Na política, mais do mesmo


O regresso trouxe pouca elevação e muita pantominice.


Nota prévia: A trágica consequência da queda de um helicóptero que regressava de uma frente de combate a um incêndio foi mais uma prova de que são aqueles que estão nos teatros de operações, nas primeiras linhas da salvaguarda do bem comum, da ordem pública e da Defesa que correm mais riscos e requerem maior proteção. Essa proteção tanto tem de ser dada através de equipamentos adequados como de meios de sobrevivência através de vencimentos dignos. Não se conhecem as causas deste acidente que matou cinco soldados da GNR e feriu o piloto. Há que aguardar sem especular. Espera-se também que a rapidez com que o chefe do Governo apareceu no local e a excessiva controvérsia que originou a sua inopinada deslocação, com foto (insolitamente tirada por um segurança pessoa da PSP!), num barco semirrígido de operações, tenha correspondência no amparo às famílias das vítimas. Montenegro merece que se aceite as explicações que deu sobre essa aparição excessivamente perto de operacionais em missão, contrariando o estabelecido. Mais avisados, o Presidente Marcelo (depois do que aconteceu em Pedrógão) e a ministra Blasco estiveram lá sem ninguém os ver. Já o ministro da Defesa não resistiu ao apelo das câmaras. Acorreu ao local no dia seguinte, ladeado por um conhecido almirante. Quanto à presença dos principais responsáveis do Estado nos funerais era obviamente uma estrita obrigação.

1. A política regressou em força, mau grado o dramático acidente de sexta feira. As habilidades dialéticas voltaram com matizes diferentes, mas sem elevação. Assiste-se a um jogo do empurra entre Governo, PS e Chega para ver quem e como viabiliza ou não o Orçamento do Estado, sendo certo que o seu chumbo não implica a queda do Governo, o que dá margem de conforto a Luís Montenegro, que se tem mantido sereno, atribuindo a instabilidade aos nervos da oposição. Foi o que fez no encerramento da Academia dos “jotinhas” do PSD. Toda esta encenação de ora negoceiam, ora não falam e amuam, ora têm trocas epistolares, ora anunciam irrevogáveis votos contra, tem pouco de Estado e muito de pantomina. Os portugueses comuns não estão preocupados. Já sabem, por experiência recente, que não é por falta de orçamento que acaba o país ou vem uma bancarrota. Estes jogos de empurra só dão argumentos aos que se distanciam da política, achando ser tudo farinha do mesmo saco.

2. É dada como certa a candidatura de Luís Marques Mendes à Presidência da República. As dúvidas diminuíram ainda mais com a sua intervenção na Universidade de Verão do PSD e a afirmação de que está mais perto do que nunca de uma decisão. E foram reforçadas quando Leonor Beleza fez saber que não está nos seus planos candidatar-se, apesar de o seu nome ter sido sugerido como um dos possíveis por Hugo Soares. Em Castelo de Vide, ouviu-se de Marques Mendes um forte discurso motivador e de ambição para Portugal, como raros políticos são capazes de produzir. Mesmo quem discorde, não pode negar a capacidade de pensamento estratégico e de ambição nacional de Mendes. Se avançar para Belém, terá de escolher muito bem o seu “timing”, uma vez que a partir do anúncio da decisão fica sem a presença televisiva na SIC. Deixar o ecrã e uma quota de popularidade incomparável, já é difícil. Agora imagine-se o passo de avançar para Belém, sem garantia de sucesso, num país caótico. É nos grandes desafios que os políticos notáveis se distinguem do cidadão comum, dos meros arrivistas partidários, dos jornalistas e dos comentadores. Sendo unipessoal, o cargo de Presidente da República é o mais complexo de todos, embora pareça.

