desfavorecida ou vítima de um ‘racismo sistémico estrutural’, estamos a criar narrativas que podem não corresponder à verdade.

Acha que não existe racismo em Portugal?
O racismo sempre existiu e sempre existirá. Sou interpelada por pessoas de esquerda cada vez que tomo posições contra a imigração, porque tenho uma avó que veio de uma antiga colónia e, por isso, alegam que não sou portuguesa assim tão pura.

Quando olha para as imagens da rusga no Martim Moniz consegue perceber as alegações de racismo?
Não. O que eu sei é que os portugueses estão insatisfeitos com o clima de insegurança. Dois terços dos portugueses acham que os imigrantes contribuem para o aumento da criminalidade, de acordo com um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Qualquer pessoa que circule por determinadas zonas, como a Rua do Benformoso, percebe que há mais imigrantes do que nunca. Uma mulher, cada vez menos, sai à noite sozinha, ou atravessa determinados bairros sozinha, com receio de ser abordada, assediada e violada.

Mas os dados referentes à criminalidade não apontam nesse sentido…
Basta olhar para o que está a passar agora no Reino Unido e o que está a acontecer na Europa. Todos, à exceção do Chega, têm medo de falar do tema da imigração descontrolada, mas ainda que não haja dados atualizados, há consequências e relatos a nível da segurança.

‘Sou feminista, progressista e de esquerda’
Sofia Pereira
Líder da Juventude Socialista

Qual é a maior dificuldade ou obstáculo de ser jovem, mulher e líder na política?          
Ser mulher na política significa ter de provar constantemente o nosso valor. O escrutínio é maior, os erros não são permitidos e qualquer falha é rapidamente usada para nos desqualificar. Ainda não se olha para lideranças femininas com a mesma naturalidade do que para lideranças masculinas –somos muitas vezes vistas como um ‘corpo estranho’ nos círculos de tomada de decisão e liderança.

As mulheres têm o mesmo espaço e poder dentro do PS ou ainda existem barreiras internas?
O PS tem dado passos importantes, mas se admitimos que há um problema estrutural na aceitação de lideranças femininas na sociedade, é impossível que os partidos políticos sejam imunes a isso.

As quotas de género têm sido uma bandeira do PS, mas não põem em causa o mérito individual?
O conceito de ‘mérito individual’ tem sido amplamente romantizado, mas é preciso questioná-lo. É justo avaliar mérito sem considerar o ponto de partida de cada pessoa, as condições socioeconómicas ou as desigualdades históricas? É justo avaliar o mérito de uma mulher num espaço dominado por homens da mesma forma que avaliamos um homem? As quotas são, infelizmente, ainda necessárias. Não porque as mulheres não tenham mérito, mas porque a sociedade e as estruturas de poder ainda não estão equilibradas para garantir uma igualdade de oportunidades real.

Está agora em cima da mesa a discussão sobre o alargamento do prazo para a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). Qual é a sua posição sobre o tema?
As 10 semanas previstas na nossa lei são das mais restritivas da União Europeia. É hora de reconhecer que há um problema – às 10 semanas muitas mulheres nem têm sintomas claros por variadíssimos motivos – e alargar o período de realização da IVG como na Alemanha, França, Bélgica ou Espanha.

Outro dos temas em discussão tem sido a imigração. Como olha para os argumentos de que há uma ‘perceção de insegurança’ nas ruas por causa dos imigrantes?
A narrativa divisiva de medo e promotora de ódio que a extrema-direita e, já agora, o Governo está a permitir, tem dado frutos. Isto é inaceitável e sintoma de algo pior. Em vez de promover segurança, gera discriminação e desconfiança.

É essa a sua visão acerca da rusga que aconteceu no Martim Moniz?
A operação no Martim Moniz mostrou o pior de uma abordagem discriminatória. De 100 pessoas abordadas, nenhuma estava em situação irregular e somente duas pessoas foram detidas. Isto levanta questões sérias sobre os critérios usados. Foi indigno e envergonha-me.

E como responde às acusações de que o ativismo progressista e a cultura woke priorizam questões simbólicas, como a linguagem inclusiva, em vez de problemas reais?
A palavra ‘woke’ tem sido distorcida e usada como arma política. Originalmente, ser ‘woke’ significava estar consciente das injustiças sociais e lutar contra elas, como o racismo, o sexismo ou a discriminação. Mas a direita e a extrema-direita transformaram este conceito numa caricatura, como se lutar por igualdade fosse algo errado. Sobre isto tenho a dizer que: sou feminista, progressista e de esquerda. Luto pela igualdade de género, pela liberdade de todas as pessoas e pelo direito de cada um viver sem medo de ser silenciado.

Precisamente sobre liberdades individuais… Defende a legalização total de drogas leves, como a canábis, para uso recreativo?
Defendo a legalização, sim. É uma questão de saúde pública, de segurança, mas também é uma questão de liberdade individual.

Mas concorda que existem problemas em relação ao tráfico e consumo de drogas…
Sim, ainda há lacunas no apoio aos dependentes. É necessário reforçar a rede de apoio psicológico e social, garantindo que estas pessoas têm acesso a tratamento digno e eficaz. A prevenção também deve ser uma prioridade.

‘É preciso mais polícia na rua’
Catarina Marinho
Candidata à liderança da Juventude Popular

É a primeira candidata mulher à Juventude Popular em 50 anos. Ainda existem obstáculos internos em relação a lideranças femininas?
Estou há 13 anos na estrutura e nunca vi obstáculos. O que acontecia era haver uma pessoa com um perfil de liderança melhor que, por acaso, era um homem. É um ótimo sinal haver cada vez mulheres em cargos de liderança, mas quero deixar claro que acho que ser mulher por si só não chega. Uma mulher não é melhor  do que o homem só por existir. O mérito deve ser sempre o único critério de avaliação, independente do género.

Considera-se feminista?
Sim, no sentido de que o homem e a mulher têm direitos iguais. Mas tenho perfeita noção de que o homem e a mulher não são iguais e o seu papel na sociedade não é o mesmo.

Como por exemplo?
Eu posso ser mãe, mas o homem não pode, portanto, o meu papel na sociedade vai ser diferente.

Está em discussão o alargamento do prazo para realizar a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). Qual é a sua visão sobre o assunto?
Sou contra o aborto, mas respeito o resultado do referendo que aprovou a legalização. Quanto ao alargamento do prazo para a IVG, acho que esse tema nem deveria estar em cima da mesa. Devíamos estar a discutir como é que educamos os nossos jovens, explicando-lhes os riscos e as consequências de uma IVG, para eles nem sequer chegarem a essa fase.

A relação entre a imigração e a segurança tem sido outro dos temas controversos das últimas semanas.  Deve haver mais policiamento na rua?
Vejo com muita naturalidade a ação policial que aconteceu no Martim Moniz. Dizem que os números não apontam para um aumento da criminalidade, mas a percepção de insegurança da sociedade  também é muito importante. Tenho uma proposta em cima da mesa que é que os polícias deixem de ficar fechados nas esquadras a fazer trabalho administrativo e estejam mais nas ruas, perto das pessoas.

Em relação à descriminalização das drogas, considera que a política deve ser revista?
Sou contra todo o tipo de drogas, mas a proibição em si não é solução, já a tivemos antes e não funcionou. Precisamos é de uma maior fiscalização. Se sabemos que há regiões do país ou de uma cidade que são mais problemáticas, não podemos ter medo de ir lá resolver o problema.