1. A probabilidade de o Orçamento ser viabilizado pelo PS não está assegurada, mas é agora maior do que há oito dias, apesar do Governo rejeitar a exigência do PS quanto ao IRC. Montenegro e Pedro Nuno Santos (PNS) não têm espaço para não se entenderem. Se não houver OE e entrarmos em crise com prováveis eleições haverá danos para o país e os dois líderes. Saber se é Montenegro ou PNS quem mais lucraria com o jogo das comunicações tribunícias, é inútil. Além de boa para a economia, uma aprovação do OE daria à política uma estabilidade que poderia ir até ao fim da legislatura. Seria uma mudança radical dos pressupostos de analistas e políticos. A estória do Governo débil acabaria, entrando-se na negociação pontual. Evidentemente que nunca há garantias de tranquilidade, até porque as grandes crises políticas surgem amiúde do que menos se espera. Viu-se com António Costa e a sua maioria absoluta. Fechado o OE na votação final global, que é a que conta mesmo, o PS pode voltar-se para umas autárquicas que não pode perder. Já o PSD passa a governar com maior serenidade, negociando e agindo no terreno. Estamos, portanto, num cenário com dois ganhadores e que, curiosamente, dá espaço ao Chega para gritar contra um bloco central dos interesses. De resto, Bloco, PCP, Liberais, Livre e PAN farão o mesmo. Noutro plano, um OE viabilizado repõe o presidente Marcelo na sua função mais institucional, depois de ter andado numa azáfama para evitar uma crise que afetaria o seu prestígio e aumentaria o grau de hostilidade do Chega, de certos núcleos da sociedade e do comentariado nacional. A preocupação de Marcelo chegou ao ponto de adiar uma viagem à Polónia e à Estónia, países ameaçados pela guerra da Ucrânia, gerada pela invasão terrorista russa. A desmarcação só pode ser vista como a evidência de que as coisas não estavam fechadas no fim de semana, apesar dos sinais de aproximação. Se houvesse causas menores ou se o acordo estivesse mesmo assegurado, o adiamento seria demagógico e Portugal cairia no ridículo. É por isso essencial que sejamos esclarecidos sobre o papel exercido por Belém.
2. Segundo o Expresso, o almirante Gouveia e Melo está disponível para se manter no cargo, desistir da Presidência, mas exige para isso um maior investimento na Armada, nomeadamente o compromisso de compra de dois submarinos. A notícia, assinada por um dos jornalistas vedetas da casa, coloca Gouveia e Melo numa posição de chantagista, mas nem sequer o cita pessoalmente ou refere uma fonte concreta, o que conduziu a um desmentido curto e grosso da parte do militar e a uma reafirmação do jornal. Informações destas são muitas vezes a forma de atacar o caráter da pessoa e são correntes na política. Porém, quando são desmontadas podem ter um efeito perverso. Gouveia e Melo aproveitou e disse que já sabe o que vai fazer. A pouco mais de um ano das presidenciais, é realmente tempo dele desfazer o tabu que alimenta. Há muito mais de um ano aqui se escreveu que uma das formas de afastar Gouveia e Melo é tentar reconduzi-lo nas suas funções. Agora vieram contar-nos a estória do chocolate que ele quereria para se portar bem. Como se, uma vez sentada em Belém, a criatura não tivesse muito mais força para conseguir submarinos… e muito mais.
3. Por muita razão que tenham, e têm, os bombeiros sapadores (profissionais) nunca deveriam ter subido as escadarias do Parlamento numa manifestação, repetindo o pior do PREC de há 50 anos. Esses homens precisam de ver a sua vida melhorada em termos financeiros. É coisa de que ninguém duvida. Todavia, tudo o que mete o mundo dos bombeiros, dos meios de combate e da proteção civil em Portugal é confuso e opaco, seja nos sapadores como nos ditos voluntários. São tão diversas as situações e as origens que nunca se conseguiu uma organização racional, o que permite coisas pouco claras, envolvendo dinheiro e gente ligada de alguma forma à política. Um dia, alguém tem de ter a coragem de reorganizar e clarificar tudo, enfrentando lóbis estabelecidos. Estamos longe desse momento, mas está na hora de resolver o problema dos salários nos sapadores e de tratar dos problemas que subsistem na PSP, GNR, Guardas Prisionais e militares.