3. Sem surpresa, Maria Luís Albuquerque foi indicada para ocupar a vaga portuguesa na comissão europeia. A ex-ministra das Finanças era a figura desejada por Pedro Passos Coelho, cuja voz foi ouvida. Albuquerque foi professora do ex-primeiro-ministro e nunca lhe falhou. A nomeação tem ainda de ser validada pelas instâncias europeias, sendo improvável que lhe coloquem objeções. Albuquerque e Montenegro ambicionam uma pasta de grande influência ligada às áreas económicas, que ela supostamente domina. Em termos curriculares, a putativa comissária lembra os jogadores que passam pelos grandes clubes sem deixar marca. É arrumadinha de contas, mas não se lhe conhece pensamento sobre a Europa e os seus destinos. O nome não foi negociado com o PS, que Albuquerque teve o mau gosto de criticar em Castelo de Vide, precisamente quando Costa vai presidir ao Conselho Europeu. Alguns socialistas lembraram, entretanto, que a ex-ministra foi executora da austeridade que a troika impôs. Deviam ter estado calados. A austeridade ocorreu porque houve uma crise mundial, um Sócrates descontrolado, uma bancarrota nacional, um PS cúmplice e vastas tropelias bancárias. Já a forma como foram negociadas as privatizações no tempo de Albuquerque foi desastrosa, como se viu com a ANA e, em certa medida, a TAP. Por pouco que não marchou também a Caixa Geral de Depósitos. Anunciada a comissária, os citados socialistas foram mal-agradecidos. Não tiveram a elevação de Luís Montenegro ao apoiar a candidatura de António Costa à presidência do Conselho Europeu.

4. O presidente da Câmara de Santarém vai presidir ao Instituto do Desporto. Já o de Esposende segue para presidente do IRHU. Veremos se a CRESAP os aceita. Os dois autarcas do PSD têm uma coisa em comum: estão em fim do terceiro mandato e não podem recandidatar-se. Pronto, estes já estão arrumadinhos. Se sabem da poda, são outros quinhentos…

5. Mais coisa menos coisa, o que se passou em Tancos repetiu-se em zona urbana com o estranho assalto à Secretaria Geral do Ministério da Administração interna, na baixa de Lisboa. As câmaras também estavam desligadas (ou avariadas) e não havia rondas de segurança. O caso tem pouco de responsabilidade política pessoal e muito de estrutural. Não é suposto um governante saber coisas tão básicas. Fica à vista o nosso desleixo. Compramos e não mantemos. As rotinas deixam de ser feitas. A isso juntou-se o teletrabalho, o que fez com que o assalto só fosse notado cerca das dez da manhã. Vá lá que foi de quarta para quinta. Se calha ser de quinta para sexta, talvez só soubéssemos segunda.

6. Como é público e notório, a AIMA (Agência para a Integração, Migrações e Asilo) não tem sido capaz de despachar em tempo útil os pedidos de residência que lhe chegam. Há centenas de queixas de lesados das quais a agência tem de se defender. Visto que a instituição não tem juristas que cheguem, abriu-se um concurso. Uma sociedade de advogados candidatou-se, ganhou e vai levar 200 mil euros. Temos um Estado gigante onde não precisamos e pequenino em áreas específicas, como a jurídica, onde prosperam tubarões.

7. Depois de se saber que apareceu em alguma restauração da área turística uma ementa clandestina e baratinha para “tuga”, multiplicam-se agora informações sobre locais onde sugerem que se deixe uma gorjeta que começa nos 5%. Para facilitar, a proposta até vem inscrita no terminal de pagamento. Nos Estados Unidos, onde os empregados se desfazem em atenções, o processo está institucionalizado. Por cá, a novidade é explicada como uma forma de também dar acesso à gorjeta aos que trabalham nos bastidores. Já os clientes parecem mais inclinados a considerar a habilidade uma forte pressão ou um imposto oculto. Esperemos que a moda não pegue. Só iria antecipar a inevitável crise da restauração que aí vem.

Lamentável nota final: O Jornal da Tarde da RTP, e eventualmente outros media, noticiaram a certa altura que todos os ocupantes do helicóptero caído no Douro tinham sido resgatados. No dia a seguir veio um pedido de desculpas pela falsa boa nova. Pedir desculpas não chega. Há notícias de tal maneira relevantes que só podem ser dadas citando a fonte. Como não foi o caso, a informação responsabiliza totalmente quem a deu e deve ter consequências. O que se passou resulta do hábito reiterado das TVs picarem o que os outros dizem e assumirem que é assim. Imagine-se as famílias agarradas aos televisores e ávidas de notícias. Uma tristeza! Ainda falam dos políticos!

