Montenegro ganha fôlego


Luís Montenegro tem se afirmado e já não é tido como solução transitória no Governo, na liderança da AD e da direita moderada.


Nota prévia: Em França, a primeira volta das legislativas colocou a extrema-direita à porta do poder. A mobilização do eleitorado foi recorde, mas não alterou o favoritismo do partido de Marine Le Pen, que atingiu 33%. A Nova Frente Popular, uma amalgama que mete esquerda moderada, gente antissemita e apoiantes de terroristas, conseguiu o segundo lugar com 28%, enquanto o partido de Macron se afundou, obtendo 20%. Os gaulistas conseguiram 10%, mais do que esperado. Na segunda volta, vai jogar o jogo das desistências dos terceiros candidatos que passaram. Tanto a esquerda como os “macronistas” vão, em geral, desistir para quem estiver mais bem posicionado para derrotar Le Pen. Numa antecipação do que pode vir aí, houve violência nas ruas na sequência do apelo ao protesto antifascista de várias organizações.

1. Apesar do tempo instável, entrámos no período de descontos para as férias. Estamos na chamada “silly season”. As grandes cidades vão-se esvaziando. A população está menos atenta, embora a política nacional e internacional ande a mil. É, pois, possível fazer um balancete do trabalho do Governo e do primeiro-ministro de Portugal. Sob qualquer ângulo, apesar de dificuldades em setores específicos como a saúde e a administração interna, onde prometeu muito e pouco fez, é manifesto que a equipa e Montenegro estão a consolidar-se. O chefe do Governo tem sido discreto, mas tem ganho popularidade com isso. Já não é visto como um líder transitório. Alarga-se a falange de apoiantes, aumentam os elogios de moderados e exaltam-se os radicais que o combatem, o que é um bom sinal. Entre os que apoiam e os que o combatem aumenta o número dos que vaticinam no mínimo dois anos e meio de mandato, o que parecia uma impossibilidade há dois meses. Montenegro consegue controlar e conter sem agressividade os ataques de Pedro Nuno Santos (PNS). Com sinceridade e empenho, piscou o olho ao eleitorado socialista ao apoiar ativamente a eleição de António Costa para o Conselho Europeu. Tornou André Ventura o seu principal alvo, cumprindo o “não é não”. Sabe que mais facilmente terá a compreensão do eleitorado do PS. Aposta numa política com pontos comuns com o Chega, na expectativa de que alguns dos votantes dessa direita olhem para ele como fator de estabilidade e moderação. Atento, Ventura é obrigado a radicalizar-se na ação política quotidiana, o que é desgastante. Ao mostrar-se simultaneamente firme e fazedor, Montenegro tem potencial de crescimento à direita e à esquerda e ganha espaço. As cedências que vai fazendo a reivindicações são um bom sinal e a economia parece aguentar-se, desde logo porque o turismo continua a render. Dito isto, a questão objetiva da sobrevivência do Governo tem a ver com a passagem ou não do Orçamento para 2025. Face à progressiva afirmação de Montenegro, PS e Chega terão de pensar muito bem, cada um por seu lado ou por sinais de fumo, o que cada um vai fazer. Quem derrubar o Governo sujeita-se a pagar caro. E a oportunidade está no orçamento. A partir daí entra-se em períodos complicados do calendário politico-eleitoral. Isto numa altura em que o presidente Marcelo recupera a olhos vistos o seu ânimo. E não está interessado em deixar marcar o seu segundo mandato por mais uma fase de instabilidade. Em resumo: Pedro Nuno Santos tem de pensar muito bem cada passo e evitar erros que podem ser fatais. Ventura entrou numa fase em que o contra-ataque de Montenegro lhe pode causar danos. No meio disto, o Governo decide coisas que beneficiam o cidadão comum. Foi o caso da imposição do atendimento presencial por ordem de chegada na administração pública. Acabou-se o reinado da porta fechada e da marcação exclusiva online. Já agora, uma sugestão: tolerância de ponto não significa feriado nacional nem balda. Os serviços do Estado têm mesmo de ser assegurados nessas alturas, sobretudo nos hospitais.