4. Desde os primeiros depoimentos e informações, percebeu-se que a história do triplo homicídio da Penha de França, em Lisboa, estava, e continua a estar, mal contada. O jornalismo de plantão à porta da barbearia não é sistema. Já ouvir testemunhas credíveis, investigar e explicar em concreto quem são e a que grupo socioeconómico pertencem os envolvidos é obrigação dos media. Até porque existem redes sociais, através das quais, fazendo a respetiva triagem, se obtém uma informação completa e credível. Este crime é um paradigma do muito que se passa numa sociedade portuguesa muito mais violenta do que se apregoa. Essa violência escondida não significa, necessariamente, que haja uma perceção de insegurança. São coisas diferentes que convém explicar e não desvalorizar.
5. Um ano depois do ataque terrorista do Hamas, que matou centenas de israelitas e deu origem ao sequestro de muitos outros, a retaliação judaica prossegue e não vai parar. A circunstância de se estar a alargar ao Líbano e a outras geografias apoiadas pelo Irão é a resposta que qualquer governo israelita, de esquerda, direita ou centro, está obrigado a dar para proteger a sua população. Até por ser óbvio que o ataque de 7 de outubro só foi possível por uma falha imperdoável dos serviços de espionagem de Telavive, que servem toda a nação e não um partido em concreto. Israel vive à defesa e sabe que não responder a dobrar é morrer. Além disso, é um estado que defende a vida dos seus cidadãos e os esconde em abrigos quando há ataques. É o contrário do que fazem os terroristas do Hamas e do Hezbollah, cujos líderes se escondem em túneis e deixam os civis desprotegidos, servindo de escudos. Uma coisa também é certa nesta nova fase no Líbano. Até ver, o enorme exército nacional não mexeu uma palha contra Israel, num sinal inequívoco que não o incomoda a destruição e decapitação dos xiitas extremistas do Hezbollah. O mesmo sucede, aliás, com o povo de Gaza, que despreza o Hamas que o escraviza. Outra prova de que Israel não está tão isolado como parece no próprio Médio Oriente é a passividade dos países sunitas, designadamente a Arábia Saudita, desejosa de que se eliminem os hutis do Iémen. É provável que os próximos dias tragam desenvolvimentos violentos por parte de Israel, enquanto os iranianos se devem limitar a respostas calibradas para não perder a face e a influência terrorista. De notar que Israel nunca atacou o Irão. Atua agora, fundamentalmente, no Líbano, um país soberano e não uma extensão do Irão como alguma imprensa faz crer. O mais que fez foi eliminar, em Teerão, um dos terroristas mais perigosos do mundo. Se o conflito entre Telavive e Teerão subir de nível, então é possível que as coisas tomem proporções inimagináveis. Há um ano, o mundo assistiu horrorizado ao ataque do Hamas e depois tem seguido a dura retaliação israelita nas televisões e numa imprensa que, em regra, odeia Israel, sobretudo por ser o grande aliado e o protegido dos Estados Unidos. Quanto a esse conflito, é certo que as próximas presidenciais americanas pouco mudarão, a não ser para pior caso Trump vença. Já no que respeita à Ucrânia tudo pode ser diferente. A um mês das eleições e com gente a votar neste momento, verifica-se uma remontada de Trump, apesar de ser um idiota político, semianalfabeto e um imaturo meio esquizofrénico, a quem alguns querem oferecer uma metralhadora. Alguma coisa tem de estar muito mal na democracia americana, uma das mais antigas do mundo, para que uma criatura assim volte à Casa Branca, depois de ter patrocinado um assalto terrorista ao Capitólio para contestar a inegável derrota de há quatro anos. É certo que há um abuso de imposições woke, que a imigração é um problema sério, que os americanos gostam do isolacionismo, havendo uma lógica rural, conservadora e reacionária consistente. Mas daí a voltarem a escolher um cromo como Trump é algo que aterroriza quem já se sente angustiado perante Putin, Kim, Xi Jinping e os seus lacaios, sejam ditadores ou idiotas úteis do Ocidente.