Na política, mais do mesmo


O regresso trouxe pouca elevação e muita pantominice.


Nota prévia: A trágica consequência da queda de um helicóptero que regressava de uma frente de combate a um incêndio foi mais uma prova de que são aqueles que estão nos teatros de operações, nas primeiras linhas da salvaguarda do bem comum, da ordem pública e da Defesa que correm mais riscos e requerem maior proteção. Essa proteção tanto tem de ser dada através de equipamentos adequados como de meios de sobrevivência através de vencimentos dignos. Não se conhecem as causas deste acidente que matou cinco soldados da GNR e feriu o piloto. Há que aguardar sem especular. Espera-se também que a rapidez com que o chefe do Governo apareceu no local e a excessiva controvérsia que originou a sua inopinada deslocação, com foto (insolitamente tirada por um segurança pessoa da PSP!), num barco semirrígido de operações, tenha correspondência no amparo às famílias das vítimas. Montenegro merece que se aceite as explicações que deu sobre essa aparição excessivamente perto de operacionais em missão, contrariando o estabelecido. Mais avisados, o Presidente Marcelo (depois do que aconteceu em Pedrógão) e a ministra Blasco estiveram lá sem ninguém os ver. Já o ministro da Defesa não resistiu ao apelo das câmaras. Acorreu ao local no dia seguinte, ladeado por um conhecido almirante. Quanto à presença dos principais responsáveis do Estado nos funerais era obviamente uma estrita obrigação.

1. A política regressou em força, mau grado o dramático acidente de sexta feira. As habilidades dialéticas voltaram com matizes diferentes, mas sem elevação. Assiste-se a um jogo do empurra entre Governo, PS e Chega para ver quem e como viabiliza ou não o Orçamento do Estado, sendo certo que o seu chumbo não implica a queda do Governo, o que dá margem de conforto a Luís Montenegro, que se tem mantido sereno, atribuindo a instabilidade aos nervos da oposição. Foi o que fez no encerramento da Academia dos “jotinhas” do PSD. Toda esta encenação de ora negoceiam, ora não falam e amuam, ora têm trocas epistolares, ora anunciam irrevogáveis votos contra, tem pouco de Estado e muito de pantomina. Os portugueses comuns não estão preocupados. Já sabem, por experiência recente, que não é por falta de orçamento que acaba o país ou vem uma bancarrota. Estes jogos de empurra só dão argumentos aos que se distanciam da política, achando ser tudo farinha do mesmo saco.

2. É dada como certa a candidatura de Luís Marques Mendes à Presidência da República. As dúvidas diminuíram ainda mais com a sua intervenção na Universidade de Verão do PSD e a afirmação de que está mais perto do que nunca de uma decisão. E foram reforçadas quando Leonor Beleza fez saber que não está nos seus planos candidatar-se, apesar de o seu nome ter sido sugerido como um dos possíveis por Hugo Soares. Em Castelo de Vide, ouviu-se de Marques Mendes um forte discurso motivador e de ambição para Portugal, como raros políticos são capazes de produzir. Mesmo quem discorde, não pode negar a capacidade de pensamento estratégico e de ambição nacional de Mendes. Se avançar para Belém, terá de escolher muito bem o seu “timing”, uma vez que a partir do anúncio da decisão fica sem a presença televisiva na SIC. Deixar o ecrã e uma quota de popularidade incomparável, já é difícil. Agora imagine-se o passo de avançar para Belém, sem garantia de sucesso, num país caótico. É nos grandes desafios que os políticos notáveis se distinguem do cidadão comum, dos meros arrivistas partidários, dos jornalistas e dos comentadores. Sendo unipessoal, o cargo de Presidente da República é o mais complexo de todos, embora pareça.