2. Luís Marques Mendes revelou, sábado, na SIC, que o ministro da Economia, Pedro Reis, anuncia esta semana um pacotão de 60 medidas para dinamizar a economia. Coincidência ou não, no Expresso, Cavaco Silva publicou um extenso artigo em que dá a sua receita para tirar Portugal da cauda da Europa, através de uma mudança de orientação, reforçando o investimento na indústria e em setores que acrescentem valor e competitividade através da transformação. Percebem-se dúvidas de Cavaco sobre uma economia suportada na construção civil e no turismo. Será curioso comparar o documento de Pedro Reis com a opinião do ex-primeiro-ministro e ex-presidente, sabendo-se que este aconselha regularmente Luís Montenegro. Cavaco enfatiza a estabilidade política como um bem essencial para o crescimento, mas é evasivo nos conselhos. Só diz o óbvio: uma maioria parlamentar é essencial como base de estabilidade para o desenvolvimento económico. Refere um bloco central e eventuais eleições antecipadas como solução. Já Charles Maurras, o ideólogo da direita francesa de entre as duas guerras mundiais, dizia sabiamente “politique d’abord”.

3. Por mais razões que tenham, e têm, os elementos das forças de segurança devem evitar a armadilha que André Ventura lhes estendeu ao pedir que vão, quinta-feira, manifestarem-se nas galerias do Parlamento e na rua quando a situação deles for discutida. O que Ventura fez é uma lamentável tentativa de intimidação. Lembra o que foi feito no tempo do PREC, na confusão esquerdista do pós 25 de Abril.

4. Na política, os choques com a realidade são frequentes e nem sempre agradáveis, mas servem para crescer. Veja-se a Iniciativa Liberal. Na noite das europeias cantou vitória cedo demais ao julgar que passava a terceira força, apesar do péssimo candidato do Chega. Depois, Cotrim de Figueiredo achou-se capaz de presidir ao grupo dos liberais no Parlamento Europeu. Em poucas horas desistiu. Ficou-se por uma das vice-presidências. A IL acabou até por ter de apoiar António Costa na corrida europeia, o que não queria. Como se não bastasse, os liberais perceberam que nas autárquicas não irão longe se mantiverem a recusa de fazer coligações. Em Lisboa vão alinhar com Moedas, para combater o frentismo de esquerda que se anuncia. Ter os pés na terra é sempre útil.

5. É consensual que Joe Biden foi um desastre no primeiro debate com Trump. Uma derrota eleitoral do democrata já era uma possibilidade, mas agora é uma alta probabilidade. Sucedem-se movimentos e posições na influente imprensa americana para que Biden dê lugar a outro (lá, ninguém se disfarça no jornalismo que pratica e que é o melhor do mundo). Mesmo que tal suceda, será sempre difícil derrotar o republicano. A ideia de Trump voltar à Casa Branca é aterradora para o Ocidente e uma bênção para regimes como o russo e o chinês. Os americanos de classe média consideram Biden fraco e estão a radicalizar-se à direita, em boa parte como reação ao cavalgar da cultura “woke” que infetou a política americana e parte da europeia.

6. As relações entre Portugal e o Qatar têm vindo a desenvolver-se de forma regular, havendo condições para lhes dar novo impulso. Para isso contribui a vontade daquele país árabe de se afirmar como centro de acolhimento de cimeiras políticas mundiais e de grandes eventos económicos e desportivos, na sequência sobretudo do êxito Mundial de futebol. Isto para além da capacidade de investimento externo do Qatar e o potencial que constitui para as empresas portuguesas o seu crescimento interno. Nesta altura, voltaram as ligações aéreas diretas entre os dois países, aguarda-se a nomeação do novo embaixador qatari, o que poderá dinamizar a atividade de várias instituições multilaterais, nomeadamente o Conselho da Diáspora Portuguesa. Trata-se de um potencial a explorar, até porque o Qatar é o único país do Médio Oriente com estatuto de observador associado da CPLP.

