André Ventura. “Se houver impasse à direita, Passos Coelho pode ser importante”

André Ventura. “Se houver impasse à direita, Passos Coelho pode ser importante”


André Ventura não tem dúvidas, o  PSD só poderá formar governo com o Chega e, se não o fizer, é uma ‘total irresponsabilidade’. Pedro Passos Coelho é o homem que Ventura espera que possa fazer a ponte à direita.


Pedro Sanchez , líder do PSOE, apesar de ter perdido as eleições, consegue voltar a formar Governo numa coligação contranatura, com partidos radicais e outros de direita, impedindo que a coligação PP/VOX chegue ao poder. Teme que um cenário desses venha a ser realidade em Portugal depois de 10 de março?

É sempre uma possibilidade. Nós nunca devemos pensar que os socialistas são derrotados facilmente. É o que está a acontecer. Espanha é um bom exemplo disso. Toda a gente, todos os analistas, todos os setores políticos davam como certa a derrota do PSOE, depois dos anos de desgaste que teve, aliás, muito semelhante ao cenário do Partido Socialista português. As sondagens mostravam uma clara maioria de direita, fosse com o PP sozinho, fosse com o Vox. E, de repente, o cenário não se concretiza. Espero que a direita tenha aprendido com o que correu mal em Espanha. 

E o que foi que correu mal?

A incapacidade de mostrar às pessoas que haverá uma alternativa.  

Mas a verdade é que esta coligação estranhíssima que se está a dar em Espanha tem o apoio de alguns partidos de direita…

Sim, a coligação Canárias.

E o Partido Nacionalista Basco, que é de direita, mas nem um nem outro se quiseram associar ao PP por causa do VOX?

Certo. Mas, repare, nós em política temos de ter a noção de quais são os vetores fundamentais… e há momentos na história em que estamos nesses vetores fundamentais. Em Portugal, para fazer um paralelismo, há dois partidos – e isto não é nenhum menosprezo pela Iniciativa Liberal, mas as sondagens mostram isso –, há dois partidos que podem fazer uma maioria de direita, PSD e Chega.

O Chega pode atingir que percentagem?

 Eu acho que o aumento do grupo parlamentar seria uma vitória. As sondagens, neste momento, têm-nos colocado entre os 15% e os 20%, é o que as sondagens têm dito. Mas o que isto nos mostra é que há dois partidos que podem fazer essa maioria: PSD e Chega. Em Espanha, o que aconteceu foi que o PP esteve mais preocupado em ir buscar votos ao VOX do que ao Partido Socialista. Resultado, o Partido Socialista teve a capacidade, com outros partidos à esquerda, de formar uma maioria.

Mas não é só à esquerda, esse é que é o tema?

Mas os outros são pouco significativos, é isso que eu estou a dizer. 

Mas teriam bastado para o PP poder ter chegado ao Governo, e a verdade é que recusaram. 

Mas nós nunca podemos… repare, se o PAN pode vir a fazer a diferença aqui com um deputado? Poder pode, é a magia dos números, não é?  Mas o problema está a jusante, quando a direita não diz ao seu eleitorado votem em nós que nós temos uma alternativa. Quando dizemos votem em nós, mas nós não sabemos que alternativa é que vamos ter, muita gente que gosta do Chega ou do PSD pensa assim: mas vou votar neles para quê? Há uma necessidade de dizer às pessoas que, aconteça o que acontecer, estamos prontos para governar e para ser alternativa. Não o temos feito por culpa do PSD.

Mas o líder do PSD já disse que convosco não faz acordo!

Mas o Miguel Albuquerque também tinha dito que sem maioria absoluta se ia embora e ainda lá está. O que eu acredito é que a direita não será tão insensata que permita ao PS governar. Se a direita tiver maioria, quero acreditar que não estamos ainda nesse nível de insanidade. 

Mas ainda que a direita tenha maioria, o cenário provável neste momento é PSD e IL juntarem-se e deixarem o Chega de fora. Aí, o que é que o Chega faz?

Mas aí a IL junta-se para quê? Não serve de nada, se o PSD é um Governo minoritário vai meter a IL para quê? Ou o CDS, ou outro partido? Por que razão o PSD iria fazer isso?

Mas, mesmo assim, se houver acordo de governo ou entendimento parlamentar que não vos inclua, o que faz o Chega?

