As playlists de Adão e Silva. Podemos mesmo confiar num fã de Lana del Rey?

As playlists de Adão e Silva. Podemos mesmo confiar num fã de Lana del Rey?


Com Pedro Adão e Silva a assumir a pasta de ministro da Cultura, nada melhor que analisar as suas playlists para perceber melhor a sua personalidade e como poderá ser o seu mandato.


Um dos principais ensinamentos que podemos retirar da internet é que as playlists que criamos no Spotify dizem muito sobre a nossa personalidade e se isso está escrito na internet é porque é verdade.

Depois da desilusão que foram as playlists das legislativas, com algumas escolhas previsíveis e aborrecidas, eis que somos surpreendidos por um autêntico melómano que conta com 32(!) playlists diferentes, Pedro Adão e Silva, o novo ministro da Cultura.

As listas de música do ex-militante do PS são organizadas, na sua maioria, por estação do ano, com forte destaque para as estações mais frias.

Em “when the north wind blows” (playlist do inverno de 2021), Adão e Silva explora faixas melancólicas de autores como Scott Walker, Nick Cave, George Harrison ou bandas como Wilco, levantando a questão se o ministro esteve a passar uma fase mais negativa devido ao isolamento da pandemia ou se esteve a recordar um desamor de liceu sentado em frente à sua lareira enquanto ouvia a Stuck on the puzzle de Alex Turner, música que o vocalista dos Arctic Monkeys fez para o filme preferido de todos os hipsters que frequentaram o ensino secundário durante 2010.

Mas analisar as seleções musicais do ministro não é apenas encontrar o som da escuridão (apesar da presença de playlists dedicadas a artistas mortos, “the dead do not improve”, ilustrada com uma imagem do grande David Berman, falecido vocalista dos Silver Jews, ou “Forgotten eyes”, playlist que rouba o nome a uma música dos Big Thief), também encontramos sons mais animados em “verão azul”, playlist do verão de 2021, que, não deixa claro se a inspiração foi a música de 2006 dos D’ZRT.

Contudo, entre ritmos de bossa nova, com músicos como Tim Maia ou Milton Nascimento, ou de uma eletrónica descontraída, na música Road Of the Lonely Ones do produtor Madlib, lançada no ano passado, deparamo-nos com esta omnipresente melancolia da vida de Adão e Silva, com a música Little Girl dos Spiritualized, que abre com a frase “sometimes i wish i was dead”.

A encerrar “verão azul” está Inatel de David e Miguel, duo português composto pelo produtor David Bruno e o rapper Mike El Nite, apenas um dos vários exemplos de artistas nacionais que figuram nestas listas, onde também encontramos Bruno Pernadas, Filipe Sambado, Capitão Fausto ou Mário Laginha, alguns dos nomes a apontar para o caso do dia em que seja preciso criar a pasta dos avençados do Ministério da Cultura.

Uma das caraterísticas que mais despertam a atenção é sem dúvida a diversidade de estilos, eis que chegamos a “a evolução do hip-hop”. Neste espaço, Adão e Silva revela os músculos do seu conhecimento de hip-hop e prova o seu pedigree enquanto o verdadeiro OG do Parlamento, ao partilhar as barras mais fortes de artistas que foram percussores deste estilo, como A Tribe Called Quest, Wu-Tang Clan, Nas, De La Soul, Mobb Deep, 2Pac, Ice Cube ou Ms. Lauryn Hill, até aos mais contemporâneos como Danny Brown, Kanye West, Kendrick Lamar ou Drake.

Algo que se destaca é a presença de artistas do sexo feminino, que surgem em maior destaque do que nos cartazes de quase todos os festivais. 

Se em “ladies in satin”, o novo ministro da Cultura aproveitou para homenagear vozes lendárias como Billie Holiday, Nina Simone ou Ella Fitzgerald, uma das descobertas mais fascinantes surge na acima citada playlist do inverno de 2021, com a inclusão de três faixas de Taylor Swift.

Este é daqueles momentos que nos fazem pousar tudo e colocar as questões que realmente importam: não, não estou interessado em saber se o ministro vai ou não continuar com a responsabilidade de organizar as celebrações do 25 de abril. Quero é saber se o novo ministro da cultura, Pedro Adão e Silva, é um swiftie?

Nas redes sociais, especialmente no Twitter, não tardaram os elogios ao conhecimento e preferências musicais do ministro. Não serão todos os parlamentos do mundo que encontram um ministro adepto da poesia de Stephen Malkmus e do seu trabalho nos Pavement, mas é importante mencionar que existem algumas “red flags”, como a presença de Lana del Rey em inúmeras playlists, nomeadamente, em “autumn town leaves”, a faixa Arcadia, um “deep cut” da discografia da cantora de que, honestamente, nunca tinha ouvido falar antes.

Não existe problema nenhum em gostar de Lana Del Rey, sou imediatamente transportado para as aulas de história do 12º ano, quando a minha professora disse, se a minha memória não me falha, que “todas as pessoas que não reconheciam o talento de Lana não sabem apreciar música”.

Mas assusta-me ter um fã de alguém que é constantemente acusada de glorificar o abuso doméstico em frente de uma pasta que já trata tão mal os seus visados. Espero que Adão e Silva não leve uma música como Ultraviolence à letra, “he hit me and it felt like a kiss” – não terão os artistas portugueses já sofrido o suficiente?

É complicado dizer o que poderá fazer o sucessor de Graça Fonseca durante o seu mandato. Com um orçamento de 0,5% do total do Orçamento de Estado, o sociólogo e professor de Ciência Política certamente terá dificuldade em pôr em prática as suas ideias, mas, pelo menos, desde que entrou para o cargo já se pode gabar de um feito. Em menos de 24 horas ganhou 300 novos seguidores na sua conta de Spotify.