Portugal integra a União Europeia, mas tem de definir as prioridades estratégicas que melhor garantam a competitividade das suas empresas e o conforto das famílias.
Primeiro definem-se as prioridades que interessam ao nosso país, para que depois os fundos europeus promovam o nosso crescimento económico.
O desempenho económico medíocre dos últimos 25 anos, apesar dos milhares de milhões de euros de fundos europeus recebidos, deriva da nossa falta de visão estratégica.
A energia é uma das principais áreas que carece dessa visão prévia.
Analisemos dois desenvolvimentos recentes de importantes vertentes da estratégia energética portuguesa:
1. – As Interligações energéticas entre os países da União Europeia
Como a situação da eletricidade é diferente da do gás natural, vejamos quais as interligações energéticas que são prioritárias para nós:
a) Gás Natural
Como Portugal não produz gás natural, a prioridade é a segurança do abastecimento e a utilização otimizada das infraestruturas logísticas.
Dispondo em Sines de um Terminal para gás liquefeito, e estando ligado por dois gasodutos a Espanha, que está por sua vez ligada à Argélia e a França, a situação de Portugal é confortável em termos de logística.
b) Eletricidade
Em relação à eletricidade, a situação de Portugal é mais complexa.
Desde logo porque produz eletricidade a partir de várias fontes: gás natural e diversas fontes renováveis.
Nos últimos 20 anos a aposta do governo português privilegiou duas potências renováveis intermitentes, solar e eólica, o que muito afeta a estabilidade do sistema elétrico e está na origem da Dívida Tarifária que ascende ainda hoje a 2.000 milhões de euros, e que está às costas dos consumidores…
Para se assegurar a estabilidade do fornecimento de eletricidade e evitar apagões, é necessário dispor de backups de “potencias firmes”, ou seja de potências baseadas em fontes armazenáveis que se podem utilizar sempre que seja necessário.
O problema é que temos instalados 7.000 MW de potências intermitentes, protegidas pelo regime contratual das FIT-Feed In Tariffs que permite expulsar do mercado a concorrência, quando o consumo em vazio é de apenas 4.000 MW. Pelo que as potências de apoio têm um funcionamento intermitente e muito caro.
O encerramento prematuro das centrais a carvão em 2021, veio agravar a dependência de Portugal relativamente ao gás natural e às importações diretas de eletricidade de Espanha.
Estas importações de de Espanha, que no mês de Outubro de 2022 atingiram 35% de todo o consumo, são indispensáveis para se evitarem apagões, pelo que o reforço das interligações elétricas entre a Península Ibérica e
França se torna urgente por motivos económicos e de segurança de abastecimento.
c) Prioridades para Portugal
Em termos de gás natural, o único investimento agora anunciado é um troço de gasoduto entre Celorico da Beira e Zamora.
Como este novo troço não traz benefícios para Portugal, é essencial confirmar que o respetivo custo será suportado por fundos europeus, para não agravar ainda mais a tarifa.
A nossa prioridade é o reforço das interligações elétricas entre a Península Ibérica e França.
O ponto 3 do comunicado da recente Cimeira França/Espanha/Portugal prevê a aceleração da nova conexão da Biscaia, mas é urgente conhecer a data prevista para a respetiva conclusão.
2 – O Apoio à Utilização Energética da Biomassa
A recolha e utilização dos excedentes de biomassa, nomeadamente no Interior Norte e Centro, é essencial para evitar a propagação dos incêndios rurais de Verão .
É de saudar a publicação no passado dia 3 de Novembro da Portaria 267/2022, que veio regulamentar o Decreto Lei 64/2017 para apoiar a construção de novas centrais térmicas a biomassa.
As potências baseadas em biomassa têm a dupla vantagem de serem renováveis e serem “firmes”, pois a sua armazenagem permite que a eletricidade esteja disponível quando é necessário.
Ao contrário das potências intermitentes, eólica e solar, que necessitam de centrais de backup para evitar apagões.
Contribuem além disso para evitar as quantidades brutais de CO2 que os grandes incêndios provocam, conferindo à floresta o seu papel essencial de sumidouro de carbono.
É assim muito desejável que o Decreto Lei 64/2017 possa rapidamente concretizar os objetivos que lhe estão na origem, para o que se avançam as seguintes sugestões:
a) Criar sistemas logísticos de recolha de biomassa nas zonas de maior densidade florestal, a fim de facilitar o abastecimento de matéria prima a estas novas centrais;
b) Flexibilizar parcerias público privadas entre as entidades municipais mencionadas no Decreto Lei e empresas que possam assegurar a indispensável capacidade técnica e de gestão, para a construção e a operação destas centrais.
É exatamente para alcançar estes objetivos que devem ser canalizados prioritariamente os recursos financeiros tanto do PRR como do novo Quadro Europeu 2030.
Assim o exige a coesão social do território e uma Democracia de Qualidade.
Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do Manifesto “Por uma Democracia de Qualidade”