Imagine que 17%, ou 18% das pessoas votam em nós. Acha que nós podemos aceitar que algum partido diga: nós não queremos saber do eleitorado, nós vamos fazer o que entendermos? Vamos arriscar e logo se vê o que é que acontece? Isto é o cúmulo da irresponsabilidade! É o cúmulo da irresponsabilidade deixar que o Partido Socialista volte. Mas não nos cabe a nós, cabe ao PSD. A política não é a arte do que nós queremos, é a arte do possível. Eles não gostam do Chega, não gostam do André Ventura, mas é o que existe. Eu não vou desaparecer por magia até ao dia que 10 de março, o Chega também não, as sondagens mostram que 95% do eleitorado do Chega é fiel, não vai mudar de sentido de voto. Nós temos aqui duas hipóteses: uma de responsabilidade – vai haver um Governo de direita –; e uma de total irresponsabilidade – não vai haver Governo nenhum à direita. O Presidente da República fará o que entender.

Mas não se sente responsabilizado se isso acontecer?

Nunca, nunca. Porque estou a dizer aqui, e agora, que nós sempre estivemos disponíveis para uma alternativa, não posso ser responsabilizado.

Quais são as suas condições para apoiar um Governo de direita, é indispensável irem para o Governo? Um acordo parlamentar? Há outro tipo de entendimentos que se possam fazer?

Ou há uma alternativa formada ou não há nenhuma outra espécie de acordo.

O que é que isso quer dizer? 

É um Governo alternativo. Uma alternativa que diga que estamos prontos para ser Governo, para tirar o PS do Governo. É a única hipótese, se não, é caso a caso, lei a lei.

O mesmo que com um Governo do Partido Socialista?

Há uma coisa que é certa, nós nunca votaremos nenhum orçamento do Partido Socialista, nem abstenção.

E do PSD, admitem votar?  

Do PSD depende do tipo de orçamento que for. Não vou estar a dizer que as portas são completamente encerradas, mas, se não houver acordo, a probabilidade de o Governo não passar no programa do primeiro dia, ou do segundo, é elevada. E, portanto, eu apelo à responsabilidade de todos neste processo, todo o país está de olhos postos em nós.

Ouviu aquelas palavras de Pedro Passos Coelho no auge da crise, no fundo a dar conforto à presença do Chega na realidade política nacional?

Eu não acho que Pedro Passos Coelho tenha querido dar conforto ao Chega. Eu acho que ele disse o óbvio. Disse que o Chega não é um partido antidemocrático.

Uma figura como Pedro Passos Coelho, num cenário pós-eleitoral em que o diálogo estivesse difícil, poderia ajudar a facilitar um entendimento com o PSD? 

Toda a gente sabe que se há um elemento em comum entre mim e o Luís Montenegro é o Pedro Passos Coelho.

Portanto, pode ser um mediador nessas negociações? 

É uma pessoa que tem prestígio para isso, tem credibilidade para isso, tem os conhecimentos para isso, tem experiência. Foi primeiro-ministro. Imagine que se chegava a um bloqueio, vamos imaginar que se chega ao impasse total, não há maioria à esquerda, também não há à direita. O Presidente não sabe o que fazer, está de frente com um Governo minoritário, há o risco de novas eleições três meses depois. Ninguém quer isso. Pedro Passos Coelho podia ser uma figura importante nesse momento, poderia vir a desempenhar um papel importante. Mas há outras figuras também que eu tenho ouvido. Miguel Relvas, ouvi-o defender que devia haver um maior entendimento.

Tem falado muito do Presidente da República, um dos temas que se comenta é que Marcelo Rebelo de Sousa não quer ficar com o legado de deixar o Chega no poder? 

Eu acho que uma coisa são as opiniões, outra coisa é quando assume o seu papel institucional. Eu pedi-lhe uma reunião num determinado momento de crise e perguntei: Senhor Presidente, da sua parte, haveria ou não um veto político a um Governo em que o Chega ou liderasse ou fizesse parte? E o Presidente transmitiu-me que não, e disse: tal como permiti que nos Açores se constituíssem como apoiantes do Governo, permitiria o mesmo no Continente.

No caso de o Chega ter de fazer um acordo de Governo, o que vão colocar como obrigatório na negociação?  —
A reforma da Justiça, para nós é prioritária. O que aconteceu mostra bem isso. A reforma penal, porque as penas são muito baixas em Portugal, mas isso é apenas uma pequena parte…

Colocaria como exigência a questão da pena perpétua? 