Montenegro ganha fôlego


Luís Montenegro tem se afirmado e já não é tido como solução transitória no Governo, na liderança da AD e da direita moderada.


Nota prévia: Em França, a primeira volta das legislativas colocou a extrema-direita à porta do poder. A mobilização do eleitorado foi recorde, mas não alterou o favoritismo do partido de Marine Le Pen, que atingiu 33%. A Nova Frente Popular, uma amalgama que mete esquerda moderada, gente antissemita e apoiantes de terroristas, conseguiu o segundo lugar com 28%, enquanto o partido de Macron se afundou, obtendo 20%. Os gaulistas conseguiram 10%, mais do que esperado. Na segunda volta, vai jogar o jogo das desistências dos terceiros candidatos que passaram. Tanto a esquerda como os “macronistas” vão, em geral, desistir para quem estiver mais bem posicionado para derrotar Le Pen. Numa antecipação do que pode vir aí, houve violência nas ruas na sequência do apelo ao protesto antifascista de várias organizações.

1. Apesar do tempo instável, entrámos no período de descontos para as férias. Estamos na chamada “silly season”. As grandes cidades vão-se esvaziando. A população está menos atenta, embora a política nacional e internacional ande a mil. É, pois, possível fazer um balancete do trabalho do Governo e do primeiro-ministro de Portugal. Sob qualquer ângulo, apesar de dificuldades em setores específicos como a saúde e a administração interna, onde prometeu muito e pouco fez, é manifesto que a equipa e Montenegro estão a consolidar-se. O chefe do Governo tem sido discreto, mas tem ganho popularidade com isso. Já não é visto como um líder transitório. Alarga-se a falange de apoiantes, aumentam os elogios de moderados e exaltam-se os radicais que o combatem, o que é um bom sinal. Entre os que apoiam e os que o combatem aumenta o número dos que vaticinam no mínimo dois anos e meio de mandato, o que parecia uma impossibilidade há dois meses. Montenegro consegue controlar e conter sem agressividade os ataques de Pedro Nuno Santos (PNS). Com sinceridade e empenho, piscou o olho ao eleitorado socialista ao apoiar ativamente a eleição de António Costa para o Conselho Europeu. Tornou André Ventura o seu principal alvo, cumprindo o “não é não”. Sabe que mais facilmente terá a compreensão do eleitorado do PS. Aposta numa política com pontos comuns com o Chega, na expectativa de que alguns dos votantes dessa direita olhem para ele como fator de estabilidade e moderação. Atento, Ventura é obrigado a radicalizar-se na ação política quotidiana, o que é desgastante. Ao mostrar-se simultaneamente firme e fazedor, Montenegro tem potencial de crescimento à direita e à esquerda e ganha espaço. As cedências que vai fazendo a reivindicações são um bom sinal e a economia parece aguentar-se, desde logo porque o turismo continua a render. Dito isto, a questão objetiva da sobrevivência do Governo tem a ver com a passagem ou não do Orçamento para 2025. Face à progressiva afirmação de Montenegro, PS e Chega terão de pensar muito bem, cada um por seu lado ou por sinais de fumo, o que cada um vai fazer. Quem derrubar o Governo sujeita-se a pagar caro. E a oportunidade está no orçamento. A partir daí entra-se em períodos complicados do calendário politico-eleitoral. Isto numa altura em que o presidente Marcelo recupera a olhos vistos o seu ânimo. E não está interessado em deixar marcar o seu segundo mandato por mais uma fase de instabilidade. Em resumo: Pedro Nuno Santos tem de pensar muito bem cada passo e evitar erros que podem ser fatais. Ventura entrou numa fase em que o contra-ataque de Montenegro lhe pode causar danos. No meio disto, o Governo decide coisas que beneficiam o cidadão comum. Foi o caso da imposição do atendimento presencial por ordem de chegada na administração pública. Acabou-se o reinado da porta fechada e da marcação exclusiva online. Já agora, uma sugestão: tolerância de ponto não significa feriado nacional nem balda. Os serviços do Estado têm mesmo de ser assegurados nessas alturas, sobretudo nos hospitais.

