Passos, o “troublemaker”


Mesmo que diga o que acham que disse sem o ter dito, Passos Coelho gera problemas sempre que fala.


Nota prévia: Nos discursos políticos discorre-se sobre economia, mas o foco é fluído. Nem sempre se percebe no que é que o Estado quer ser motor ou apoiar a iniciativa privada. A desgraça da Efacec é um exemplo. No quotidiano, fala-se em empresas, em clusters, no turismo e nas suas dezenas de variantes, na agricultura, nas empresas unicórnio, nas startups, nos eventos e nos concertos. No fundo, em tudo e “mais não sei quê” como diz o venerado bobo da corte. Também se fala das pescas. Mas, aí, ignora-se que as pescas são uma parte pequena da nossa maior riqueza: o Mar. O Mar que descobrimos e nos dá uma das maiores zonas económicas do mundo, uma plataforma gigantesca e um potencial invejável. O Mar é o nosso maior ativo. Para o explorar não é necessário destruir o seu universo e os seus ecossistemas, ao contrário do que alguns proclamam. O problema é que nós, portugueses, não sabemos como. Ao ponto de o ministro da Economia Costa Silva nem parecer ter entendido que tem a tutela do Mar, dado o muito que não fez. Desde o tempo em que Paulo Portas foi surpreendido no momento de uma posse com a incumbência do Mar, as coisas pouco ou nada mudaram. O nosso Mar é um achado para terceiros. Os imediatistas pensam que o Mar é só o porto de Sines, praias, pescas e atividades costeiras. Não imaginam que, no o dia em que virem a riqueza desperdiçada em que assentam, açorianos e madeirenses podem reclamar independência.

1. Com meia dúzia de palavras proferidas à porta de um tribunal, Passos Coelho gerou uma polémica política ao dizer que António Costa se demitiu por indecente e má figura. Foi curto e grosso. Deixou o PS à beira da apoplexia. Embora duras, as palavras de Passos justificam-se humanamente. Todos os dias, durante oito anos, foi destratado por António Costa e os socialistas, em uníssono, ao atribuírem-lhe a culpa das medidas de austeridade que impôs e que, parcialmente, resultaram de uma bancarrota criada pelo PS de Sócrates, ao qual quase todos os dirigentes e militantes socialistas (e não só) beijaram os pés durante anos. Houve, claro, gloriosas e honrosas exceções como a de um grande senhor chamado António José Seguro. No meio da confusão que as declarações de Passos geraram houve quem ouvisse o que ele não disse. Passos não referiu nenhum futuro acordo de governação entre o PSD e o Chega em termos concretos. Falou de o país precisar de um governo que que inverta uma degradação extraordinária de uma parte (…) das políticas públicas (para ele este charabiá deve significar privatizar tudo como se fez com a ANA, REN, EDP e os CTT, onde o Estado deixou de ganhar milhões). Sempre que Passos abre a boca há um rebuliço meio inventado na bolha político-mediática. O efeito afeta Luís Montenegro, obrigando os seus colaboradores e o próprio a saltarem para a rua e a darem explicações e esclarecimentos que não convêm. É até um erro político grave. Passos é Passos. Montenegro é Montenegro. Montenegro tem de se centrar numa perspetiva otimista e reformista e mostrar que não estamos condenados a ser desgovernados, como sucedeu no consulado de António Costa. Já Passos remete para o passado castigador e neoliberal. Tudo embrulhado num pessimismo descrente e militante que ele e um tal Vítor Gaspar aplicaram com deleite. Colar Montenegro a isso é matá-lo politicamente. O PS e a esquerda toda sabem-no bem. E Passos não o pode ignorar. Ele que tão bem geriu o silêncio devia manter essa postura. Inspirado manifestamente por Cavaco Silva e as suas súbitas e bombásticas aparições, Passos Coelho tenta mimetizar o ex-Presidente e ex-primeiro-ministro. Não tem, todavia, nem a sua autoridade nem, sobretudo, a sua preparação académica e política. E muito menos a sua obra.

