Choque de oferta de habitação


Só com a mobilização do investimento privado será possível passar a construir 100 mil casas por ano.


A viragem de milénio coincidiu com uma diminuição acentuada do volume de construção de habitação, em Portugal.

Com efeito, depois de um “boom” vivido na década de noventa do século passado, em que se chegou a ultrapassar a marca dos 100 mil fogos construídos anualmente, nos anos seguintes verificou-se uma queda abrupta da construção de habitação, que atingiu o seu ponto mais baixo em 2015, com uns escassos 7 mil fogos.

De lado público, depois do PER – Programa Especial de Realojamento – que, durante a década de noventa, permitiu resolver os problemas de habitação de cerca de 48 mil famílias carenciadas nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, a promoção pública de habitação social praticamente desapareceu.

Em termos práticos, esta enorme redução do número de fogos construídos teve fortes consequências no mercado habitacional, provocando a escassez e o desajustamento da oferta, o aumento da especulação imobiliária e a subida muito significativa dos preços.

Chegados a este ponto, é importante reconhecer que as novas políticas públicas para a habitação, inscritas no programa do atual Governo, preconizam o aumento significativo das ofertas privada, pública e cooperativa. E não creio que esta ordem seja aleatória. Creio, aliás, que é intencional. E muito bem.

A este propósito, importa ter presente que o parque público de habitação é constituído por cerca de 120 mil fogos, a esmagadora maioria na posse dos municípios, o que representa, uns escassos 2% de todo o parque habitacional nacional. Mesmo com o financiamento do PRR, este parque público não vai aumentar significativamente, porque a principal aposta que está a ser desenvolvida pelos municípios é na reabilitação dos fogos já existentes, porque o seu estado de conservação e de eficiência energética assim o exige.

Por outro lado, creio ser consensual considerar que o Orçamento de Estado não chega para satisfazer todas as necessidades do nosso País que, aliás, tem sido legitimamente reivindicado por largos setores da sociedade portuguesa. Daqui se conclui que o parque público de habitação, mais direcionado para apoiar as famílias e indivíduos em situação mais vulnerável, não irá sofrer grande incremento nos próximos anos.

Portanto, resulta óbvio que só com a mobilização do investimento privado é possível recuperar os níveis de produção de casas a preços acessíveis para satisfazer as necessidades da população e contribuir para uma diminuição dos preços atuais da habitação.

Nos anos mais recentes, o nosso País já produziu cerca de 20 mil fogos anualmente, mas enquanto não for capaz de produzir algo semelhante a 100 mil fogos por ano, a crise habitacional vai continuar e os preços vão continuar a ser inacessíveis para muitas famílias portuguesas. Não tenhamos dúvidas disso.

Para isso, é importante estimular a adoção de medidas de incentivo ao investimento privado, designadamente fiscais, legislativas e de acesso ao financiamento.

É importante incrementar uma política fiscal mais justa, equilibrada e competitiva no domínio da habitação.

É importante simplificar e reduzir a excessiva morosidade dos processos de licenciamento.

É importante promover o acesso à concessão de financiamento, de médio e longo prazo, para a construção de habitação em regime de custos controlados.

Aliás, ainda recentemente o setor financeiro manifestou a sua disponibilidade e interesse em apoiar um “fortíssimo programa de construção habitacional em Portugal”, contribuindo para se resolver o problema do acesso à habitação.

Uma palavra também para o setor cooperativo que, à semelhança do seu contributo no passado, também, poderá ter novamente um papel de relevo num futuro próximo para o aumento do stock habitacional nacional.

Em suma, não tenhamos ilusões. A crise habitacional em que o nosso País está mergulhado não se resolverá de um dia para o outro. Mas, o diagnóstico está feito, as novas orientações das políticas públicas estão no caminho certo e, creio, que começa a ganhar consistência que o investimento privado é fundamental para aumentar a oferta de habitação a preços acessíveis para as famílias de rendimentos intermédios e, em particular, os mais jovens.

Mãos à obra!