A  nós parece-nos um elemento importante. Agora, não dizemos ou há prisão perpétua ou não há Governo, é evidente, nós somos responsáveis. Mas o que para nós é decisivo e fundamental é que os tribunais têm de ter meios, o Ministério Público tem de ter meios, a Polícia Judiciária tem de ter meios. Mas também a necessidade que temos de retirar a influência do processo político sobre instâncias judiciais. E aqui refiro-me ao Tribunal Constitucional e às nomeações nos setores superiores da Justiça, onde é importante garantir que eles têm autonomia e que efetivamente não se coíbem ou inibem de investigar aqueles que os nomearam.

E para além da reforma da Justiça?

A reforma da Segurança Social. E aqui admito que vamos ter problemas na negociação, porque para nós tem de haver uma cultura de mais apoio a quem precisa, mas de menos subsidiodependência, tal como fizemos nos Açores. Há uma exigência de que quem esteja a viver permanentemente de subsídios o deixe de fazer. E, se tiver capacidade para trabalhar, que trabalhe. Nomeadamente, criando a possibilidade de que quem recebe os rendimentos de inserção, se tiver condições para isso, poder contribuir para a comunidade.

Mas só isso não dá sustentabilidade à Segurança Social.

Não, é evidente que a questão das pensões é outra exigência para nós. Nós ficámos marcados com o corte nas pensões. Nós todos, a direita. Por todo o país encontro pessoas que dizem: gosto muito de si mas vocês, a direita, cortaram pensões. Nós não podemos cortar pensões. Há pessoas que ganham 400 € e 500 €.

Mas acha que isso está em cima da mesa?

Não sei. Eu espero que não esteja em cima da mesa, porque, se está, nós não estamos, é uma linha vermelha. E atenção, isto não é por votos, é porque nós temos as pensões mais baixas da Europa e temos um sistema contributivo absolutamente deficitário. Temos pensionistas que encontramos todos os dias que têm de escolher entre comprar medicamentos ou comida. Isto é inaceitável num país como o nosso. Portanto, se tiver de ir buscar à banca e a banca ficar um bocadinho pior, ou aos fundos de investimento, e eles ficarem um bocadinho piores, antes isso do que ter pensionistas a terem de escolher entre comer e ter medicamentos. Este é o chip que a direita não conseguiu enraizar e eu espero que enraíze nas próximas eleições.

E mais? 

Uma coisa que para nós é decisiva é a agricultura. Nós não temos uma estratégia nem para a água, nem para a seca, nem para a proteção dos pequenos agricultores.  E finalmente a imigração. Eu quero ser muito claro neste ponto. Eu nunca disse que nós vamos expulsar imigrantes a torto e a direito. Nunca disse que nós somos contra a imigração. Nós queremos que os imigrantes que venham, venham para trabalhar, venham por bem, cumpram as leis. Entendemos, porém, que este regime absurdo de abertura a toda a gente, sem controlo nenhum, tem dado resultados trágicos. E o que vamos propor é uma política de quotas de imigração para os setores chave. E estes setores chave, como a agricultura, como hotelaria e o turismo, como as tecnológicas, etc., são acompanhados de fatores de controlo. Quando digo fatores de controlo, é um controlo e escrutínio.

Que só pode entrar quem tenha contrato? 

Isso e, mesmo com contrato, que tenha sido feito um check prévio. Nós ficámos todos surpreendidos por saber que o tipo que matou os suecos na Bélgica tinha estado na Guarda e na Covilhã. Eu não fiquei nada surpreendido, porque hoje tudo passa por Portugal.  Tudo o que não interessa passa por Portugal. Nós já tivemos cá esses tipos, tivemos cá terroristas a receber subsídios da Segurança Social, foram depois presos em França, ligados a atos terroristas. Isto não só nos envergonha como é um risco real que estamos a correr. Nós já passámos em muito 1 milhão de estrangeiros a residir em Portugal, é mais de 10% da população. Se continuamos com as portas abertas, isto é uma bomba relógio que nos vai explodir em cima.

Isso não é muito diferente do que defende o PSD?

Olhe, eu vou dar um exemplo, nós defendemos que este regime aberto da CPLP não faz nenhum sentido, por uma razão, são 300 e tal milhões de pessoas que vêm para cá basta quererem. Chegam cá e dizem que estão à procura de trabalho e ficam cá. Por isso é que a União Europeia nos abriu um processo.

Não acha que acabar com isso nos dificulta muito também a nossa participação na CPLP? 

