O Sistema Elétrico Português: O Desastre da Falta de Planeamento


É incompreensível que não se tenha feito nenhum Planeamento do Sistema Elétrico em Portugal desde 1983, e que se tenha entretanto subvertido a respetiva lógica de funcionamento.


O Sistema Elétrico exige investimentos muito elevados, nomeadamente em Centrais de produção de eletricidade que envolvem centenas de milhões de euros.

 Para se poderem amortizar estes investimentos, estas Centrais vão ter de funcionar durante dezenas de anos, pelo que é indispensável fazer um Planeamento do Sistema Elétrico que abranja o respetivo prazo de vida útil.

É por isso incompreensível que não se tenha feito nenhum Planeamento do Sistema Elétrico em Portugal desde 1983, e que se tenha entretanto subvertido a respetiva lógica de funcionamento, quando se tomou a decisão política de o passar a basear em mais de 7.000 MW de potências intermitentes protegidas por FIT – Feed In Tariffs.

Há que recordar que estas FIT conferem aos investidores em potências intermitentes, eólicas e solares, as seguintes vantagens decisivas:

1 – a respetiva eletricidade tem acesso garantido à Rede pública, mesmo que o mercado dela não necessite nesse momento;

2 – o produtor tem sempre um preço de venda garantido, independentemente do preço do mercado livre que prevalecer nesse momento;

3 – todos os encargos com os backups, necessários para evitar “apagões”, são suportados integralmente pelos consumidores.

Ao ler-se o Relatório da SU Eletricidade relativo a 2023, ficamos a saber que os preços médios pagos aos produtores intermitentes com FIT, foram os seguintes:

– Potências solares: 315,4 euros/MWh;

– Eólicas offshore: 159,5 euros/MWh;

– Eólicas em terra: 96,6 euros/MWh.

Como estes preços garantidos são muito superiores ao preço de mercado, isto significa que os consumidores tiveram que pagar em 2023 um sobrecusto total de 1.837 milhões de euros, dos quais mais de 67% (1.237 milhões de euros) corresponde às eólicas!

Este valor aparece nas faturas, pagas pelos consumidores, nas designadas TAR-Tarifas de Acesso à Rede, que exatamente por isso foram significativamente aumentadas no passado dia 1 de Junho.

E isto, para além da famigerada Dívida Tarifária do Setor Elétrico, que se aproxima dos 3.000 milhões de euros no final deste ano de 2024.

Como o período de vigência da maioria destas FIT concedidas a potências intermitentes se vai prolongar até 2036, nomeadamente as abrangidas pelo Decreto-Lei 35/2013, a prioridade da nova Ministra do Ambiente e Energia, Graça Carvalho, terá que ser um levantamento exaustivo de todas as FIT já contratadas, bem como os respetivos valores e prazos de vigência.

De facto, não é possível conceder mais FIT, ou outros mecanismos equivalentes de “reserva de mercado e preços garantidos”, sem primeiro se saber com rigor o horizonte temporal e financeiro das que já se encontram neste momento comprometidas por contratos.

A enorme quantidade de potências intermitentes protegidas por FIT, já hoje existentes, é, para os consumidores portugueses, um desastre permanente:

– quando há vento e/ou sol, pagam um valor elevadíssimo pelas FIT, que lhes aparecem nas faturas através das TAR- Tarifas de Acesso à Rede;

– quando não há vento e/ou sol, pagam um valor muito elevado pelos backups, que são necessários para evitar os apagões .

Sublinhe-se que numa economia frágil como a portuguesa, o Sistema Elétrico tem de ser um dos pilares da respetiva competitividade. E não o inverso, como infelizmente está a acontecer desde 2008.

Por exemplo, os consumidores são hoje obrigados a pagar 400 Euros/MWh por certas FIT solares, mesmo quando o mercado está a zero !

Promover potências intermitentes ao arrepio de qualquer lógica económica, está a destruir a rentabilidade dos investimentos já feitos na produção de eletricidade, por quem apenas pode contar com o “preço de mercado”.

Vejamos três casos paradigmáticos desta “destruição de valor“ :

– quem investiu em “potências intermitentes para mercado”, nomeadamente  solares, está numa situação delicada pois quando há sol e/ou vento os preços  afundam para perto de zero ;

– já quando não há sol e/ou vento, os preços horários sobem, mas eles não têm eletricidade para vender, e portanto nada faturam ;

– as três centrais a Gás Natural “em mercado” existentes em Portugal – Lezíria, Lavre/Figueira e Pego/Abrantes – têm “uma vida muito complicada”, pois devido ao regime de pára/arranca, ditado pelas FIT que protegem as potências intermitentes, é preferível ir comprar a Espanha a eletricidade necessária para evitar “apagões”.

E é isso que justifica as elevadíssimas importações líquidas de eletricidade, que nos últimos três anos ultrapassam já os 3.300 milhões de euros!

Ou seja, recursos valiosíssimos investidos na produção de eletricidade estão a ser pura e simplesmente delapidados.

É pois da maior urgência que o novo Governo faça um Planeamento do Sistema Elétrico, até pelo menos 2040 .

A fim de se acabar com este desastre, que está a destruir a nossa economia .

Só depois desse Planeamento se pode tomar qualquer decisão sobre a concessão ( ou não ) de mais FIT, ou mecanismos equivalentes, a mais potências intermitentes, a começar pelas eólicas offshore .

Assim o exigem a competitividade económica e a estabilidade social de Portugal, e uma Democracia de Qualidade.

Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico

Subscritor do Manifesto “Por Uma Democracia de Qualidade”

O Sistema Elétrico Português: O Desastre da Falta de Planeamento


É incompreensível que não se tenha feito nenhum Planeamento do Sistema Elétrico em Portugal desde 1983, e que se tenha entretanto subvertido a respetiva lógica de funcionamento.


O Sistema Elétrico exige investimentos muito elevados, nomeadamente em Centrais de produção de eletricidade que envolvem centenas de milhões de euros.

 Para se poderem amortizar estes investimentos, estas Centrais vão ter de funcionar durante dezenas de anos, pelo que é indispensável fazer um Planeamento do Sistema Elétrico que abranja o respetivo prazo de vida útil.

É por isso incompreensível que não se tenha feito nenhum Planeamento do Sistema Elétrico em Portugal desde 1983, e que se tenha entretanto subvertido a respetiva lógica de funcionamento, quando se tomou a decisão política de o passar a basear em mais de 7.000 MW de potências intermitentes protegidas por FIT – Feed In Tariffs.

Há que recordar que estas FIT conferem aos investidores em potências intermitentes, eólicas e solares, as seguintes vantagens decisivas:

1 – a respetiva eletricidade tem acesso garantido à Rede pública, mesmo que o mercado dela não necessite nesse momento;

2 – o produtor tem sempre um preço de venda garantido, independentemente do preço do mercado livre que prevalecer nesse momento;

3 – todos os encargos com os backups, necessários para evitar “apagões”, são suportados integralmente pelos consumidores.

Ao ler-se o Relatório da SU Eletricidade relativo a 2023, ficamos a saber que os preços médios pagos aos produtores intermitentes com FIT, foram os seguintes:

– Potências solares: 315,4 euros/MWh;

– Eólicas offshore: 159,5 euros/MWh;

– Eólicas em terra: 96,6 euros/MWh.

Como estes preços garantidos são muito superiores ao preço de mercado, isto significa que os consumidores tiveram que pagar em 2023 um sobrecusto total de 1.837 milhões de euros, dos quais mais de 67% (1.237 milhões de euros) corresponde às eólicas!

Este valor aparece nas faturas, pagas pelos consumidores, nas designadas TAR-Tarifas de Acesso à Rede, que exatamente por isso foram significativamente aumentadas no passado dia 1 de Junho.

E isto, para além da famigerada Dívida Tarifária do Setor Elétrico, que se aproxima dos 3.000 milhões de euros no final deste ano de 2024.

Como o período de vigência da maioria destas FIT concedidas a potências intermitentes se vai prolongar até 2036, nomeadamente as abrangidas pelo Decreto-Lei 35/2013, a prioridade da nova Ministra do Ambiente e Energia, Graça Carvalho, terá que ser um levantamento exaustivo de todas as FIT já contratadas, bem como os respetivos valores e prazos de vigência.

De facto, não é possível conceder mais FIT, ou outros mecanismos equivalentes de “reserva de mercado e preços garantidos”, sem primeiro se saber com rigor o horizonte temporal e financeiro das que já se encontram neste momento comprometidas por contratos.

A enorme quantidade de potências intermitentes protegidas por FIT, já hoje existentes, é, para os consumidores portugueses, um desastre permanente:

– quando há vento e/ou sol, pagam um valor elevadíssimo pelas FIT, que lhes aparecem nas faturas através das TAR- Tarifas de Acesso à Rede;

– quando não há vento e/ou sol, pagam um valor muito elevado pelos backups, que são necessários para evitar os apagões .

Sublinhe-se que numa economia frágil como a portuguesa, o Sistema Elétrico tem de ser um dos pilares da respetiva competitividade. E não o inverso, como infelizmente está a acontecer desde 2008.

Por exemplo, os consumidores são hoje obrigados a pagar 400 Euros/MWh por certas FIT solares, mesmo quando o mercado está a zero !

Promover potências intermitentes ao arrepio de qualquer lógica económica, está a destruir a rentabilidade dos investimentos já feitos na produção de eletricidade, por quem apenas pode contar com o “preço de mercado”.

Vejamos três casos paradigmáticos desta “destruição de valor“ :

– quem investiu em “potências intermitentes para mercado”, nomeadamente  solares, está numa situação delicada pois quando há sol e/ou vento os preços  afundam para perto de zero ;

– já quando não há sol e/ou vento, os preços horários sobem, mas eles não têm eletricidade para vender, e portanto nada faturam ;

– as três centrais a Gás Natural “em mercado” existentes em Portugal – Lezíria, Lavre/Figueira e Pego/Abrantes – têm “uma vida muito complicada”, pois devido ao regime de pára/arranca, ditado pelas FIT que protegem as potências intermitentes, é preferível ir comprar a Espanha a eletricidade necessária para evitar “apagões”.

E é isso que justifica as elevadíssimas importações líquidas de eletricidade, que nos últimos três anos ultrapassam já os 3.300 milhões de euros!

Ou seja, recursos valiosíssimos investidos na produção de eletricidade estão a ser pura e simplesmente delapidados.

É pois da maior urgência que o novo Governo faça um Planeamento do Sistema Elétrico, até pelo menos 2040 .

A fim de se acabar com este desastre, que está a destruir a nossa economia .

Só depois desse Planeamento se pode tomar qualquer decisão sobre a concessão ( ou não ) de mais FIT, ou mecanismos equivalentes, a mais potências intermitentes, a começar pelas eólicas offshore .

Assim o exigem a competitividade económica e a estabilidade social de Portugal, e uma Democracia de Qualidade.

Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico

Subscritor do Manifesto “Por Uma Democracia de Qualidade”