Inês Gil, 23 anos
Inês Gil é estudante de arquitetura e admite que viu a sua vida “virada do avesso”. Em março de 2020 iniciou o segundo semestre do mestrado através de aulas online: “Foi uma mudança que me custou, pois estava habituada a todos os dias fazer um percurso de 3 horas de ida e volta para a faculdade, em que me levantava todos os dias às 5h30 para ter aulas às 8h30, e de repente bastava-me acordar 15 minutos antes de uma aula”, explica a jovem. A mesma afirma que por mais que se esforce para voltar aos hábitos que tinha antes da pandemia, não consegue: “Sou muito menos produtiva. Deixei de beber 2,5L de água por dia, já não dou os meus 15 mil passos diários e já não pratico desporto. Tornei-me sedentária e não consigo estar focada a 100%”. Inês, que frequenta um curso prático viu “todo o modo de trabalho e ligação com os colegas e professores inteiramente alterados”. Além da faculdade, a jovem trabalhava ainda no café dos pais “para ganhar algum dinheiro, visto que aos dias de semana com a faculdade se tornava impossível ter um part-time”. Agora, perdeu o emprego. Relativamente ao lazer, a sua vida está também em standby: “Além de ter bilhetes para concertos que nunca aconteceram, assisto à perda de familiares dos meus amigos, sem forma de os poder confortar ou auxiliar”.
Helena Saraiva, 58 anos
Helena Saraiva tem 61 anos e vendia filtros para a água. Ao i, conta que “quando chegou a covid-19, fechou tudo” e ficou sem trabalho. Em meados de abril, começou a vender salgadinhos. “Era um negócio que eu já fazia mas entretanto comecei a expô-lo nas redes sociais”, conta Helena. Além deste negócio, como sempre teve “habilidade para a costura”, iniciou também um negócio para arranjar roupa: “Faço bainhas e remendos, além das máscaras”. Como muitos outros, ao ver-se desempregada aproveitou “o jeito que tinha” para desenvolver algo que as pessoas realmente precisassem. “Todas as máscaras que faço têm filtro, por isso são seguras”, explica. Quando as coisas começaram a voltar ao normal, “junho ou julho”, Helena voltou a trabalhar, mas entretanto com a segunda vaga a situação voltou a complicar-se: “Comecei a trabalhar numa lavandaria mas deixámos de ter tanto trabalho como tínhamos no verão e chegou a uma altura em que só estava lá dois dias por semana”. No entanto, o pior chegou já este ano, quando a lavandaria deixou de ter clientes e Helena perdeu o emprego de novo. Em tom de desabafo, a mulher concluí: “Durante este ano de pandemia, as minhas economias desapareceram e agora é um dia de cada vez à espera de tempos melhores”.
Jorge Martins, 51 anos
Jorge Martins, apesar de ter conseguido manter o emprego, também se viu profundamente afetado: “Deixei de poder sair de casa para passear, ir até à beira mar para respirar o ar do mar como fazia quase todos os fins de semana com a família, fosse inverno ou verão, nunca mais pude passar fins de semana fora com a família, ou com os amigos, como fazia de vez em quando, os jantares de família, juntando os avós com as netas e também a comemoração dos aniversários, também nunca mais aconteceram e isto tudo deixa-me muito triste”. Jorge ficou em teletrabalho entre março e junho mas já está de volta ao seu local habitual: “Eu trabalho na construção e posso trabalhar no escritório e também na obra, tirando o uso da máscara e o uso intensivo do álcool gel, todo o resto do trabalho é igual”. Jorge foi um dos atingidos pela covid-19 mas assume que “tirando o cansaço e as dores de cabeça” que teve na altura, não sente que tenha quaisquer sequelas. No entanto, olha para a humanidade de uma forma diferente: “Uma coisa que acho que aconteceu neste período de um ano, foi que mostrou o melhor e o pior que há nas pessoas. O egoísmo cada vez mais presente nas atitudes das pessoas, mas ao mesmo tempo, também o melhor que há em cada um de nós”.
João Amador, 49 anos
João Amador é emigrante em França e admite que a pandemia “mudou completamente” a sua rotina profissional e de viagens: “Viajava com muita regularidade entre Portugal e França e passei para o teletrabalho a 100%”. Dessa mudança trás tantos pontos positivos como negativos, preferindo, no entanto, concentrar-se “nos os aspetos bons”, nomeadamente “passar bastante tempo junto da família”. Com a sua mobilidade habitual em pausa, João afirma que se apercebeu “do enorme desperdício de tempo e recursos, perdidos nas viagens, e o desafio que é utilizar bem esses “tempos livres” equilibradamente entre lazer e tempo profissional”. As viagens que fazia eram habitualmente semanais e apesar de, no início da sua nova etapa laboral, ter levado a família consigo, chegou a uma altura em que era o único a trabalhar no estrangeiro. Depois de um ano a lidar com o novo coronavírus, o emigrante vê uma mudança espelhada nas atitudes da população: “Sinto que mudámos todos, para melhor, espero, somos mais tolerantes a fazer o que for necessário para erradicar esta doença e vamos dar bastante mais valor ao que antes dávamos por garantido, como um simples passeio quando isto terminar”.
Carla Silva, 40 anos
Carla Silva é proprietária de um estabelecimento do ramo da restauração. “Com a chegada da pandemia, o negócio no ramo da restauração e similares tiveram uma enorme quebra, até porque as próprias pessoas têm medo de frequentar os espaços”, explica a empresária. Mesmo com as regras sanitárias impostas pela pandemia, Carla lamenta que a maioria dos seus clientes tenham deixado de aparecer. Neste momento, o negócio baseia-se exclusivamente em take away mas Carla admite que isso não é suficiente, visto que “já nem era suficiente quando estávamos a funcionar a 100% naquele período entre junho e dezembro”. O café, que também serve refeições, é a única fonte de rendimento da própria, sendo que a pandemia teve um impacto extremamente significativo, negativamente, “tanto no combate às despesas gerais como em termos de vida pessoal”. Carla Silva, que agora se encontra numa situação particularmente difícil, tem em vista a possibilidade de não voltar a abrir o negócio de todo, se “dias melhores não vierem rápido”.
Ana Catarina Almeida, 23 anos
Ana Catarina Almeida é estudante em Évora e conta ao i que quando a pandemia começou, o seu primeiro pensamento foi “ainda bem que calhou no ano antes da tese”. Por um lado, acredita agora que “foi um pensamento disparatado” visto que já começou o segundo ano de mestrado há dois meses e admite ainda não ter começado a escrever. A jovem, que estuda bioquímica, encontra-se “em ambiente de investigação laboratorial” e do seu ponto de vista “a maior mudança foi o isolamento, a separação de pessoas e perda de comunicação”. Todos os estudos que realiza atualmente acabam por estar de algum modo relacionados com a pandemia, “pois é onde há mais financiamento e os outros trabalhos ficam esquecidos”. Os materiais que necessita para trabalhar “são encomendados e chegam três meses depois, porque as fronteiras estão fechadas”. A nível pessoal, Ana Catarina sente também uma grande mudança: “Mentalmente, a mudança foi clara. Não sou a mesma pessoa que era em março de 2020. Estou mais triste, mais desencorajada. Lembro-me dos concertos que perdi, das viagens que não fiz e fico abatida, mas sei que tive sorte de não perder ninguém e de todas as minhas mudanças serem mundanas e possivelmente reversíveis”.