Compra. Preços desaceleram mas não assim tanto

Compra. Preços desaceleram mas não assim tanto


Quem procura casa garante que conseguiu encontrar valores mais baixos pelo “seu imóvel de sonho” mas, apesar destes “bons negócios”, mediadoras contactadas pelo i garantem que está a assistir-se a uma estabilização de preços e afastam quedas abruptas. 


João Gonçalves garante que fez o negócio do ano. Durante seis meses foi acompanhando o anúncio de um imóvel que confessa ser “a casa dos seus sonhos”. Mas se, em outubro, ele estava à venda por 650 mil euros, agora conseguiu fechar negócio por meio milhão. “Fui acompanhando constantemente os valores. Em novembro, ainda fui visitar a casa mas, apesar de gostar muito, sabia que o banco não me ia dar crédito para esse valor, pois tinha de vender a minha, que estava avaliada em pouco mais de 300 mil euros. Neste caso, a espera foi o melhor amigo, porque desde janeiro que o preço sofreu um grande tombo até chegar a este patamar que conseguia acompanhar”, revela ao i.

Também Cristina Sousa seguiu os mesmos passos, mas com contornos ligeiramente diferentes. O seu problema não estava relacionado com o pedido de crédito, mas por achar que a casa estava sobreavaliada. “Nunca achei justo um T1 com pouco mais de 60 metros quadrados no Lumiar valer praticamente 400 mil euros. Tinha uma short-list de imóveis nessa zona e recebia alertas sempre que baixavam de preço, até que um dia fui informada de que uma das minhas casas de eleição tinha baixado quase para metade. Nem hesitei”, garante ao i.

Estas experiências vão ao encontro das garantias dadas pelos responsáveis do setor, que afastam a ideia de queda de preços, mas justificam-nos com a tendência de ajuste do mercado.

E em relação ao futuro? Para o presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), “tudo dependerá sempre da relação entre a oferta e a procura existente”, mas admite que a quebra será sempre maior no segmento alto (ver págs. 14/15) do que no segmento médio e médio baixo, onde se verifica maior procura. Ainda assim, diz que a incerteza continua a ser muito grande. “Neste momento de maior incerteza poderá haver uma diminuição da procura e uma revisão dos preços em baixa que, no meu entender, poderá ser inferior a dois dígitos, até porque uma desvalorização superior poderia ser insuportável. Mas havendo sinais positivos e de confiança, a procura poderá retomar e os preços readequarem-se à realidade de cada momento”, refere ao i Luís Lima.

Mas também aponta para riscos. “A instabilidade laboral das famílias acaba por aumentar o risco para a concessão de crédito, levando o setor financeiro a proteger-se, o que acaba por dificultar ainda mais o acesso à habitação pelos jovens e famílias que não conseguem comprar casa sem recorrer a empréstimo”. Este cenário, no seu entender, poderá ter um efeito perverso no panorama habitacional, “que não está preparado para dar a adequada resposta por via do mercado de arrendamento, em que os preços praticados continuam a estar muito além daquilo que as pessoas conseguem pagar, mesmo considerando que muitas delas acabam por se sujeitar a ultrapassar a sua taxa de esforço” (ver págs. 16/17).

Apesar destes ajustes de preços, também a ERA defende que ainda não são suficientes para terem um impacto significativo relativamente ao preço dos imóveis. E isto deve-se, segundo o diretor-geral da ERA Portugal, a três fatores: “Em primeiro lugar, a oferta de imóveis no mercado não aumentou o suficiente para causar uma alteração significativa de preços. Além disso, as taxas de juro têm-se mantido reduzidas e a procura durante o ano de 2020, apesar de ter registado um ligeiro decréscimo nos meses de confinamento, retornou progressivamente aos valores normais no período de desconfinamento. Por último, o interesse por parte de investidores estrangeiros foi notório e contribuiu significativamente para manter a dinâmica do setor imobiliário. Acreditamos que esta será uma tendência a manter-se ao longo de 2021”.

Rui Torgal diz ainda que os grandes centros urbanos – nomeadamente Lisboa e Porto – foram e continuam a ser das zonas mais procuradas pelos clientes, mas há outras zonas que começam a ganhar maior relevo. E dá como exemplo Coimbra, Braga e Vila Nova de Gaia, que são zonas que têm ganho uma nova dinâmica. “Muitas famílias têm procurado casa no interior do país e em zonas mais afastadas das grandes cidades, possivelmente devido ao teletrabalho. Na ERA registámos ainda a deslocação de famílias do centro das cidades para zonas mais periféricas, onde podem ter acesso a casas maiores, com espaços exteriores ou outras características atualmente muito valorizadas, tais como varanda, jardim, piscina ou garagem. Nas zonas periféricas, as famílias beneficiam de um conjunto de novas especificidades por um preço muito mais apelativo do que nos grandes centros urbanos”, refere ao i.

Periferia com maior pressão O CEO da Century 21 acredita que, em 2021, os preços de venda irão estabilizar, “com oscilações pouco significativas numa perspetiva nacional”. Mas admite que nas zonas mais dependentes do turismo e da procura internacional – bem como no segmento médio alto e alto – é possível existir um pequeno ajuste em baixa.

Ricardo Sousa garante que nas cidades periféricas de Lisboa e Porto é expetável um ligeiro aumento dos valores dos imóveis, “em consequência do incremento da procura nestes mercados e das limitações da oferta”, refere ao i.

Em relação à concessão de crédito, apesar de admitir que as regras atuais de acesso ao crédito à habitação são bastante mais conservadoras do que no passado, o que impede algumas famílias de aceder a financiamento para aquisição de muitas das casas disponíveis no mercado, o responsável acredita que “o crédito à habitação continua disponível para famílias e jovens qualificáveis adquirirem habitação, e este é um fator determinante para a dinamização do mercado residencial nacional”.

Caem mas não assim tanto Os mais recentes dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) não deixam margem para dúvidas. Apesar de terem caído 1,8% em Lisboa no terceiro trimestre do ano passado, os preços das casas registaram um crescimento de 7,6% em todo o país. Assim, o preço mediano de alojamentos familiares em Portugal foi de 1168 euros por metro quadrado. Segundo o gabinete de estatística, este valor apresenta uma redução de 1,6% face ao segundo trimestre, mas uma subida de 7,6% quando comparado a igual período de 2019.

E, para já, a tendência de crescimento mantêm-se este ano. Segundo o Imovirtual, em termos absolutos, o preço médio anunciado em janeiro foi de 347 955 euros, o que representa um aumento de 0,5% face ao mês anterior e de 1% quando comparado com janeiro do ano passado.

Mas há mais dados que mostram esta continuidade no crescimento dos preços. No ano passado, “em 65,1% dos municípios assistiu-se a um aumento homólogo dos asking prices – preço de venda ou oferta – registados em ambos os segmentos residenciais (apartamentos e moradias)”, segundo a Imovendo. Por seu turno, a Casafari revela que os preços das casas usadas para venda no país apresentaram um aumento de 5,69% em 2020.