Não, porque nunca, em caso algum, Portugal, que é o país europeu da CPLP, pode, até pelos compromissos europeus que tem, ter um regime deste tipo. E, aliás, o processo está em curso. Vamos ver quais são as conclusões, mas parece-me evidente que Portugal está a servir não só como porta de entrada para muitas dessas pessoas, para outros países da Europa, como o caso da Alemanha ou até de França, como poderá tornar-se um país que recebe centenas de milhares de pessoas e não tem condições para as receber. Nós vamos perceber em que condições estão os que vieram e vamos, sobretudo para o futuro, impedir que continuem a chegar a esta velocidade, e garantir que são escrutinados.

Como avalia a situação política atual, precipitada por um processo que, para alguns, parece menos grave do que inicialmente o Ministério Público fez parecer? Se, afinal, e como afirma o juiz de instrução, os principais indícios não forem sólidos?

 Não seria, não seria positivo. Eu espero, pelo menos, que o Ministério Público faça aqui um trabalho sólido, independentemente de depois haver condenados ou não. Porque, se eles não são culpados, eu não quero que sejam condenados por isso. Quero é que me mostre as provas que têm com solidez. Relembro que este é só um elemento, o Data Center, ainda há a questão do lítio e do hidrogénio e, portanto, vamos ver o que é que isto tem primeiro, e depois fazer a avaliação, em vez de entrarmos num ataque à Justiça que parece o caso Casa Pia de Lisboa. E isso é que me preocupou mais na declaração do primeiro-ministro. Eu sempre achei que políticos envolvidos em processos a primeira coisa que têm de fazer é dar explicações – pouco me importa se são arguidos, acusados, importa dar uma explicação. E eu esperava que fosse isso que António Costa fosse fazer. E, quando vi que ele ia falar, pensei: vai-nos explicar.

E achou bem que o tivesse feito na Residência Oficial do primeiro-ministro?

Eu acho que sim, porque ele está envolvido como primeiro-ministro e, portanto, esperei que viesse dizer isto é falso, isto nunca aconteceu, esta é a minha versão. Mas o que fez foi um ataque à Justiça. É incrível querer passar a ideia de que o Ministério Público estava a atuar para condicionar o investimento estrangeiro em Portugal, quando ele sabe perfeitamente que o que está em causa são pressões a autarcas para mudar, para contornar a lei e a influência sobre ministros para levarem a cabo políticas ilegais, atos ilícitos, isso está na indiciação. António Costa é jurista, ele foi ministro da Justiça, ele não tem a desculpa que outros têm. Ele sabe bem o que é que eu estou a dizer e, portanto, ele não fez muito diferente do que fez Ferro Rodrigues, no caso Casa Pia, e do que fez José Sócrates…

O próprio António Costa também teve uma intervenção no processo Casa Pia…

Portanto, só me dá razão. No último debate que tive com ele na RTP, antes das legislativas, ele atacou-me com várias coisas, é o normal em política. E, no fim, ele teve azar e ficou sem tempo, e  disse-lhe: apesar de ter sido ministro da Justiça, o seu currículo na Justiça não é muito bom. Eu sei que foi ministro, mas está pelo YouTube todo. Basta ir lá e ouvir o que o senhor tentou fazer no processo Casa Pia, perseguindo pessoas, desvalorizando a Justiça, procurando condicionar o Ministério Público, você não tem currículo. Mas pensei que isso tinha passado, afinal, este António Costa é o mesmo do processo Casa Pia de Lisboa, não perdem estes vícios antigos de ir atrás da Justiça. Nós não vamos fazer disto campanha.

Vão usar isto para campanha?

Não, nós não fazemos política em cima destes casos. Mas vou recordar aos portugueses que há em Portugal um partido que não perde o vício de condicionar a Justiça, o Partido Socialista.

E não vão falar das acusações de corrupção e tráfico de influências?

Repare, nós primeiro vamos conhecer melhor os factos. No processo de justiça, a única coisa que podemos saber é o que é que está em causa. E também já sabemos algumas coisas, que estavam 75.000 € ou 80.000€ em garrafas de vinho e em livros. É uma questão de prestígio das instituições. Nós, como políticos, temos que dizer às pessoas, dar um esclarecimento e a única coisa que eu ouvi foi: peço desculpa pelo dinheiro que estava em caixas de vinho e livros no meu gabinete. Isto não é a forma de fazer política. E, portanto, António Costa prestou um péssimo serviço ao seu país. E eu até tenho pena que ele continue. António Costa já devia ter ido embora e devia ter permitido ser substituído, nestes últimos meses, por outra figura qualquer.