2. Não admira, pelo que ficou escrito acima, que haja quem se mostre aberto a um entendimento futuro entre Passos e Ventura depois de algumas peripécias políticas. Esse cenário passaria por uma vitória de Pedro Nuno Santos sem maioria absoluta, um chumbo do seu governo minoritário socialista no parlamento, a que se seguiria a solução PSD/CDS/Chega (como no Xadrez há aqui muitas variantes possíveis para cada “experto” politólogo). Tudo partindo sempre do pressuposto de que Luís Montenegro seria coerente com duas afirmações que fez. Uma, inútil e suicidária, de que só formará governo se o PSD/CDS (formalmente coligados numa nova Aliança Democrática desde o dia 21) forem os mais votados. A outra (discutível, mas coerente politicamente) é que, ele, Luís Montenegro, não fará nenhum tipo de acordo com o Chega. Do ponto de vista da legitimidade democrática, um cenário PSD/Chega, com Passos e Ventura, poderia, então, surgir e seria inatacável. Mas iria irremediavelmente colocar questões complexas ao nível da paz social no país, também não sendo de digestão fácil para os sociais democratas moderados de centro esquerda. Logo veremos, sem nunca deixarmos de ter em conta que a realidade ultrapassa muitas vezes a ficção e que a palavra de honra também pode ir com o vento. Ou será Ventura a palavra certa?

3. O ambiente interno no Iniciativa Liberal é cada vez mais tenso. Rui Rocha mostra pouca flexibilidade com a ala mais moderada. Vai afastando gente ligada sobretudo a Carla Castro que lhe disputou a liderança. Rui Rocha tem adotado um tom mais próximo da rudeza de Ventura do que das intervenções educadas e subtis a que Cotrim de Figueiredo tinha habituado o país e um partido agora transformado num saco de gatos. O IL ainda pode aspirar a uns 4/5%, mas já está em perda. Não serão os seus cartazes humorísticos que o vão levar aos píncaros. Pode ainda contar com uma certa juventude empresarial e de quadros que se reveem mais no nome do que nas práticas, pois não é gente que olha para o quotidiano da política. No dia em que se verificar que o que ali se passa é igual ao pior do PSD e do PS será o fim do IL. Em toda a Europa onde atingiram dimensões interessantes ou assumiram pastas governativas os liberais desapareceram sem deixar rasto. Foi o caso da Inglaterra e da Alemanha. Por cá é uma questão de tempo.

4. Nem tudo na política é falta de elevação. A divergência e o relato da verdade de cada um pode também ser feito com elegância, algum rigor e inteligência irónica. António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa mostraram isso mesmo há uns dias quando o Governo foi apresentar cumprimentos ao Presidente a propósito da quadra festiva que vivemos. 

5. Uma nota curiosa: o caso das gémeas foi objeto de aberturas frenéticas de jornais televisivos e de manchetes, enquanto supostamente atingia o presidente Marcelo. Seguidamente, diminuiu de intensidade quando os alegados factos apontaram só para Nuno Rebelo de Sousa. Depois, as suspeitas de cunha envolveram o governo através de Lacerda Sales. Vai daí, o assunto foi desaparecendo, até porque os procedimentos globais não foram tão estranhos como se dizia inicialmente. Ele há cada uma! 

6. Os táxis, uns carros verdes e pretos que circulavam outrora pelas cidades em busca de cliente, estão agora parados nas suas zonas demarcadas. Em Lisboa, para arranjar um de passagem, depois das 22 horas, é preciso sorte. Ou, então, ligar e chamar, o que não tem a graça de estender o braço, de entrar e conversar ou mesmo levar com um inacreditável maldisposto. Hoje, o tempo é dos TVDE. Começou como coisa fina. Virou uma bandalheira. Gente do Indostão que guia como em Carachi ou Lahore. Não fala português. Não conhece a cidade. Orienta-se pelo telemóvel. Só Deus sabe se tem carta e se há seguros ativos. Ainda por cima, os seus carros estão sempre em movimento. Poluem imenso. Juntam as suas emissões às dos enormes transatlânticos que acostam na cidade. Intoxicam mais do que todos os outros. Mas depois os governantes queriam era tramar os donos dos carros mais antigos, através do IUC. Valeu a crise política e a chamada às urnas. Mas convinha impor regras aos TVDE e aos cruzeiros gigantescos. São bem-vindos, mas com maneiras…sem largar tantos gases.

