Memória. Como estavam o país e o mundo há cinco anos

Memória. Como estavam o país e o mundo há cinco anos


O que era notícia em janeiro de 2016, aquando da eleição de Marcelo para Belém? Recordamos alguns dos temas que marcavam então a atualidade no país e no mundo.


Há cinco anos, Cavaco Silva terminava o seu segundo mandato em Belém desgastado por tempos difíceis – um resgate financeiro, uma austeridade dolorosa, uma crise sem igual (que ainda assim já dava sinais de alívio) e a contrariedade de se ver forçado a dar posse a um Governo de esquerda que claramente lhe causava urticária.

Depois do polémico veto, a 25 de janeiro de 2016, à lei da adoção por casais gay e às alterações à lei do aborto aprovadas pela maioria parlamentar, escrevia o i na edição de dia 26: “Cavaco, igual a si mesmo, sai de Belém com estrondo”. A esquerda, irritadíssima, não poupava nas críticas ao Presidente cessante: “Sai de cena com fel e ressentido com a democracia”, acusava José Manuel Pureza, deputado do BE.

A eleição de Marcelo à primeira volta, no dia 24, com 52% e 2400 mil votos não surpreendera ninguém. Vítor Matos, o seu biógrafo, vaticinava: “Marcelo não será um monge como Cavaco, um chato como Sampaio ou altivo como Soares”. (Mário Soares faleceria dali a aproximadamente um ano, a 7 de janeiro de 2017.)

Sampaio da Nóvoa, ex-reitor da Universidade de Lisboa, apesar de não ter recebido o apoio oficial do PS, obteve uns honrosos 22%. Ao conhecer os resultados, comentava: “Era difícil, se não impossível, ter corrido melhor”.

Já Maria de Belém não podia dizer o mesmo. Com apenas 4,24%, a antiga ministra da Saúde foi uma das grandes derrotadas da noite. Falou-se em “tragédia” e em “hecatombe”. Expressões que poderiam também aplicar-se ao PCP que, com Edgar Silva, obteve o pior resultado da sua história: 3,95%. Marisa Matias superou a fasquia dos 10% – o melhor resultado de sempre do Bloco de Esquerda. A abstenção foi de mais de 50%.

Decidido o novo chefe de Estado, começaria em força outra discussão no espaço público: a eutanásia. Logo em fevereiro foi lançada uma petição, que tinha como mandatário José Manuel Pureza, para legalizar a morte assistida. O que viria a acontecer cerca de cinco anos depois: nesta quinta-feira, 21 de janeiro de 2021, o Parlamento aprovou na especialidade a nova lei da morte assistida. Curiosamente, pensa-se que terá sido com recurso à eutanásia que morreu o músico David Bowie, talvez a personalidade mais popular a desaparecer nesse janeiro de 2016.

De regresso à política, o CDS discutia então quem seria o sucessor de Paulo Portas, que anunciara a saída ao fim de 16 anos na liderança (entre 1998 e 2016, com uma curta interrupção em 2005-2007). Ribeiro e Castro considerava o abandono em plena campanha das presidenciais “deplorável”. Com Nuno Melo fora da corrida, Assunção Cristas tinha o caminho aberto para se tornar a primeira mulher a liderar o CDS.

Desapertar o cinto Entretanto, no plano social, o país começava a desapertar o cinto. Uma ronda rápida por algumas das medidas que o Governo da geringonça já tinha implantado em janeiro de 2016, ao fim de apenas dois meses no poder (tomara posse a 26 de novembro de 2015): fim dos cortes nos salários da função pública, reposição das 35 horas semanais, redução do IVA dos restaurantes de 23% para 13%, regresso de feriados (mais quatro nesse ano) como o 25 de abril e o 5 de outubro, aumento das pensões mais baixas, novas regras no abono de família, alargamento da isenção das taxas moderadoras nos hospitais, reposição do complemento para idosos, renacionalização da TAP. Depois do tempo dos cofres cheios de Maria Luís Albuquerque, o Governo ia abrir os cordões à bolsa.

Quase ninguém acreditava no Orçamento proposto por Costa e Centeno – três agências de rating, a Comissão Europeia, o Conselho das Finanças Públicas e a UTAO haviam-no considerado demasiado otimista. Mas o facto é que os receios de que o défice disparasse não se confirmaram. Centeno cumpriu à risca.

O turismo, uma das maiores fontes de receita do país, seguia de vento em popa e discutia-se, por isso, a taxa turística. A nível global, 2015 havia sido o ano mais seguro de sempre da aviação.

Peseiro no FCP No futebol, o FC Porto oficializava a 25 de janeiro a contratação do avançado maliano Moussa Marega. José Peseiro acabara de estrear-se como treinador dos dragões no dia anterior, com uma vitória sem chama sobre o Marítimo, graças a um autogolo. Não ficaria muito tempo no cargo. A derrota na final da Taça de Portugal, contra o Braga, em que Pinto da Costa se recusou a apertar-lhe a mão e quase o fuzilou com o olhar, ditaria o seu despedimento.

Em janeiro, o Sporting de Jorge Jesus e Bruno de Carvalho liderava o campeonato, enquanto Rui Vitória, aos comandos do Benfica, espreitava no segundo lugar. A sorte haveria de sorrir-lhe no final da época.

Mau tempo no Atlântico Nos Açores o fim de semana de 23 e 24 de janeiro foi difícil devido às condições meteorológicas. Foram registadas inundações, deslizamentos de terras, derrocadas, rios de lama e danos em habitações que deixaram dez famílias desalojadas.

Ainda assim, nada que se comparasse com o que se passava do lado de lá do Atlântico: o pior nevão dos últimos cem anos. Nos EUA, onde era Presidente Obama (embora Trump já tivesse formalizado a sua candidatura), “13 pessoas morreram em acidentes de viação devido à neve no Arkansas, Carolina do Norte, Kentucky, Ohio, Tennessee e Virgínia, no sábado. Em Maryland foi registada uma morte e três em Nova Iorque, enquanto removiam neve. Na Virgínia morreram ainda duas outras pessoas de hipotermia”, noticiava o i de 25 de janeiro de 2016. Com temperaturas de 20 graus negativos, em Washington a neve alcançou 56 centímetros e em Nova Iorque 64 centímetros. Aeroportos, teatros, museus e comércio tiveram de fechar. Um dado curioso, uma vez que alguns meses antes se havia realizado em Paris a Cimeira do Clima, que – já para lá da data de encerramento prevista – traçara objetivos e compromissos para travar o aquecimento global.

2016 ficou ainda marcado por uma epidemia: o surto de vírus zika na América do Sul, em especial no Brasil, atingiu o seu pico entre abril de 2015 e novembro de 2016. Transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, terá infetado 10% a 15% da população brasileira, provocando febre, erupções cutâneas e, mais grave, passava de mães grávidas para os filhos, podendo causar microcefalia nos recém-nascidos.