Não tenho memória – era muito novo no Verão Quente – de ter assistido na comunicação social, e não só, a uma falta de isenção tão escandalosa como a que vimos a assistir desde a morte de Odair Moniz, na Cova da Moura. Já li e ouvi coisas verdadeiramente inacreditáveis, que os mais incautos podem tomar como verdade. Em primeiro lugar, onde ‘passaram’ os vídeos e as imagens do momento da morte do cabo-verdiano (mais uma vez sabemos a nacionalidade porque, supostamente, é a ‘vítima’)? Isto é, ninguém tem as imagens mas todos falam delas, e já lá vamos. Em segundo lugar, onde estão as imagens da Polícia a destruir a porta dos familiares de Odair Moniz? Alguém as viu?
No tempo das redes sociais, se existissem essas imagens não teriam sido amplamente divulgadas? E que imagens conhecemos? As da Polícia a pedir, civilizadamente, que os familiares e amigos de Odair não vão para a rua, devido ao faroeste criado por vândalos. E o que sabemos mais? Sabemos que, além da morte de Odair, um motorista foi atingido por um cocktail molotov e que vai ficar com marcas para o resto da vida e que só por acaso não morreu. Sabemos também que dezenas de pessoas ficaram sem os seus carros, que muito lhes devem ter custado a comprar…
Sabemos também, e isto é que é inacreditável, que no momento em que alguns dos bairros da Grande Lisboa viviam uma espécie de guerra civil, alguém – e aqui, além da PJ, quem mais podia ter sido? – decidiu dar aos jornalistas parte do depoimento dos polícias envolvidos, além de sugerir que as imagens, como os depoimentos, revelavam que não havia nenhuma arma branca nas mãos de Odair quando este foi morto. Quando Lisboa está a ferro e fogo uma Polícia lança gasolina para a fogueira – e o motorista foi vítima dessa cobardia – e todos acham isso normal, já que estamos perante um polícia racista que matou um homem indefeso? Onde está a isenção? Onde está o direito à presunção de inocência? Onde está o famoso segredo de Justiça? Neste caso, por causa da sua violação, podiam ter morrido vários agentes da PSP…
Quanto ao Chega e ao BE, farinha do mesmo saco, o que há a dizer? Que André Ventura e alguns dos seus capatazes disseram o impensável num Estado de direito, de apelar aos polícias para estes ‘atirarem’ a matar? Creio que o partido radical de direita perdeu milhares de votos na última semana, pois qualquer pessoa de bom senso tem que reprovar tal alarvidade. O Chega aproximou-se de Mário Machado a uma velocidade que pensava ser impossível e passou todas as linhas vermelhas. Foi miserável. Quanto ao outro partido radical, o BE, alguma vez apelou à calma, pedindo aos arruaceiros para pararem de destruir equipamentos e de atacarem a Polícia e motoristas de autocarro? Nunca. Já agora, quem é que ficou sem carro? Não foram os moradores desses bairros? Para terminar, Carlos Simões, que dirige a Associação Johnson, que tem como objetivo dar uma vida digna aos jovens dos bairros do Zambujal e da Cova da Moura, disse ao_Nascer do SOL: “Em relação ao contexto da morte – antes, durante e depois – também sabemos muito pouco e há versões contraditórias”. Uma entrevista que recomendo vivamente a muitos jornalistas e comentadores…
Deixem a justiça funcionar, no caso da morte e no incitamento ao ódio do Chega, e depois façam as suas fatwa!