A novela Para Sempre, em exibição na TVI, está a ser alvo de polémica. Em causa está uma frase dita por Alcino Parracho, personagem de Rui Melo, numa cena que evidencia a ‘guerra’ existente entre duas localidades: Soajo (em Arcos de Valdevez) e Castro Laboreiro (em Melgaço).
Numa altura em que são roubados alguns bens de uma quermesse, o ator diz: “Foram aqueles bandalhos de Castro Laboreiro, isto é perseguição deles, como sempre”. E acrescenta: “Esses manhosos querem-nos roubar as festas, como roubaram os animais”.
As frases não caíram bem junto da população. “Foi uma vergonha de todo o tamanho, um insulto para as gentes de Castro Laboreiro”, diz ao i um habitante da freguesia. “Espero que [a TVI] peça desculpa e mais alguma coisa. Mas acho que está alguém a tratar disso. O Município de Melgaço vai tratar disso. A população está revoltada e com toda a razão. E, do que ouço, sei que toda a gente está descontente”, acrescenta o habitante, manifestamente insatisfeito com a cena da telenovela.
E não é o único. Uma outra habitante desta freguesia começa por dizer ao i que “como castreira que é”, sentiu-se “ofendida”. “Percebo que é ficção, que é uma novela, toda a gente percebe isso, mas eles, no meu entender, tinham que ter utilizado outro nome, não tinham por que ter utilizado o nome de Castro Laboreiro”, defende ao nosso jornal.
Esta habitante não tem dúvidas de que a cena estará relacionada com o cão de raça Castro Laboreiro: “Até podiam falar na história do cão, que já vem de há muito tempo atrás. Há um senhor em Soajo que diz que o cão de Castro foi roubado à aldeia do Soajo e que nós nos apropriamos. Isto está registado, há muitos anos que os cães de Castro são cães de Castro Laboreiro”, reitera. E não tem dúvidas: “Como habitante de Castro Laboreiro, castreira que sou, nascida e criada aqui, senti-me ofendida pela maneira como se referiram às pessoas de Castro”.
Questionada sobre se a cena poderá manchar a imagem da região, diz apenas que pode acontecer mas apenas para as pessoas que não conhecem a zona. “Quem conhece Castro Laboreiro e as gentes de Castro, sabe que isso é mentira. Mas mesmo assim fica feio. Não sei quem teve a ideia de meter aquilo na novela mas aí, tanto culpa teve quem falou sobre o assunto, como quem apanhou a ideia e a colocou na novela, e como o diretor da novela ou da televisão que aceitou”, defende.
Garantindo sentir-se ofendida, diz que a população espera agora um pedido de desculpas por parte da estação que Queluz.
Esta habitante conta ainda que este domingo, dia 8, haverá uma reunião na Junta de Freguesia de Castro Laboreiro, onde toda a população é convidada a falar sobre esta polémica. “Vamos ver o que se pode fazer”, diz.
E conclui: “Esperamos, pelo menos um pedido de desculpas público pela forma como se dirigiram à população de Castro Laboreiro. Aqui ninguém é bandalho, nem ladrões”, apesar de confessar que, embora esta seja a opinião da maior parte da população da freguesia, pelo concelho de Melgaço haverá muitas pessoas que não pensem da mesma forma.
‘Desconhecimento’ e ‘ignorância’
Entretanto, foi apresentada na última Assembleia Municipal, no passado sábado, uma moção apresentada pelo grupo parlamentar do PS e aprovada por unanimidade a este episódio.
“A cena em causa, interpretada por diversas personagens, decorre de um diálogo que ocorre numa mercearia fictícia localizada na vila do Soajo, onde os habitantes de Castro Laboreiro são acusados do furto de uma viatura e onde, para além do mais, são apelidados de “ladrões”, “bandalhos”, “manhosos”, entre outros epítetos, e onde é feita a insinuação de que a raça do cão de Castro Laboreiro resulta de uma apropriação ilegítima dos cães Sabujos da Serra do Soajo”, diz a Assembleia Municipal em comunicado, lembrando que, embora se trate de ficção “desconhecem-se os motivos do autor do texto / guionista ou o conhecimento que o mesmo tem sobre a história e cultura castrejas”.
“O certo, porém, é que o contexto, o tom e o conteúdo dos referidos diálogos, para além de relevarem um profundo desconhecimento e ignorância da cultura de Castro Laboreiro, atentam contra os mais básicos princípios de ética e de respeito por uma comunidade com uma história e tradição ímpares da nossa cultura e território”, dizem.
No que diz respeito à história do cão, defendem: “A origem e características do cão de Castro Laboreiro e do cão Sabujo são totalmente distintas, possuindo características genéticas, morfológicas e funcionais que não admitem qualquer controvérsia ou erro de identificação”.
Falando em “desconhecimento, ignorância ou algum propósito difamatório”, Melgaço diz que os diálogos deste episódio da telenovela “constituem uma ofensa grave à tradição e cultura de Castro Laboreiro, afetando o bom nome e reputação das suas gentes”, defendendo ainda que o conteúdo “distorce, de modo grave, a origem, classificação e reconhecimento público da raça canina do cão de Castro Laboreiro”.
E garantem que, tal como contado ao i, foi criada uma onda de indignação na população.
Assim, a Assembleia Municipal de Melgaço repudia a cena, e pede que a TVI “emita um comunicado público a repudiar a cena televisiva em causa”.