2. Luís Marques Mendes revelou, sábado, na SIC, que o ministro da Economia, Pedro Reis, anuncia esta semana um pacotão de 60 medidas para dinamizar a economia. Coincidência ou não, no Expresso, Cavaco Silva publicou um extenso artigo em que dá a sua receita para tirar Portugal da cauda da Europa, através de uma mudança de orientação, reforçando o investimento na indústria e em setores que acrescentem valor e competitividade através da transformação. Percebem-se dúvidas de Cavaco sobre uma economia suportada na construção civil e no turismo. Será curioso comparar o documento de Pedro Reis com a opinião do ex-primeiro-ministro e ex-presidente, sabendo-se que este aconselha regularmente Luís Montenegro. Cavaco enfatiza a estabilidade política como um bem essencial para o crescimento, mas é evasivo nos conselhos. Só diz o óbvio: uma maioria parlamentar é essencial como base de estabilidade para o desenvolvimento económico. Refere um bloco central e eventuais eleições antecipadas como solução. Já Charles Maurras, o ideólogo da direita francesa de entre as duas guerras mundiais, dizia sabiamente “politique d’abord”.

3. Por mais razões que tenham, e têm, os elementos das forças de segurança devem evitar a armadilha que André Ventura lhes estendeu ao pedir que vão, quinta-feira, manifestarem-se nas galerias do Parlamento e na rua quando a situação deles for discutida. O que Ventura fez é uma lamentável tentativa de intimidação. Lembra o que foi feito no tempo do PREC, na confusão esquerdista do pós 25 de Abril.

4. Na política, os choques com a realidade são frequentes e nem sempre agradáveis, mas servem para crescer. Veja-se a Iniciativa Liberal. Na noite das europeias cantou vitória cedo demais ao julgar que passava a terceira força, apesar do péssimo candidato do Chega. Depois, Cotrim de Figueiredo achou-se capaz de presidir ao grupo dos liberais no Parlamento Europeu. Em poucas horas desistiu. Ficou-se por uma das vice-presidências. A IL acabou até por ter de apoiar António Costa na corrida europeia, o que não queria. Como se não bastasse, os liberais perceberam que nas autárquicas não irão longe se mantiverem a recusa de fazer coligações. Em Lisboa vão alinhar com Moedas, para combater o frentismo de esquerda que se anuncia. Ter os pés na terra é sempre útil.

5. É consensual que Joe Biden foi um desastre no primeiro debate com Trump. Uma derrota eleitoral do democrata já era uma possibilidade, mas agora é uma alta probabilidade. Sucedem-se movimentos e posições na influente imprensa americana para que Biden dê lugar a outro (lá, ninguém se disfarça no jornalismo que pratica e que é o melhor do mundo). Mesmo que tal suceda, será sempre difícil derrotar o republicano. A ideia de Trump voltar à Casa Branca é aterradora para o Ocidente e uma bênção para regimes como o russo e o chinês. Os americanos de classe média consideram Biden fraco e estão a radicalizar-se à direita, em boa parte como reação ao cavalgar da cultura “woke” que infetou a política americana e parte da europeia.

6. As relações entre Portugal e o Qatar têm vindo a desenvolver-se de forma regular, havendo condições para lhes dar novo impulso. Para isso contribui a vontade daquele país árabe de se afirmar como centro de acolhimento de cimeiras políticas mundiais e de grandes eventos económicos e desportivos, na sequência sobretudo do êxito Mundial de futebol. Isto para além da capacidade de investimento externo do Qatar e o potencial que constitui para as empresas portuguesas o seu crescimento interno. Nesta altura, voltaram as ligações aéreas diretas entre os dois países, aguarda-se a nomeação do novo embaixador qatari, o que poderá dinamizar a atividade de várias instituições multilaterais, nomeadamente o Conselho da Diáspora Portuguesa. Trata-se de um potencial a explorar, até porque o Qatar é o único país do Médio Oriente com estatuto de observador associado da CPLP.