Por acaso a moeda não foi de um tostão. Nem de um escudo. Foi de uma peseta: o árbitro era espanhol. Chamava-se Adolfo Bueno Perales e, no dia 9 de outubro de 1968 dirigiu o Académica-Lyon, em Coimbra, para a segunda mão da primeira eliminatória da Taças das Cidades com Feiras, como se chamava então a que foi, depois, Taça UEFA, e é, hoje, Liga Europa. Os Pardalitos do Choupal, como lhes chamou um dia Vítor Santos, o grande chefe de redação de A Bola, tinham ido ao Estádio de Gerland oferecer uma resistência inesperada pelos franceses, que já andavam escaldados com clubes lusitanos após a eliminação aos pés de Sporting (1963-64) e FC Porto (1964-65). Porfiaram como puderam, mas só ganharam com um golo à beirinha do fim, no momento em que André Guy (85m) bateu o guarda-redes Viegas.
Pois em Coimbra, a Académica virou o jogo do avesso, empurrou os lioneses para junto da sua grande-área, graças ao seu futebol de passa e repassa, toques de primeira, triangulações rápidas, e igualou o resultado do primeiro jogo com um golo de Manuel António, ao minuto 76. Não chegava. Veio o prolongamento e nada. Vai daí, como era dos regulamentos à época, o señor Perales juntou os capitães no meio do terreno, como se fosse recomeçar tudo outra vez, e deixou que o assunto se decidisse por cara ou coroa. Augusto Rocha, capitão da Académica, não teve sorte ao jogo, logo ele, natural de Macau, terra de jogo e muito. O Lyon passava à eliminatória seguinte por um bambúrrio que, felizmente, foi banido dos campos de futebol, e o sorteio decidiu que teria de voltar a Portugal, agora para medir força com o Vitória de Setúbal. A Académica tinha uma equipa e peras, com Vítor Campos, Fernando Peres, Artur Jorge, Rocha, Manuel António, Rui Rodrigues, Gervásio, Mário Campos e tal e tal, mas o Vitória não lhe ficava atrás com Carriço, Cardoso, Conceição, Tomé, Wagner, José Maria, Figueiredo, Guerreiro (o Del Sol), Vítor Baptista e o grandíssimo Jacinto João, o Jota-Jota. Saberiam vingar condignamente os seus compatriotas de Coimbra.
Baile Se o futebol da Académica era arrebicado, que dizer do do Vitória de Fernando Vaz? No dia 30 de outubro, os lioneses estavam de regresso a Portugal, desta vez para jogarem à beira Sado, na terra do choco frito. E que barrigada! O Setúbal foi absolutamente fulminante e nem sequer deu hipótese a que os franceses tentassem o seu futebol duro, a roçar o violento e intimidatório que tinham posto em campo em Coimbra. O técnico Mignot, limitou-se a reconhecer no final: “Perdemos com uma equipa que nos é manifestamente superior!” Pudera: 5-0 tinha sido uma goleada a não merecer discussão de espécie alguma. Carriço abriu as contas no minuto 30 e, em seguida, Tomé, o meu querido amigo Fernando Tomé, setubalense até ao fundo da alma, avançou para um hat-trick que nem era muito do seu género: 2-0, aos 32m; 3-0, aos 57m; 4-0, aos 70m. Com o adversário completamente de rastos, o golpe final pertenceu a Petita – um madeirense que fora batizado como António Ilídio de Sousa –, que entrara na segunda parte, de penalti, ao minuto 81.
O jogo de Lyon não seria muito mais do que um pró-forma, mas o Vitória não esteve para brincadeiras. Aos 11 minutos, Ernesto Figueiredo, o Altafini de Cernache, que já eliminara o Olympique de Lyon jogando pelo Sporting, fez o primeiro golo do Setúbal. François Félix chegou ao empate ao minuto 29, e tudo parecia estar muito equilibrado para o segundo tempo. Um penalti conduziria os portugueses à vitória, concretizado por Arcanjo ao minuto 59.
Depois de terem ultrapassado o frágil Linfield na primeira eliminatória, os vitorianos continuariam em grande até aos quartos-de-final, deixando em seguida a Fiorentina (3-0 e 1-2) e só caindo frente ao Newcastle, ainda assim respondendo à dura derrota em Inglaterra (1-5) com uma enorme categoria (3-1). Ao Lyon, o português continua a não cair muito bem. Só à custa de moedinhas.