O independente da cidade Invicta está de saída da Câmara do Porto após 12 anos à frente do município. Intransigente e sem papas na língua, Rui Moreira deixa um legado marcado pela transformação económica e cultural do Porto, mas não isento de controvérsia e polémicas. Antes de chegar à liderança da autarquia, destacou-se por ser um portista ferrenho, empresário e gestor cultural na Associação Comercial do Porto. Começou a carreira política como independente em 2013, sendo eleito para a presidência da câmara num duelo contra candidatos de partidos tradicionais.
Conquistas e projetos
Rui Moreira ganhou popularidade por várias iniciativas que transformaram a cidade do Porto, consolidando-a como um dos destinos turísticos mais procurados da Europa. A promoção cultural foi sempre uma das suas bandeiras, através da revitalização de eventos como o Festival Internacional de Cinema do Porto (Fantasporto) e a criação de novos espaços culturais, como o Maus Hábitos.
Durante a sua gestão, focou-se também na revitalização do centro histórico do Porto, especialmente em áreas como a Rua de Santa Catarina e a Praça da Batalha. A requalificação da Ribeira, zona histórica da cidade, também foi uma das suas prioridades. A intervenção no Cais da Ribeira incluiu a modernização de espaços públicos e a melhoria da acessibilidade, preservando a identidade da área.
No âmbito da mobilidade sustentável, Rui Moreira implementou a ampliação das zonas pedonais no centro da cidade e promoveu a instalação de pontos de carregamento de veículos elétricos em vários pontos da cidade. Liderou ainda a criação de um sistema de bicicletas partilhadas, o “Bike Sharing Porto” e a gestão do transporte público foi melhorada, com a expansão da rede de metro.
Mas, apesar das conquistas, os seus mandatos não estiveram isentos de críticas.
O Caso Selminho
O caso mais marcante – e polémico – do seu mandato foi o processo judicial que envolveu a empresa Selminho, ligada à família de Rui Moreira, que terminou com a absolvição do autarca. A questão prendia-se com um terreno na escarpa da Arrábida, no Porto, onde a imobiliária detida por familiares do autarca pretendia avançar com um empreendimento com vista para o rio Douro, que resultou num litígio entre a imobiliária e a própria autarquia, iniciado em 2005.
Após a tomada de posse de Rui Moreira, em 2013, na perspetiva do Ministério Público, sufragada pela juíza de instrução criminal Maria Antónia Ribeiro, o autarca ter-se-ia envolvido nos processos judiciais e administrativos de litígio entre a autarquia e a imobiliária, mudando a posição da Câmara após a chegada ao poder.
Moreira foi acusado de um crime de prevaricação, em concurso aparente com um crime de abuso de poder, considerando o Ministério Público (MP) que o autarca agiu “em seu benefício e da empresa da família”, e fê-lo “contra a lei”.
Apesar das acusações, alegou sempre que agiu de forma correta, tendo sido absolvido em 2023. No entender do tribunal, o MP não conseguiu provar que o autarca portuense influenciou a resolução do acordo entre a Câmara do Porto e a Selminho.
Após ter sido absolvido, Rui Moreira lamentou ter sido “condenado na praça pública” e afirmou que “o processo se transformou num caso político”.
O PSD e o Conflito com Rui Rio
Como independente, Rui Moreira navegou numa linha ténue entre apoiar e criticar partidos. Durante o seu mandato, teve uma relação conflituosa com o PSD, especialmente com Rui Rio, ex-presidente da Câmara do Porto e mais tarde líder do partido. Inicialmente havia alguma expectativa de colaboração entre os dois, mas, com o tempo, as divergências tornaram-se mais evidentes.
Rui Moreira acusou Rui Rio de não entender as necessidades do Porto e criticou a sua liderança no PSD. O conflito chegou ao ponto do atual presidente da Câmara afirmar publicamente que Rui Rio “devia ter outra forma de estar na política”. Por sua vez, Rui Rio nunca escondeu o desconforto com a gestão independente de Moreira, o que resultou numa relação marcada por trocas de críticas públicas.
Rui Moreira recusou qualquer alinhamento com o PSD, mesmo em momentos em que se especulava que poderia apoiar o partido em eleições nacionais. Em 2023 surgiram rumores de que estaria a ser sondado para liderar listas de partidos, como o PSD ou até o PS, às eleições europeias, mas sempre rejeitou as especulações.
Assumindo uma postura de total distanciamento, o autarca chegou a enfatizar que o Porto precisava de alguém “livre das amarras partidárias”.
Alojamento Local e Gentrificação
Se por um lado Rui Moreira ajudou a cidade a ganhar notoriedade internacional e a ser conhecida como um destino atrativo, por outro, o Porto tornou-se um exemplo dos desafios que cidades globais enfrentam ao lidar com as consequências sociais da gentrificação e da pressão turística.
O autarca foi um dos principais defensores da reabilitação urbana como motor de desenvolvimento económico. Sob a sua liderança, o município apostou na revitalização do centro histórico, atraindo investidores e novos negócios. O resultado foi uma explosão descontrolada de alojamentos locais, que levou a uma subida acentuada nos preços de compra e arrendamento, dificultando o acesso à habitação para os moradores locais.
Apesar de Rui Moreira ter reconhecido o problema e procurado dar respostas, através da limitação do AL e da aposta na habitação acessível, vozes críticas consideraram que as medidas tomadas pela câmara foram insuficientes para lidar com as consequências sociais do boom turístico na cidade.







