Nota prévia: A questão da contratação de estrangeiros para as Forças Armadas está colocada ao nível da vinda de futebolistas para a seleção. É também pretexto para supostas divergências entre o PS e a ministra da Defesa Nacional. Como disse há dias Manuela Ferreira Leite, parece um balão de ensaio para medir as reações a esta hipótese. Verdadeiramente útil seria importarmos ministros estrangeiros. Por exemplo dinamarqueses, suecos ou alemães, oriundos de países que funcionam. Se calhar era útil inscrever um ponto sobre importação de políticos no Conselho de Estado de hoje.
1. Com uma resposta de menos de um minuto, em que admitiu a hipótese de avançar para Belém se achar útil e houver condições, Luís Marques Mendes virou o jogo das presidenciais a seu favor, sem se declarar candidato. Só isso mostra uma rara capacidade de gerir o “timing político”. Mendes vinha do Pontal onde, dias antes, partilhou o palco com Montenegro e com Moedas, que não aspiram a Belém. Quem lá esteve relata que a recetividade do povo laranja ao antigo líder e comentador mais mediático do país (são cerca de um milhão de espetadores semanais) foi carinhosa e estimulante. Marques Mendes, por mais críticas que possa fazer ao partido quando entende, é uma referência no PSD e no eleitorado moderado, que vai do CDS ao PS, o qual está órfão de candidatos que não sejam extremistas recauchutados. O primeiro passo de uma candidatura vitoriosa a Belém é assegurar o apoio ou condicionamento estratégico do PSD ou do PS. Por isso, tirando Eanes, todos os Presidentes eleitos vieram de um desses partidos. E precisaram sempre do seu apoio ou beneplácito. Até Marcelo teve a boleia informal do PSD e a ajuda do PS, que praticamente não apareceu na sua primeira eleição. Luís Marques Mendes pode agora gerir a sua intervenção pública mais à vontade, desde logo porque não há razões para ser interpelado sobre a candidatura por qualquer jornalista que encontre. Ficou tudo dito por um tempo e o território foi marcado. Os outros putativos candidatos é que ficam na berlinda. Sobretudo os do mesmo quadrante. Santana Lopes, um presidenciável pelo percurso e o perfil, é dentro do mesmo espaço um dos poucos que podem aspirar a Belém, mas dificilmente contará agora com o PSD, de onde saiu para formar a Aliança. Tem por ele algo que lembra Soares, naquele sentido em que só é derrotado quem desiste de lutar. Quanto a Rui Rio, que gostaria de avançar, ficou sem chão. Já Barroso nunca quis Belém, tal como Passos Coelho. Há, claro, outras figuras que seriam grandes candidatos. É o caso de Leonor Beleza. É nessa área que também se movimenta Portas, mas o PSD jamais lhe perdoará as manchetes de O Independente e ter levado centenas de quilos de documentos do Ministério da Defesa. Isto num momento em que o SIS é chamado para interpelar um adjunto só porque não devolveu logo um computador de serviço. Além disso, o CDS de Portas é, para já, um pigmeu, abafado até pelo saco de gatos chamado Iniciativa Liberal. Portas integra a administração da Mota Engil, um grupo onde a China já controla 33% do capital. São, aliás, notadas as constantes referências à importância de Pequim que faz no seu Global da TVI (um candidato de interesses é uma mochila política pesada). No campo moderado, “les jeux sont faits” pelo menos por uns largos meses. Candeia que vai à frente alumia duas vezes, diz o povo na sua sabedoria centenária. Mendes está na “pole position” e adquiriu laboriosamente um estatuto raro, que não vem apenas da sua popularidade televisiva. Mesmo antes disso, preocupou-se com a proximidade a diversos quadrantes de pensamento e manteve contactos permanentes com o país real, que o acolhe com enorme simpatia. A baixa estatura é uma característica, mas nunca foi para ele um problema. Na política, tem um passado sólido. Foi um elemento fundamental dos governos de Cavaco, os mais reformistas que Portugal teve em 50 anos. Depois de perder a liderança do PSD, construiu uma vida profissional de sucesso e consolidou a imagem de homem de família. Horas depois da sua declaração na SIC, a candidatura cresceu como uma gigantesca bola de neve. Foi tema nos média e também nas conversas informais entre cidadãos (quem anda de transportes públicos e frequenta esplanadas e restaurantes para portugueses normais sabe isso). Contou ainda com o bónus de André Ventura saltar para se posicionar entre o que considera duas candidaturas tenebrosas: Mendes e Santos Silva. Ao ter razão em relação a um Santos Silva e a um PS sem espaço (só poderia ter Costa como candidato natural ou António José Seguro se quisesse alguém sério), Ventura deu um contributo notável a Mendes como representante do alargado espaço moderado. Não se via um jeito presidencial assim desde que Basílio Horta se candidatou pela direita contra a reeleição de Mário Soares. Na altura levou uma abada monumental. Hoje é um socialista católico. Será que Ventura está a trilhar o mesmo caminho? Seria injusto, a terminar, não citar Guterres. Mas só para repetir o que já se disse. O que levaria Guterres a deixar um lugar à frente de um mundo louco e vir para gestor de um manicómio?
2. Ao contrário do que alguns otimistas admitiam, a situação económica internacional voltou a degradar-se, parcialmente por causa da invasão da Ucrânia. O clima recessivo adensa-se para alegria dos antiamericanos e antieuropeístas. Muitos deles vivem neste espaço, denegrindo-o e exaltando russos, chineses, BRICS e até mesmo a inconcebível África onde a responsabilidade de tudo o que de mau acontece é atribuída ao Homem Branco. Na realidade quem lá manda hoje são os chineses. O caos mundial serve-lhes e evitam qualquer contaminação interna. Um dos permanentes antidemocráticos é o nosso PCP. Paulo Raimundo enche a boca de palavras de paz, desde que isso implique que a Ucrânia abdique da Crimeia, dos territórios invadidos por russos no Leste, de entrar para a União Europeia, de receber armamento de defesa NATO e que substitua Zelensky. Tirando isso tudo bem.
3. Em boa hora a plataforma “Participar+” anunciou a sua rentrée já para 18 de setembro. E logo com uma série de intervenções de notáveis em que sobressai Francisco Balsemão. Opositor ao chamado Estado Novo, Balsemão integrou a Ala Liberal antes do 25 de Abril, fundou o Expresso, a SIC e os seus múltiplos canais. Foi ministro de Sá Carneiro, primeiro-ministro, fundador do PSD e líder do Governo que negociou a revisão constitucional que, com Mário Soares, trouxe Portugal para uma democracia civil, extinguindo o Conselho da Revolução. Balsemão tem um testemunho único a dar sobre a sua vivência, política, jornalística e a sociedade portuguesa a cuja elite pertence. Esta iniciativa da “Participar +” destina-se a refletir sobre a fragilidade das instituições democráticas em Portugal. Terá mais três sessões em Setúbal, Aveiro e Porto. Vítor Ramalho e o Almirante Melo Gomes são membros fundadores e conseguiram também a adesão de palestrantes como a Provedora de Justiça, a cientista Prémio Pessoa Maria do Carmo Fonseca, além de Arlindo Oliveira, provavelmente o nosso melhor especialista em inteligência artificial.