 

Passos, o “troublemaker”


Mesmo que diga o que acham que disse sem o ter dito, Passos Coelho gera problemas sempre que fala.


Nota prévia: Nos discursos políticos discorre-se sobre economia, mas o foco é fluído. Nem sempre se percebe no que é que o Estado quer ser motor ou apoiar a iniciativa privada. A desgraça da Efacec é um exemplo. No quotidiano, fala-se em empresas, em clusters, no turismo e nas suas dezenas de variantes, na agricultura, nas empresas unicórnio, nas startups, nos eventos e nos concertos. No fundo, em tudo e “mais não sei quê” como diz o venerado bobo da corte. Também se fala das pescas. Mas, aí, ignora-se que as pescas são uma parte pequena da nossa maior riqueza: o Mar. O Mar que descobrimos e nos dá uma das maiores zonas económicas do mundo, uma plataforma gigantesca e um potencial invejável. O Mar é o nosso maior ativo. Para o explorar não é necessário destruir o seu universo e os seus ecossistemas, ao contrário do que alguns proclamam. O problema é que nós, portugueses, não sabemos como. Ao ponto de o ministro da Economia Costa Silva nem parecer ter entendido que tem a tutela do Mar, dado o muito que não fez. Desde o tempo em que Paulo Portas foi surpreendido no momento de uma posse com a incumbência do Mar, as coisas pouco ou nada mudaram. O nosso Mar é um achado para terceiros. Os imediatistas pensam que o Mar é só o porto de Sines, praias, pescas e atividades costeiras. Não imaginam que, no o dia em que virem a riqueza desperdiçada em que assentam, açorianos e madeirenses podem reclamar independência.

1. Com meia dúzia de palavras proferidas à porta de um tribunal, Passos Coelho gerou uma polémica política ao dizer que António Costa se demitiu por indecente e má figura. Foi curto e grosso. Deixou o PS à beira da apoplexia. Embora duras, as palavras de Passos justificam-se humanamente. Todos os dias, durante oito anos, foi destratado por António Costa e os socialistas, em uníssono, ao atribuírem-lhe a culpa das medidas de austeridade que impôs e que, parcialmente, resultaram de uma bancarrota criada pelo PS de Sócrates, ao qual quase todos os dirigentes e militantes socialistas (e não só) beijaram os pés durante anos. Houve, claro, gloriosas e honrosas exceções como a de um grande senhor chamado António José Seguro. No meio da confusão que as declarações de Passos geraram houve quem ouvisse o que ele não disse. Passos não referiu nenhum futuro acordo de governação entre o PSD e o Chega em termos concretos. Falou de o país precisar de um governo que que inverta uma degradação extraordinária de uma parte (…) das políticas públicas (para ele este charabiá deve significar privatizar tudo como se fez com a ANA, REN, EDP e os CTT, onde o Estado deixou de ganhar milhões). Sempre que Passos abre a boca há um rebuliço meio inventado na bolha político-mediática. O efeito afeta Luís Montenegro, obrigando os seus colaboradores e o próprio a saltarem para a rua e a darem explicações e esclarecimentos que não convêm. É até um erro político grave. Passos é Passos. Montenegro é Montenegro. Montenegro tem de se centrar numa perspetiva otimista e reformista e mostrar que não estamos condenados a ser desgovernados, como sucedeu no consulado de António Costa. Já Passos remete para o passado castigador e neoliberal. Tudo embrulhado num pessimismo descrente e militante que ele e um tal Vítor Gaspar aplicaram com deleite. Colar Montenegro a isso é matá-lo politicamente. O PS e a esquerda toda sabem-no bem. E Passos não o pode ignorar. Ele que tão bem geriu o silêncio devia manter essa postura. Inspirado manifestamente por Cavaco Silva e as suas súbitas e bombásticas aparições, Passos Coelho tenta mimetizar o ex-Presidente e ex-primeiro-ministro. Não tem, todavia, nem a sua autoridade nem, sobretudo, a sua preparação académica e política. E muito menos a sua obra.

