Stonehenge. De olhos no céu e de máscara na cara, chegou o solstício de inverno

Stonehenge. De olhos no céu e de máscara na cara, chegou o solstício de inverno


Todos os anos, milhares de pessoas fazem uma peregrinação até ao monumento de Stonehenge, no Reino Unido, para celebrar os solstícios de verão e de inverno. Este ano, a pandemia veio estragar os planos, mas a ‘festa’ mantém-se, ainda que adaptada.


Chegou, oficialmente, o inverno (pelo menos astronomicamente). Segundo o Observatório Astronómico de Lisboa, o solstício de inverno (e, com ele, o dia mais curto e a noite mais longa do ano) começou, exatamente, às 15h59 de terça-feira, mas, em Inglaterra, no mítico Stonehenge, as celebrações oficiais da chegada do Inverno estavam marcadas para o nascer do sol desta quarta-feira. Decisão da English Heritage, instituição responsável pela gestão do milenar monumento neolítico, para onde milhares de pessoas se dirigem, todos os anos, nos solstícios de verão e de inverno.

O solstício de inverno acontece todos os anos, no momento em que o hemisfério norte atinge a sua maior inclinação relativamente ao sol. Daí advém o menor número de horas de luz solar e, portanto, o dia mais curto do ano. A data do mesmo não é uma constante, e a English Heritage, baseada em recomendações das comunidades pagãs e druídicas locais, decidiu celebrar o momento na madrugada de dia 22.

Este ano, Stonehenge, localizado a 140 quilómetros de Londres, no Reino Unido, abriu as suas ‘portas’ ao público na manhã de quarta-feira, permitindo aos curiosos visitantes celebrar a chegada do inverno num local que remonta ao ano 3100 a.C., e que está fortemente ligado à astrologia e aos calendários astronómicos. Se bem que a ‘peregrinação’ costuma ter uma maior afluência durante o solstício de verão, o 21 (ou 22, neste caso) de dezembro é também dia de festa neste monumento, que está ainda envolto em mistério, desconhecendo-se, ao certo e sem dúvidas, a sua origem, bem como os seus contornos. De uma forma geral, o mesmo é associado fortemente à astronomia e aos ciclos do sol, baseando-se as teorias no facto de as estruturas que o compõem se alinharem perfeitamente com esta estrela, por exemplo, nos solstícios de inverno e de verão. Ainda assim, por exemplo, há outras teorias sobre a finalidade deste espaço, uma delas indicando que poderia ter funcionado como um enorme cemitério – afinal de contas, o seu subsolo está repleto de restos humanos.

Solstício pandémico O ano passado, a situação pandémica no Reino Unido levou os responsáveis pelo Stonehenge a emitir uma transmissão, em tempo real, do solstício de inverno, a partir do monumento. Uma forma de colmatar as restrições impostas pelo combate à pandemia, e de evitar que se formassem grandes aglomerados de pessoas no local. A mesma coisa aconteceu no verão de 2021, quando se fez, novamente, uma transmissão em direto do solstício de verão. Desta feita, no entanto, os apelos das autoridades pouco efeito tiveram, e centenas de pessoas acabaram por se juntar à mesma no local.

No solstício de inverno de 2021, a presença no monumento foi permitida, mas desaconselhada, e, para tal, mais uma vez, o acontecimento veio acompanhado de uma transmissão em direto. “Estamos a seguir todas as orientações de saúde pública em relação a eventos ao ar livre, como temos feito durante a pandemia”, começa por garantir a English Heritage no seu comunicado oficial sobre o solstício de inverno, deixando claras as medidas que os visitantes teriam de cumprir: “Recomendamos fortemente que faça um teste de fluxo lateral com antecedência – e que só compareça se o resultado for negativo”, apela a organização, garantindo que a sua equipa “e outras pessoas que trabalham no local foram aconselhadas a fazer o mesmo”. “Não compareça se tiver sintomas de covid. Lembre-se de trazer uma cobertura para o rosto [máscara], pois deverá usar uma em todos os locais públicos internos. Haverá muitos funcionários simpáticos e voluntários no local para responder a quaisquer perguntas ou preocupações e muitos sinais no local lembrando a todos para manter um espaço seguro quando necessário, e para indicar onde podem ser encontradas as estações de higienização das mãos ”, lê-se ainda.

Mas não foi só a English Heritage que se pronunciou sobre os cuidados a ter nesta celebração do solstício de inverno. Numa altura em que a situação pandémica no Reino Unido faz soar alarmes, com os novos casos diários a ultrapassar a barreira dos 90 mil, Kate Blackburn, responsável de Saúde Pública do condado de Kilt, foi clara: “Sabemos como o solstício de inverno é especial para algumas pessoas e queremos que todos os participantes aproveitem o evento com segurança. Embora seja predominantemente um evento ao ar livre, é realmente importante que as pessoas sigam alguns passos simples para ajudar a prevenir a propagação da covid-19”. As recomendações, essas foram as mesmas feitas pela English Heritage.

2021 diferente A transmissão do solstício de inverno em Stonehenge ficou marcada para as 7h25 desta quarta-feira, estando previsto o nascer do sol às 8h09. Em anos prévios à pandemia, o acontecimento significava um importante dia de celebração em torno deste monumento, associado a tradições pagãs de veneração aos astros e aos corpos celestes. Por vezes, o solstício de inverno chegou a levar cerca de 10 mil pessoas a Stonehenge, todas elas de variadíssimas origens: desde cientistas, astrólogos e amantes deste ‘mundo’, até aos denominados ‘druidas modernos’, um estilo de versão contemporânea daqueles que, nas antigas sociedades celtas, se dedicavam ao ensino, bem como às orientações jurídicas e filosóficas, e que se dizem ‘herdeiros’ deste local milenar. Isto apesar de, segundo alguns estudos indicam, a sua construção anteceder o seu surgimento. Pelo meio, encontram-se também milhares de curiosos e adeptos do movimento new age, que chegam a Stonehenge em busca da sua carga espiritual e do impressionante alinhamento astral entre as formações que o constituem e o sol. Afinal de contas, a estrutura ergue-se na planície de Salisbury há praticamente cinco mil anos, construída, apontam alguns estudos, inicialmente, por comunidades contemporâneas das primeiras dinastias do Egito Antigo.

São muitos séculos e séculos de intempéries, invasões, estudos e influência humana, o que torna este local ainda mais imponente. Quem o visita questiona-se sobre como é possível que se mantenha em pé, depois de tantos anos, e como foi possível, há praticamente cinco milénios, construir um monumento tão exato a nível astronómico, onde o nascer do sol do solstício de verão é enquadrado exatamente no final da ferradura de trílitos [estrutura megalítica composta por duas grandes pedras erguidas na vertical que suportam uma terceira disposta horizontalmente] no interior do monumento, ao mesmo tempo que, exatamente em frente a esse ponto, no centro da curva da ferradura, ao pôr do sol na metade do inverno, o sol também está alinhado.

Há um detalhe que, de alguma forma, permite responder pelo menos à questão da manutenção ‘em pé’ deste monumento. Desde os finais do século XIV, seguindo a renovação do interesse científico neste local dos séculos anteriores, Stonehenge tem sido alvo de intervenções de manutenção, e o esforço perdura até aos nossos dias. Recentemente, num dos maiores trabalhos de conservação realizados em décadas, a English Heritage embarcou num novo projeto que procura recuperar e manter em perfeito estado este monumento neolítico, apostando na recuperação de rachas e outros danos feitos pela influência do ambiente e do passar do tempo no mesmo.