3. Sem surpresa, Maria Luís Albuquerque foi indicada para ocupar a vaga portuguesa na comissão europeia. A ex-ministra das Finanças era a figura desejada por Pedro Passos Coelho, cuja voz foi ouvida. Albuquerque foi professora do ex-primeiro-ministro e nunca lhe falhou. A nomeação tem ainda de ser validada pelas instâncias europeias, sendo improvável que lhe coloquem objeções. Albuquerque e Montenegro ambicionam uma pasta de grande influência ligada às áreas económicas, que ela supostamente domina. Em termos curriculares, a putativa comissária lembra os jogadores que passam pelos grandes clubes sem deixar marca. É arrumadinha de contas, mas não se lhe conhece pensamento sobre a Europa e os seus destinos. O nome não foi negociado com o PS, que Albuquerque teve o mau gosto de criticar em Castelo de Vide, precisamente quando Costa vai presidir ao Conselho Europeu. Alguns socialistas lembraram, entretanto, que a ex-ministra foi executora da austeridade que a troika impôs. Deviam ter estado calados. A austeridade ocorreu porque houve uma crise mundial, um Sócrates descontrolado, uma bancarrota nacional, um PS cúmplice e vastas tropelias bancárias. Já a forma como foram negociadas as privatizações no tempo de Albuquerque foi desastrosa, como se viu com a ANA e, em certa medida, a TAP. Por pouco que não marchou também a Caixa Geral de Depósitos. Anunciada a comissária, os citados socialistas foram mal-agradecidos. Não tiveram a elevação de Luís Montenegro ao apoiar a candidatura de António Costa à presidência do Conselho Europeu.

4. O presidente da Câmara de Santarém vai presidir ao Instituto do Desporto. Já o de Esposende segue para presidente do IRHU. Veremos se a CRESAP os aceita. Os dois autarcas do PSD têm uma coisa em comum: estão em fim do terceiro mandato e não podem recandidatar-se. Pronto, estes já estão arrumadinhos. Se sabem da poda, são outros quinhentos…

5. Mais coisa menos coisa, o que se passou em Tancos repetiu-se em zona urbana com o estranho assalto à Secretaria Geral do Ministério da Administração interna, na baixa de Lisboa. As câmaras também estavam desligadas (ou avariadas) e não havia rondas de segurança. O caso tem pouco de responsabilidade política pessoal e muito de estrutural. Não é suposto um governante saber coisas tão básicas. Fica à vista o nosso desleixo. Compramos e não mantemos. As rotinas deixam de ser feitas. A isso juntou-se o teletrabalho, o que fez com que o assalto só fosse notado cerca das dez da manhã. Vá lá que foi de quarta para quinta. Se calha ser de quinta para sexta, talvez só soubéssemos segunda.

6. Como é público e notório, a AIMA (Agência para a Integração, Migrações e Asilo) não tem sido capaz de despachar em tempo útil os pedidos de residência que lhe chegam. Há centenas de queixas de lesados das quais a agência tem de se defender. Visto que a instituição não tem juristas que cheguem, abriu-se um concurso. Uma sociedade de advogados candidatou-se, ganhou e vai levar 200 mil euros. Temos um Estado gigante onde não precisamos e pequenino em áreas específicas, como a jurídica, onde prosperam tubarões.

7. Depois de se saber que apareceu em alguma restauração da área turística uma ementa clandestina e baratinha para “tuga”, multiplicam-se agora informações sobre locais onde sugerem que se deixe uma gorjeta que começa nos 5%. Para facilitar, a proposta até vem inscrita no terminal de pagamento. Nos Estados Unidos, onde os empregados se desfazem em atenções, o processo está institucionalizado. Por cá, a novidade é explicada como uma forma de também dar acesso à gorjeta aos que trabalham nos bastidores. Já os clientes parecem mais inclinados a considerar a habilidade uma forte pressão ou um imposto oculto. Esperemos que a moda não pegue. Só iria antecipar a inevitável crise da restauração que aí vem.

Lamentável nota final: O Jornal da Tarde da RTP, e eventualmente outros media, noticiaram a certa altura que todos os ocupantes do helicóptero caído no Douro tinham sido resgatados. No dia a seguir veio um pedido de desculpas pela falsa boa nova. Pedir desculpas não chega. Há notícias de tal maneira relevantes que só podem ser dadas citando a fonte. Como não foi o caso, a informação responsabiliza totalmente quem a deu e deve ter consequências. O que se passou resulta do hábito reiterado das TVs picarem o que os outros dizem e assumirem que é assim. Imagine-se as famílias agarradas aos televisores e ávidas de notícias. Uma tristeza! Ainda falam dos políticos!