2. Não admira, pelo que ficou escrito acima, que haja quem se mostre aberto a um entendimento futuro entre Passos e Ventura depois de algumas peripécias políticas. Esse cenário passaria por uma vitória de Pedro Nuno Santos sem maioria absoluta, um chumbo do seu governo minoritário socialista no parlamento, a que se seguiria a solução PSD/CDS/Chega (como no Xadrez há aqui muitas variantes possíveis para cada “experto” politólogo). Tudo partindo sempre do pressuposto de que Luís Montenegro seria coerente com duas afirmações que fez. Uma, inútil e suicidária, de que só formará governo se o PSD/CDS (formalmente coligados numa nova Aliança Democrática desde o dia 21) forem os mais votados. A outra (discutível, mas coerente politicamente) é que, ele, Luís Montenegro, não fará nenhum tipo de acordo com o Chega. Do ponto de vista da legitimidade democrática, um cenário PSD/Chega, com Passos e Ventura, poderia, então, surgir e seria inatacável. Mas iria irremediavelmente colocar questões complexas ao nível da paz social no país, também não sendo de digestão fácil para os sociais democratas moderados de centro esquerda. Logo veremos, sem nunca deixarmos de ter em conta que a realidade ultrapassa muitas vezes a ficção e que a palavra de honra também pode ir com o vento. Ou será Ventura a palavra certa?

3. O ambiente interno no Iniciativa Liberal é cada vez mais tenso. Rui Rocha mostra pouca flexibilidade com a ala mais moderada. Vai afastando gente ligada sobretudo a Carla Castro que lhe disputou a liderança. Rui Rocha tem adotado um tom mais próximo da rudeza de Ventura do que das intervenções educadas e subtis a que Cotrim de Figueiredo tinha habituado o país e um partido agora transformado num saco de gatos. O IL ainda pode aspirar a uns 4/5%, mas já está em perda. Não serão os seus cartazes humorísticos que o vão levar aos píncaros. Pode ainda contar com uma certa juventude empresarial e de quadros que se reveem mais no nome do que nas práticas, pois não é gente que olha para o quotidiano da política. No dia em que se verificar que o que ali se passa é igual ao pior do PSD e do PS será o fim do IL. Em toda a Europa onde atingiram dimensões interessantes ou assumiram pastas governativas os liberais desapareceram sem deixar rasto. Foi o caso da Inglaterra e da Alemanha. Por cá é uma questão de tempo.

4. Nem tudo na política é falta de elevação. A divergência e o relato da verdade de cada um pode também ser feito com elegância, algum rigor e inteligência irónica. António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa mostraram isso mesmo há uns dias quando o Governo foi apresentar cumprimentos ao Presidente a propósito da quadra festiva que vivemos. 

5. Uma nota curiosa: o caso das gémeas foi objeto de aberturas frenéticas de jornais televisivos e de manchetes, enquanto supostamente atingia o presidente Marcelo. Seguidamente, diminuiu de intensidade quando os alegados factos apontaram só para Nuno Rebelo de Sousa. Depois, as suspeitas de cunha envolveram o governo através de Lacerda Sales. Vai daí, o assunto foi desaparecendo, até porque os procedimentos globais não foram tão estranhos como se dizia inicialmente. Ele há cada uma! 

6. Os táxis, uns carros verdes e pretos que circulavam outrora pelas cidades em busca de cliente, estão agora parados nas suas zonas demarcadas. Em Lisboa, para arranjar um de passagem, depois das 22 horas, é preciso sorte. Ou, então, ligar e chamar, o que não tem a graça de estender o braço, de entrar e conversar ou mesmo levar com um inacreditável maldisposto. Hoje, o tempo é dos TVDE. Começou como coisa fina. Virou uma bandalheira. Gente do Indostão que guia como em Carachi ou Lahore. Não fala português. Não conhece a cidade. Orienta-se pelo telemóvel. Só Deus sabe se tem carta e se há seguros ativos. Ainda por cima, os seus carros estão sempre em movimento. Poluem imenso. Juntam as suas emissões às dos enormes transatlânticos que acostam na cidade. Intoxicam mais do que todos os outros. Mas depois os governantes queriam era tramar os donos dos carros mais antigos, através do IUC. Valeu a crise política e a chamada às urnas. Mas convinha impor regras aos TVDE e aos cruzeiros gigantescos. São bem-vindos, mas com maneiras…sem largar tantos gases.