Álvaro Santos

Especialista em Habitação e coautor do livro “Políticas Locais de Habitação”

Choque de oferta de habitação


Só com a mobilização do investimento privado será possível passar a construir 100 mil casas por ano.


A viragem de milénio coincidiu com uma diminuição acentuada do volume de construção de habitação, em Portugal.

Com efeito, depois de um “boom” vivido na década de noventa do século passado, em que se chegou a ultrapassar a marca dos 100 mil fogos construídos anualmente, nos anos seguintes verificou-se uma queda abrupta da construção de habitação, que atingiu o seu ponto mais baixo em 2015, com uns escassos 7 mil fogos.

De lado público, depois do PER – Programa Especial de Realojamento – que, durante a década de noventa, permitiu resolver os problemas de habitação de cerca de 48 mil famílias carenciadas nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, a promoção pública de habitação social praticamente desapareceu.

Em termos práticos, esta enorme redução do número de fogos construídos teve fortes consequências no mercado habitacional, provocando a escassez e o desajustamento da oferta, o aumento da especulação imobiliária e a subida muito significativa dos preços.

Chegados a este ponto, é importante reconhecer que as novas políticas públicas para a habitação, inscritas no programa do atual Governo, preconizam o aumento significativo das ofertas privada, pública e cooperativa. E não creio que esta ordem seja aleatória. Creio, aliás, que é intencional. E muito bem.

A este propósito, importa ter presente que o parque público de habitação é constituído por cerca de 120 mil fogos, a esmagadora maioria na posse dos municípios, o que representa, uns escassos 2% de todo o parque habitacional nacional. Mesmo com o financiamento do PRR, este parque público não vai aumentar significativamente, porque a principal aposta que está a ser desenvolvida pelos municípios é na reabilitação dos fogos já existentes, porque o seu estado de conservação e de eficiência energética assim o exige.

Por outro lado, creio ser consensual considerar que o Orçamento de Estado não chega para satisfazer todas as necessidades do nosso País que, aliás, tem sido legitimamente reivindicado por largos setores da sociedade portuguesa. Daqui se conclui que o parque público de habitação, mais direcionado para apoiar as famílias e indivíduos em situação mais vulnerável, não irá sofrer grande incremento nos próximos anos.

Portanto, resulta óbvio que só com a mobilização do investimento privado é possível recuperar os níveis de produção de casas a preços acessíveis para satisfazer as necessidades da população e contribuir para uma diminuição dos preços atuais da habitação.

Nos anos mais recentes, o nosso País já produziu cerca de 20 mil fogos anualmente, mas enquanto não for capaz de produzir algo semelhante a 100 mil fogos por ano, a crise habitacional vai continuar e os preços vão continuar a ser inacessíveis para muitas famílias portuguesas. Não tenhamos dúvidas disso.

Para isso, é importante estimular a adoção de medidas de incentivo ao investimento privado, designadamente fiscais, legislativas e de acesso ao financiamento.

É importante incrementar uma política fiscal mais justa, equilibrada e competitiva no domínio da habitação.

É importante simplificar e reduzir a excessiva morosidade dos processos de licenciamento.

É importante promover o acesso à concessão de financiamento, de médio e longo prazo, para a construção de habitação em regime de custos controlados.

Aliás, ainda recentemente o setor financeiro manifestou a sua disponibilidade e interesse em apoiar um “fortíssimo programa de construção habitacional em Portugal”, contribuindo para se resolver o problema do acesso à habitação.

Uma palavra também para o setor cooperativo que, à semelhança do seu contributo no passado, também, poderá ter novamente um papel de relevo num futuro próximo para o aumento do stock habitacional nacional.

Em suma, não tenhamos ilusões. A crise habitacional em que o nosso País está mergulhado não se resolverá de um dia para o outro. Mas, o diagnóstico está feito, as novas orientações das políticas públicas estão no caminho certo e, creio, que começa a ganhar consistência que o investimento privado é fundamental para aumentar a oferta de habitação a preços acessíveis para as famílias de rendimentos intermédios e, em particular, os mais jovens.

Mãos à obra!

Álvaro Santos

Especialista em Habitação e coautor do livro “Políticas Locais de Habitação”