Com o chumbo do OE 2022, foi lançado o debate sobre a crise que tolda o autoproclamado sucesso da “geringonça”.
A narrativa que vemos fluir tem procurado centrar esta discussão no orçamento do Estado de 2021, criando aí o momento zero em que, à esquerda, tudo correu mal. Porém será assim?
Em bom rigor, a “geringonça” já vinha a mostrar grandes sinais de desgaste, constatando-se que na votação do primeiro orçamento de Estado da nova legislatura, o OE 2020, o PS já estava sozinho. BE, PCP e PEV abstiveram-se.
No OE de 2021, PCP e PEV abstiveram-se e o BE já votou contra.
Neste OE 2022 toda a extrema-esquerda votou contra, e o orçamento chumbou.
A este fator devemos somar outro que também evidencia que esta instabilidade poderá ter tido início num momento ainda mais anterior: a inexistência de um acordo para a legislatura de 2019, ao contrário de 2015.
Todos estamos recordados de que em 2015 o “mote” da criação da “geringonça”, era o da destruição das conquistas da legislatura anterior (2011-2015).
Foi por não existir mais que unisse a “geringonça”, para além da destruição de tudo o que “cheirasse” a Passos Coelho, que o então Presidente da República forçou a existência de um acordo escrito de mandato.
Quem, na altura, disse que a “geringonça” era uma proposta séria de governação, em que até as “vacas voariam”, pode hoje constatar que, esgotadas que estão todas as políticas anti-Passos, nada mais une a governação da extrema-esquerda.
Não deixa de ser curioso que Cavaco Silva, que certamente não será confundido como apoiante da “geringonça”, e que foi muito criticado por obrigar a este acordo, veja agora reconhecida a sua importância para a estabilidade da própria “geringonça”.
Ao contrário, em 2019, Marcelo Rebelo de Sousa não obrigou a um acordo de mandato “por uma questão de princípio” e “porque as dúvidas que se poderiam formular sobre o acordo escrito acabaram por ser resolvidas pela prática da fórmula política” (ipse dixit).
A prática da fórmula política terá traído a sua visão de estabilidade governativa.
É por demais evidente que Portugal não pode regressar a uma governação do Partido Socialista, que só acontece se vingarem as exigências da extrema-esquerda.
O país não aguenta o peso estrutural dessa visão ideológica e irá colapsar social e economicamente debaixo dela.
Além disso, a extrema-esquerda não irá acompanhar o PS sem compromissos deste relativamente às suas principais bandeiras.
Do lado do PCP temos a exigência da subida do ordenado mínimo nacional, que iria introduzir enormes iniquidades na função pública e no setor privado. É uma medida cega, populista e injusta. E o fim da caducidade das convenções coletivas? Algum investidor nos iria levar a sério?
Do lado do BE a principal bandeira está relacionada com a visão que têm de Estado e que propõe uma reestruturação do serviço nacional de saúde assente num regime de exclusividade para os profissionais do SNS. Isso seria a morte do próprio SNS. Para já não falar do fim do fator de sustentabilidade da Segurança Social.
Agora, o país tem de ir para eleições.
E tem de ir com tempo para que haja uma séria reflexão sobre que futuro queremos para Portugal.
Não é sério propor que a reflexão ocorra entre o Natal e o Ano Novo. Eleições em início de janeiro só vão servir para a substituição de Eduardo Cabrita.
Sá Carneiro ensinou todos os sociais-democratas que em primeiro lugar vinha o país, depois o partido e só no fim a nossa própria circunstância.
E para colocarmos o país em primeiro lugar temos de ter tempo para uma reflexão séria, porque só esse tempo é que vai permitir a Portugal recuperar o seu futuro e declarar o óbito da “geringonça”.
Presidente da concelhia do PSD/Lisboa e presidente da Junta de Freguesia da Estrela