Paris Saint-Germain. Paris é uma festa e uma feira de vaidades!

Paris Saint-Germain. Paris é uma festa e uma feira de vaidades!


Foi um dos grandes costureiros franceses, Daniel Hechter, que modernizou a imagem do clube que hoje recebe o Benfica para a Liga dos Campeões. E o lançou pelo caminhos da moda até que se veio a tornar um clube da moda.


Ernest Hemingway já estava morto quando a sua viúva resolveu publicar A Moveable Feast, um livro que foi traduzido para português com o título Paris é Uma Festa. Descrevendo a sua vida boémia na capital de França durante os anos-20, Ernest dá-nos a conhecer a panóplia de amigos que cultivou durante esse período, de Pablo Picasso a Ezra Pound, de F. Scott Fitzgerald a John Dos Passos, de James Joyce a Gertrude Stein. No fundo, é uma declaração de amor do escritor pela cidade.

Se não, veja-se: “Paris não tem fim, e as recordações das pessoas que lá tenham vivido são próprias, distintas umas das outras. Mais cedo ou mais tarde, não importa quem sejamos, não importa como o façamos, não importa que mudanças se tenham operado em nós ou na cidade, acabamos por regressar a ela. Paris vale sempre a pena e retribui tudo aquilo que lhe damos”. Finalmente, resume: “Existem apenas dois lugares no mundo onde se pode viver feliz: em casa e em Paris!”

Durante muitos anos dizia-se à boca cheia e escrevia-se por todo o lado que Paris não era uma cidade de futebol. Que havia demasiados entretenimentos para que o futebol pudesse ter popularidade. Enfim, em Paris ia-se ao Louvre e à Ópera, não à bola. Mas ninguém pode esquecer que além de capital de França, Paris é capital da moda.

Por isso, pouco tempo após a sua fundação (12 de Agosto de 1970), alimentada por cerca de 20 mil adeptos de futebol que exigiam que Paris tivesse um clube à dimensão da sua grandeza, um homem da moda, proprietário de várias lojas de roupa, assumiu a presidência: chamava-se Daniel Hechter e trouxe consigo para o PSG uma espécie de mascote, ou de figura representativa, o ator Jean Paul Belmondo, além de ter assinado contratos publicitários com a Le Coq Sportif e com a Canada Dry. Ninguém tinha dúvidas que o Paris Saint-Germain iria crescer, e muito.

Em 1975 já disputava a I Divisão francesa, correu o boato que iria contratar Johan Cruyff (jogou dois encontros do Torneio Internacional de Paris com essa camisola, o primeiro deles frente ao Sporting), e avançou decisivamente para a modernização da sua imagem que começara por ser absolutamente clássica: camisola vermelha, calções brancos e meias azuis com um emblema redondo representando um navio.

Torcendo o nariz Tudo isso era para Hechter de um conservadorismo insuportável. Contratou um realizador de cinema com experiência na área da publicidade para fazer aquilo que eles gostam de chamar de rebranding: Christian Lentretien. Foi ele que criou o novo emblema, com a Torre Eiffel estilizada, cabendo a Hechter a invenção de um equipamento fora do comum: “Eu não desenhei uma camisola de futebol, mas uma camisa. Uma coisa que todos podem admirar. Era algo bonito de olhar em campo”.

O seu fascínio pelo Ajax empurrou-o para aquela risca central a vermelho que tanto pode ser rodeada de azul como de branco. O azul e o vermelho são as cores oficiais da cidade de Paris, o branco representa Saint-Germain-en-Laye, subúrbio presente nas origens do PSG e que é bem explícito no nome.

Ainda hoje, o equipamento habitual do Paris Saint-Germain é conhecido pela “chemise Hechter” – foi estreada em novembro de 1973, no Parque dos Príncipes, num jogo amigável contra o rival e vizinho Red Star, entretanto caído em desgraça.

A Rádio Luxemburgo (RTL) tomou o lugar da Canada Dry no peito dos jogadores e procurou fazer uma revolução impactante. De um momento para o outro, o público de Paris tinha motivos para ir ao estádio. Ou era o Cosmos de Pelé que vinha para um particular – com pontapé de saída dado pela atriz Mireille Mathieu –, ou eram as negociações com Franz Beckenbauer, que não foram até ao fim, ou era o “maire” de Paris, Jacques Chirac, que se deixava envolver pelo entusiasmo geral e falava pelos cotovelos de um clube parisiense que congregasse todo os emblemas da capital numa “joint venture” verdadeiramente na moda.

Hechter meteu os pés pelas mãos, foi apanhado num esquema de burla de duplicação de bilhetes e passou uns tempos no xilindró. Os novos donos quiseram afastar-se da sua imagem. O Paris Saint-Germain optou por jogar com camisolas brancas, às vezes com uns vivos laterais. Foi de branco que se tornou pela primeira vez campeão de França em 1986. Podia não estar vestido à moda, mas era já o clube da moda. E Paris continuava a ser uma festa.